Dinheiro e energia não nascem nas árvores
Os preços da energia vão continuar a subir e o prolongamento da guerra arrastará esse efeito, depauperando ainda mais a carteira das famílias portuguesas e da generalidade das empresas. O presidente da Endesa admitiu, no último domingo, aumentos de 40% na eletricidade e o país ficou chocado. O governo chamou-lhe "alarmista". Mas todos sabemos que, quando acabar a subsidiação do gás e com o agudizar das alterações climáticas que deixam as barragens vazias, a eletricidade vai ficar ainda mais cara. Ninguém sabe é quanto, mas do aumento não nos livramos. Assim, temos todos fortes razões para estar preocupados, sejamos clientes deste operador ou de outro. Há um quadro geral e macroeconómico que não depende da Endesa, nem do governo, mas sim dos mercados, do ambiente e, acima de tudo, do risco geopolítico europeu.
Já no passado dia 6 de março, o preço da eletricidade no mercado ibérico (Portugal e Espanha) batia um recorde em Portugal: 442,54 euros, tendo chegado aos 500 euros por megawatt/hora durante o horário diurno. Registava-se então o valor mais alto de sempre na Ibéria. Já nessa altura, o conflito na Ucrânia fazia ecoar os alarmes e subir a pressão sobre o preço da energia. De março a agosto, tudo se agravou.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), no final do primeiro semestre mais de dois terços das empresas a operar em Portugal (67%) anteviam aumentar os preços de venda este ano, sobretudo devido aos custos acrescidos com as matérias-primas, bens intermédios e energia. Por setor de atividade, o INE destacava quatro setores com aumento dos preços de venda este ano: indústria e energia, alojamento e restauração, transportes e armazenagem e comércio. Até agora não se enganou. Nestas áreas, todas as faturas que os contribuintes pagam estão mais altas, desde a fatura da luz à da cesta básica alimentar.
2022 é o ano que exige fazer e refazer todas as contas, reequacionar, racionalizar e otimizar. As famílias e as empresas não vão mais poder olhar para a energia como um bem adquirido e acessível, tal como já não olham para o preço do dinheiro da mesma forma que o faziam há um ano, devido à sucessiva subida das taxas de juro, acabando-se assim a era do chamado dinheiro barato ou dinheiro grátis. Como diz o povo português, "o dinheiro não cai do céu" ou "o dinheiro não nasce nas árvores". A energia também não.
Diretora do Diário de Notícias