Direita quer lei contra os burquínis após justiça suspender a proibição
O presidente da câmara de Villeneuve-Loubet, na Costa Azul, disse ontem que não vai acatar a decisão do Conselho de Estado, que suspendeu a proibição do uso do burquíni nas praias da região. Lionnel Luca, que além de autarca é também deputado do partido Os Republicanos, disse que na rentrée em outubro o seu grupo parlamentar irá apresentar uma lei para proibir o uso desta veste usada pelas mulheres muçulmanas para cobrir o corpo, deixando apenas o rosto, as mãos e os pés à mostra. À direita parece haver consenso nesta matéria.
"A decisão do Conselho de Estado é a prova de que é preciso uma lei para proibir o burquíni", escreveu no Twitter Jean François Copé, ex-presidente da UMP (atual Os Republicanos) e candidato às primárias da direita. Um dos seus adversários, na corrida ao Eliseu, o ex-presidente François Sarkozy, repetiu ontem que o burquíni é uma "provocação" e defendeu ser preciso uma lei que o proíba, assim como ao véu "na escola, na universidade, nos serviços públicos, nas empresas".
Também dentro da Frente Nacional há desejo de endurecer a lei, que atualmente já proíbe o uso de burqa ou niqab (a diferença entre os dois é que o segundo mostra os olhos) nos espaços públicos. "Face à fraqueza do Conselho de Estado, cabe ao legislador ser responsável e proibir esta veste do apartheid", reagiu também no Twitter o vice-presidente da Frente Nacional, Florian Philippot. A líder do partido de extrema-direita, Marine Le Pen, defende também que "a bola está agora no campo dos deputados franceses", defendendo a "proibição dos símbolos religiosos ostensivos no espaço público".
Mas, mesmo à direita, há vozes mais conciliadoras. O favorito à vitória nas primárias, o autarca de Bordéus e ex-primeiro-ministro Alain Juppé (Os Republicanos), disse ser contra a pressa numa entrevista ao jornal Le Figaro. "Resistamos à tentação de exigir leis de circunstância ao sabor das polémicas mediáticas" para não "lançar achas para a fogueira", defendeu.
O ministro do Interior, o socialista Bernard Cazeneuve, também apelou à calma. "Cabe agora a cada um procurar, com responsabilidade, o apaziguamento, para evitar perturbações de ordem pública e fortalecer a vida em comunidade", disse em comunicado. À esquerda, as reações foram pouco efusivas. A BFMTV falava num "tímido aplauso". À televisão francesa, o porta-voz do PS, Razzy Hammadi (filho de um argelino e de uma tunisina), disse esperar que agora se possa "encerrar simplesmente esta falsa polémica, o que não diminui o direito de debater, discutir, trocar ideias".
Mas esta opinião não é partilhada por todos. O primeiro-ministro francês, Manuel Valls, reagiu num longo texto no Facebook, voltando a criticar o burquíni, que considera não um "símbolo religioso", mas "a afirmação no espaço público de um islamismo político". Segundo Valls, "condenar o burquíni não é pôr em causa uma liberdade individual. Não existe liberdade em reter as mulheres! É condenar um islmismo mortal, retrógrado".
O Conselho de Estado, a mais alta instância administrativa de França, decidiu ontem suspender a proibição do uso do burquíni. "Se o autarca é responsável pelo respeito da ordem na sua localidade, deve conciliar o cumprimento da sua missão com o respeito das liberdades garantidas pela lei", lê-se na decisão. Só em caso de "riscos comprovados" é que os autarcas podem restringir o acesso às praias. "Na ausência de tais riscos, a emoção e as preocupações resultantes dos atentados terroristas, nomeadamente no de Nice a 14 de julho, não é suficiente para justificar legalmente a proibição" em Villeneuve-Loubet.
A decisão prende-se com esta localidade, mas faz jurisprudência para as outras - apesar de os autarcas já terem dito que não a vão cumprir. No total, cerca de 30 localidades proibiram o uso do burquíni, multando as mulheres que ignorassem essa decisão. Muitas multas foram pagas por Rachid Nekkaz, um empresário franco-argelino que apesar de ser contra a burqa, o niqab ou os burquínis, não concorda com as leis contra estes trajes e já desembolsou 245 mil euros para cobrir as coimas e já reagiu à decisão.
[artigo:5358486]