Defesas criticam atuação do MP em tribunal e questionam os seus motivos

Advogados de Paulo Blanco e Orlando Figueira sustentam que provas existentes e na mão do Ministério Público tornavam inviável acusação aos arguidos.
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As defesas dos arguidos Paulo Blanco e Orlando Figueira questionaram esta quinta-feira os métodos e motivações com que o Ministério Público (MP) construiu e sustenta a acusação feita no âmbito da Operação Fizz.

Intervindo a seguir à pausa para almoço, após uma sessão matinal ocupada com as alegações finais do MP a cargo da procuradora Leonor Machado, os advogados de defesa daqueles dois arguidos asseguraram não ter havido qualquer acordo entre eles, Armando Pires e o antigo vice-presidente angolano Manuel Vicente.

Note-se que o MP, numa intervenção sem aparente fio condutor e justificando a opção pelo recurso a artigos jornalísticos como forma de ajudar a sustentar a acusação, requereu hoje a aplicação de penas de prisão suspensas para o procurador Orlando Figueira (até cinco anos) e o advogado Paulo Blanco (menos de cinco anos) - além da pena acessória de proibição do exercício de funções públicas durante cinco anos para o primeiro destes arguidos.

Quanto ao empresário Armando Pires, o MP considerou não existirem provas da prática dos crimes de que está acusado (corrupção ativa em coautoria com Paulo Blanco e Manuel Vicente, branqueamento de capitais em coautoria com Manuel Vicente, Paulo Blanco e Orlando Figueira e falsificação de documento em coautoria com as mesmas pessoas).

Relativamente a Manuel Vicente, o seu processo foi autonomizado e enviado para as autoridades angolanas, que já o receberam em formato digital e aguardam os 49 volumes da versão em papel.

Para a advogada de defesa de Paulo Blanco, "o MP socorreu-se das chamadas fontes abertas [como artigos de jornais e a Wikipédia] apesar de ter informação documental fidedigna que contrariava as fontes abertas e manteve-se firme" na sua intenção. Contudo, prosseguiu Ana Rita Rocha, "todo o processo e o dispêndio de recursos do Estado e dos intervenientes teriam sido evitáveis se o MP tivesse cumprido as suas obrigações e agido com diligência e zelo".

A acusação "optou por não realizar diligências probatórias que seriam obrigatórias e não valorar meios de prova que tinha à disposição", insistiu Ana Rita Rocha, deixando uma acusação: "Assistimos a uma verdadeira inversão do ónus da prova e tivemos, cada uma das defesas, de deixar claro e inequívoco que nenhum dos factos e crimes correspondem à verdade."

"O que nos causa perplexidade é que, se o tivesse feito, os autos teriam culminado no arquivamento no caso" relativo a Paulo Blanco, advogou Ana Rita Rocha. Mais, "olhando para a acusação, percebemos que o próprio MP em fase de julgamento [...] tenha tentado passar à margem da acusação. Era impossível ignorar todas as fragilidades e falsidades que a acusação enferma", desde logo porque, "ao arrepio do que é a sua função, a acusação pouco cuidou de fazer prova dos factos que imputou e que acabaram por colocar os arguidos na posição forçada de fazer prova" da sua inocência.

O MP "tinha dados para não fazer" a acusação contra os quatro arguidos, observou a advogada. Como exemplo, lembrou a acusação de que os quatro arguidos tinham feito em 2011 um acordo em torno dos arquivamentos de dois processos - o da compra por Manuel Vicente de um apartamento no Estoril e a aquisição, pela empresa Portmill, de uma participação de 24% no BES Angola - e "agora diz que Armando Pires não teve nada a ver" com o caso, deixando ao coletivo de juízes a decisão de o condenar ou absolver.

Ana Rita Rocha assegurou ainda que "a forma como a investigação foi conduzida e a leviandade" com que foi mantida "envergonham seriamente a justiça portuguesa e cabe ao tribunal repor a honra da Justiça", decidindo pela absolvição de Paulo Blanco.

"Esperamos que um dia venhamos a conhecer as razões porque o MP optou, em consciência e de forma deliberada, por traçar e seguir um rumo que sabia não dar nada", observou ainda a advogada.

Fernando Seara, também advogado de Paulo Blanco e invocando a qualidade de ter sido patrono do arguido, dirigiu-se mesmo à procuradora para lhe dizer que "a verdade é sempre filha do tempo" e alertar o tribunal para um pormenor: no despacho de acusação falta o capítulo correspondente à letra F - "efe de fracasso" ou, sugeriu, o apagar de "uma parte da acusação que estava escrita".

Carla Marinho, advogada oficiosa de Orlando Teixeira cujas alegações terminam amanhã com o juiz a permitir-lhe falar mais 30 minutos dos que as duas horas atribuídas a cada equipa de defesa, referiu que o seu cliente arquivou os dois processos relativos a Angola "de acordo com a lei e a sua consciência". Mais, a sua superior hierárquica no DCIAP, Cândida Almeida, concordou com todos os passos dados pelo procurador.

Observando que "não foi registada diferença de rapidez" por parte de Orlando Teixeira na decisão tomada naqueles dois processos face ao tempo verificado nos restantes, Carla Marinho recordou que o procurador deixou a seu pedido de ser titular dos processos relacionados com Angola - logo, de os controlar, o que deita por terra a razão de ser do alegado acordo feito com os outros arguidos, sustentou a sua advogada.

"Com os contratos" de trabalho assinados por Orlando Teixeira com a empresa angolana Primagest, "com as escutas, a clonagem do Iphone, as declarações fiscais, como considerar que os pagamentos" feitos ao seu cliente "foram de corrupção?", questionou a advogada.

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