Exportação de roupa e sapatos sobe 30% mas o absentismo preocupa
As exportações portuguesas de calçado e de vestuário estão a acelerar, com crescimentos homólogos acima dos 30%. São números que agradam aos industriais, mas que não deixam de gerar preocupação, atendendo aos "níveis absurdos" do absentismo em Portugal.
Nos primeiros cinco meses do ano, a indústria de vestuário destinou ao exterior bens no valor de 1468 milhões de euros, mais 17,9% do que no período homólogo. Mas o vestuário de tecido, aquele que foi mais afetado pela pandemia e respetivos confinamentos, está a crescer 32,1%, para mais de 400 milhões de euros. O presidente da Associação Nacional do Vestuário (ANIVEC) fala num sinal de retoma da normalidade. "O crescimento das vendas do vestuário formal que traduz um sentimento de confiança e de normalidade. Quer dizer que as pessoas voltaram aos eventos sociais, aos casamentos e batizados. É um bom sinal", garante César Araújo.
Mesmo assim, e comparativamente com igual período de 2019, o vestuário de tecido ainda não recuperou totalmente. Faltam ainda quase 20 milhões de euros para atingir os valores pré-pandemia, com as vendas para a União Europeia a caírem 12,5% e a penalizarem a performance global. Os mercados extracomunitários estão a crescer 44,5%. A ANIVEC não tem dúvidas que, até ao final do ano, os números pré-pandemia serão "completamente ultrapassados", mas César Araújo assume "grande preocupação" com os efeitos do absentismo nas empresas. Que, diz, se situa nos 15% a 20%.
Numa indústria que emprega 90 mil pessoas, são 13 500 a 18 mil que faltam diariamente, garante César Araújo, que fala em "facilitismo na obtenção de baixas médicas" e reclama uma "verificação mais apertada" das mesmas. "Portugal não tem falta de trabalhadores, temos falta é dos nossos trabalhadores, que estão em casa, e isso é uma vergonha. Não podemos ter 20% da população doente, ou então temos um problema grave de saúde pública", sublinha.
No calçado, os níveis de absentismo situam-se na mesma ordem de grandeza, muito impulsionados "pelos casos de covid e situações relacionadas", diz o diretor de comunicação da APICCAPS, a associação do setor, lembrando que, ao contrário do que possa parecer, "a pandemia não está ainda controlada". E a situação preocupa. "Os negócios estão a correr bem, a indústria tem uma carteira de encomendas significativa para os próximos meses, mas a verdade é que há diversos imponderáveis que de todo não controlamos", refere Paulo Gonçalves, que aponta, além do absentismo, os efeitos da guerra, designadamente ao nível do aumento do custos das matérias-primas e do disparar da inflação.
A verdade é que a recuperação do calçado tem sido mais rápida do que o previsto, já que a APICCAPS estimava que tal só viesse a acontecer integralmente em 2023. Mas os números de janeiro a maio superam já não só os valores de 2019, ou seja, do período pré-pandemia, estando já acima do período homólogo de 2017, o melhor ano de sempre das exportações nacionais de calçado.
Segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística, nos primeiros cinco meses do ano, Portugal vendeu ao exterior 33,577 milhões de pares de sapatos no valor de 792,4 milhões de euros, o que representa um crescimento de 23,4% em quantidade e de 30,33% em valor. Comparativamente a 2019 o crescimento é de 13,7% e, face a 2017, é de 4,2%.
O preço médio de exportação está, neste ano, a crescer 5,8% para 23,6 euros por par, mas este é um valor que a APICCAPS considera insuficiente para cobrir os aumentos dos custos de produção, constituindo, por isso, motivo de preocupação. "A nossa expectativa era que o preço médio estivesse a subir 12% a 15% e, por isso, pedimos aos empresários que tenham muita atenção às flutuações das matérias-primas e à negociação com os clientes internacionais. Este é um momento perigoso, tememos que se deixem iludir pela grande quantidade de trabalho e que possam estar a perder rentabilidade", frisa.
Por outro lado, a APICCAPS contraria a teoria de que o crescimento advém da deslocalização de encomendas da Ásia para a Europa, assegurando: "Não estamos a substituir ninguém, há sim é um boom de consumo". A prová-lo, diz Paulo Gonçalves, está o facto de as exportações chinesas - país responsável por mais de 50% da produção mundial de calçado - estarem a crescer quase 30%.
Mas não só, já que Espanha e Itália, países diretamente concorrentes da indústria nacional, "estão também com desempenhos muito positivos".
A associação apela, por isso, aos empresários para que assumam uma "atitude comercial agressiva". Em entrevista recente ao jornal da APICCAPS, Luís Onofre alertou para o facto de, "à boleia de um volume anormal de encomendas", as empresas estarem a "desinvestir na atividade promocional externa". "Temos de regressar em força às feiras e aos mercados internacionais. Temos de começar já a ganhar a próxima década", defende.