Estoril Open minimalista. Sem público, sem convites, prémios mais baixos e uma piscina
"Arranja-me um convite para o Estoril Open?" "Este ano não há!" "Não há?" "Não, por causa da pandemia, não haverá público nas bancadas, mas é melhor do que no ano passado que não houve torneio." Este diálogo ficcional retrata muito daquilo que representa o maior evento português de ténis - que arranca hoje com os qualifying - e das mudanças a que foi obrigado para se realizar em tempos de pandemia.
Se no ano passado o barulho do metal, resultante da desmontagem das estruturas sobressaiu com o cancelamento da temporada de terra batida devido à covid-19, este ano é o silêncio que impera em todo o recinto. A azáfama do comité de boas vindas, a busca pelas credenciais e os pedidos infindáveis de convites dão este ano lugar a um tímido burburinho e em slow motion da gestão da agenda dos tenistas, que este ano se limita a viagens do aeroporto para o hotel e do hotel para o court em transporte oficial. Os tradicionais passeios com estonteantes paisagens do Estoril e Cascais estão proibidos.
Assim como a presença de público. A organização ainda tentou ter 500 adeptos por dia, mas a DGS não autorizou e reduziu a receita de bilheteira... a zero. Um rombo enorme, tendo em conta que em 2019, mais de 42 mil pessoas passaram pelo Estoril Open e mais de sete mil com convite. Este ano não haverá filas nem a confusão do entra e sai dos courts, nem convívio nas zonas de lazer. Assim como não haverá o bruah das bancadas a cada ponto impossível, a cada ás, smash ou amorti... nem visitas surpresa de Marcelo Rebelo de Sousa.
Muitas vezes acusado de feira de vaidades, pelo desfile de figura públicas e acesso restrito a uma área VIP gerida por um membro da realeza francesa - Duque de Anjou, Charles Philippe d"Orléans -, o evento teve de se adaptar. A ausência da gigantesca tenda-restaurante com vista para o court central, que recebia mais de 200 pessoas por dia para almoçar - número quintuplicava no espaço dos convidados da organização e dos sponsors - fez emergir a piscina do Clube de Ténis do Estoril, que por estes dias "empresta" alguns courts ao Estoril Open. Ela sempre lá esteve, qual tesouro escondido agora revelado e que promete fazer furor e causar surpresa entre os tenistas ... apesar de não poder ser usada.
O Estádio Millennium é por estes dias um campo normal despido da majestuosidade habitual e moldura humana, mas com vista para a piscina. No lugar do público haverá lonas gigantes com o logótipo do torneio e publicidade, que mesmo que passe apenas uns segundos por dia nas televisões de todo o mundo que dedicam atenção ao melhor ténis mundial durante uma semana, garantem uma visibilidade de quase 600 horas ao Estoril Open e a Portugal. Ou seja, um gross sponsorship value de mais de 130 milhões de euros. Valor que compensa algum investimento (ou pelo menos atenuar) dos quase 30 parceiros, como a Câmara Municipal de Cascais, Millenium BCP, Altice, Emirates ou a betWay.
Sem público e sem o habitual turismo ligado ao evento, este ano o Estoril Open não terá o mesmo impacto na economia local e nacional - cerca de quatro milhões a cada ano - e até o prize-money baixou 117 mil euros. Este ano há apenas 481 mil euros em prémios.
O torneio já entrou em bolha. Durante a reportagem do DN havia zonas já lacradas, como os balneários e o restaurante dos jogadores. As marcas no chão a indicar a zona e sentido de circulação, avisos para o uso obrigatório de máscara e o gel desinfetante à entrada de cada espaço, incluindo courts. O espaço tem ainda áreas de isolamento e primeiros socorros prestados pelo Hospital da Luz e bombeiros do Estoril.
Só entra no recinto quem estiver credenciado. O staff foi reduzido de 500 para 150 pessoas, todos testados antes de entrar na bolha. Haverá apenas meia dúzia de seguranças e de apanha bolas da Academia Champs, algum pessoal do ATP e da organização liderada por João Zilhão, para além dos tenistas - cada um só pode ter dois acompanhantes.
O qualifying começa já hoje e conta com três portugueses (Pedro Sousa, Frederico Silva e Nuno Borges), mas a ação a sério só na segunda-feira. Com quatro top-20 no quadro principal, o destaque é o número 9 do mundo, Diego Schwartzman. Já Shapovalov (14.º) recebeu um wild card, tal como português João Sousa, que em 2018 venceu o torneio
O irreverente Fognini desistiu por lesão e o terceiro e último convite foi para Kei Nishikori, o japonês que já foi n.º 4 mundial e agora ocupa a 39.º posição. Já as ausências dos dois "filhos" do Estoril Open, Tsitsipas e Kyrgios, resulta do crescimento deles como atletas, agora muito cobiçados e com cachets altíssimos.
Esta edição do Estoril Open pode ser minimalista e low cost, mas o quadro principal manteve o nível e um dos tenistas escreverá o nome na curta lista de vencedores, depois de Richard Gasquet (2015), Nicolás Almagro (2016), Pablo Carreño Busta (2017), João Sousa (2018), Stefanos Stistipas (2019) e do coronavírus em 2020...