Deputados vão votar morte medicamente assistida em casa
O PAN vai avançar com um projeto de lei que despenaliza a morte medicamente assistida, prevendo que as pessoas que vejam o seu processo deferido possam vir a morrer em casa. O documento, que visa legalizar a eutanásia e o suicídio assistido, limita os pedidos a doentes terminais e em sofrimento "intenso". Os menores ficam de fora, tal como pessoas com comprovada incapacidade psíquica.
"A autodeterminação no final da vida é um direito em falta, que está por cumprir", diz ao DN André Silva, líder e deputado único do PAN, sublinhando que este é um tema inscrito no programa eleitoral do partido.
O projeto do PAN, já terminado nas suas linhas gerais, abre a porta ao suicídio assistido (quando é o próprio doente a autoadministrar o fármaco letal) e à eutanásia (quando é um terceiro a fazê-lo). O pedido de morte assistida deve ser feito por escrito, pelo próprio, e dirigido a um "médico assistente", que pode ser o médico de família ou o que acompanha a doença do paciente - será um clínico "à escolha do doente".
De acordo com André Silva, a possibilidade de pedir a morte assistida ficará restringida a pessoas que padeçam de uma "doença ou lesão incurável, causadora de sofrimento - físico ou psicológico - intenso, persistente e não debelado ou atenuado para níveis suportáveis e aceites pelo doente"; e com "uma situação clínica de incapacidade ou dependência absoluta ou definitiva". Por outro lado, "a pessoa deve ser competente [para decidir], estar consciente e lúcida quando formula o seu pedido e quando o reitera, ao longo do processo".
No caso de o primeiro médico considerar que estão reunidos os requisitos para avançar, o pedido de morte assistida tem de passar pelo parecer de um segundo médico, obrigatoriamente um especialista na doença do paciente que fez o pedido. Numa terceira e última fase tem de existir, obrigatoriamente, uma avaliação psiquiátrica. O processo só pode seguir em frente com o parecer positivo dos três médicos. Caso a decisão seja de recusa, o paciente terá um prazo de 30 dias para levar o caso a um outro médico e, se assim o entender, requerer a abertura de um novo processo. Já nos casos de deferimento o paciente poderá então escolher o local da morte assistida - um estabelecimento de saúde autorizado ou o próprio domicílio. Segundo André Silva, caberá ao governo definir, através de regulamentação, as "condições mínimas" em que deverá decorrer a morte assistida. O projeto do PAN é restrito a portugueses e estrangeiros com autorização de residência, para evitar criar um mercado que "não é desejável".
A proposta do PAN prevê ainda que seja criada uma lista de objetores de consciência para os médicos que se oponham a esta prática. E prevê também a criação de uma comissão de fiscalização de controlo, uma entidade composta por médicos e juristas, que terá por missão o acompanhamento da execução da lei, a possibilidade de fazer recomendações e o dever de fazer um relatório anual. Todos os processos relativos a morte medicamente assistida terão de ser remetidos a esta entidade (que não terá, no entanto, capacidade de intervenção nos casos concretos).
Pela primeira vez a votos
O projeto do PAN está praticamente pronto e deverá dar entrada "em breve" no Parlamento. A 1 de fevereiro vai ser discutida a petição "Pelo direito a morrer com dignidade", que reuniu oito mil assinaturas em defesa da despenalização da morte assistida, mas nem o PAN nem o Bloco de Esquerda, que tem também uma proposta nesta matéria, agendaram para já os seus projetos. O PAN promove hoje um debate sobre o tema, que decorrerá na sede do partido e contará com a presença do médico Gilberto Couto, do professor universitário Jorge Torgal e de deputados do PS, do PSD e do BE.
Concluído o processo parlamentar da petição, os projetos do BE e do PAN serão depois agendados para debate e votação. Será a primeira vez que o tema sobe a plenário e que irá a votos na Assembleia da República. Até por isso, o resultado final é uma incógnita. PSD e PS dão liberdade de voto e será a contabilidade nas duas bancadas (que juntas somam 175 deputados) que ditará o desfecho da votação. O CDS vota contra. O PCP não assumiu ainda uma posição sobre esta matéria.