Desmond Tutu critica silêncio de Suu Kyi e pede-lhe que defenda os direitos humanos
O arcebispo sul-africano e Nobel da Paz Desmond Tutu criticou o silêncio de Aung San Suu Kyi face à perseguição da minoria muçulmana 'rohingya' e exortou-a a intervir "na crise que se agrava" na Birmânia.
Nas últimas duas semanas, 270.000 'rohingya' fugiram da Birmânia para o Bangladesh devido à violência dos combates entre o exército birmanês e a rebelião do Exército de Salvação do Estado Rohingya, segundo a ONU.
Mais de um milhão de 'rohingyas' vivem no estado de Rakhine, noroeste da Birmânia, país que os discrimina e persegue há décadas.
O arcebispo, de 85 anos, publicou na quinta-feira nas redes sociais uma carta que enviou à primeira-ministra birmanesa, também distinguida com o Nobel da Paz, na qual diz ter-se visto obrigado a falar face ao "horror crescente" e à "limpeza étnica" em Rakhine.
Tutu dirige-se a Suu Kyi como "cara irmã" e refere a admiração que há anos sente por ela, mas insta-a a intervir.
"Estou idoso, decrépito e formalmente aposentado, mas quebro o meu voto de manter o silêncio sobre a vida pública devido a uma tristeza profunda", escreveu.
"Durante anos mantive uma fotografia sua na minha secretária para me lembrar da injustiça e do sacrifício que teve de suportar por amor e compromisso com o povo da Birmânia. A senhora simbolizava a virtude", acrescentou.
O bispo, distinguido pelo seu papel na luta contra o 'apartheid', prossegue dizendo que, com a entrada de Suu Kyi no governo, sentiu dissiparem-se os receios quanto àquela minoria, "mas o que alguns chamaram 'limpeza étnica' e 'genocídio lento' persistiu, e recentemente acelerou-se", escreveu.
"É incongruente um símbolo da virtude dirigir um país onde isso acontece. Se o preço político da sua ascensão ao mais alto cargo na Birmânia é o seu silêncio, esse preço é seguramente exorbitante", afirmou.
Aun San Suu Kyi tem sido criticada por defender a atuação do exército em relação aos 'rohingya' por múltiplas personalidades, entre as quais a também Nobel da Paz Malala Yousafzai, e há mesmo uma petição, já assinada por mais de 350 mil pessoas de todo o mundo, pedindo ao comité norueguês que lhe retire o prémio.
Na quarta-feira, a líder birmanesa defendeu-se das críticas, afirmando haver uma campanha de desinformação sobre a questão e assegurando que vai proteger os direitos de todas as pessoas.
"A solidariedade internacional com os 'rohingya' é o resultado de um enorme iceberg de desinformação, que visa criar problemas entre as diferentes comunidades e promover os interesses dos terroristas", disse Suu Kyi.