Da Índia para Portugal para perceber como os ratos amam
A primeira pergunta que lhe veio à cabeça quando aterrou em Lisboa foi: "Onde é que se meteu toda a gente?". Basma Husain tinha entrado no avião em Mumbai (antiga Bombaim), uma cidade com mais de 20 milhões de habitantes. À chegada as ruas da capital portuguesa pareceram-lhe desertas. "Achei que era muito sossegado e que havia muito poucas pessoas. Foi um choque", explica.
Veio em abril de 2015 para uma entrevista na Fundação Champalimaud. Tinha-se candidatado a um programa de doutoramento. Nessa primeira visita ficou apenas três dias e mudou-se definitivamente para Lisboa em janeiro de 2016. Está a investigar "comportamentos inatos, que estão impressos no cérebro e que são comuns a muitos animais". Neste momento trabalha com ratos, para perceber como funciona no cérebro o ciclo sexual das fêmeas.
Basma nasceu na Arábia Saudita. Era lá que o pai estava colocado como médico. Quando tinha 11 anos a família regressou à Índia, para a cidade de Lucknow, a capital do estado de Uttar Pradesh. Foi aí que fez a escola e, por influência paterna, o curso de Biologia. No fim da licenciatura arrumou as malas e partiu para Mumbai, para fazer três anos de mestrado no Tata Institute of Fundamental Research. A adaptação não foi simples. Principalmente pela distância da família e pela dimensão da cidade. Foi durante os anos de mestrado que começou a pensar na ideia de partir, de aventurar-se no exterior para um doutoramento. Queria que fosse na Europa e a Fundação Champalimaud foi um dos locais que lhe pareceu mais atrativo por estar ligada à neurociência. Pouco sabia de Portugal quando veio para a entrevista. "Apenas o básico", resume. Não foi o país que a seduziu, mas sim o trabalho.
"Calmos, calorosos e gostam de se divertir." Em poucas palavras é assim que descreve os portugueses. "Nem sempre chegam a horas. Há uma tendência geral para o atraso, mas isso também acontece na Índia", acrescenta. Tirando a pouca atenção ao relógio é-lhe difícil encontrar mais paralelos entre os dois povos. "Culturalmente são países muito diferentes", diz. O único aspeto negativo que aponta na experiência em Portugal é a burocracia. "A candidatura à autorização de residência foi um pesadelo. Pedi uma marcação em janeiro e marcaram-me para maio. Depois disseram-me que teria a autorização num prazo de 16 dias úteis, mas só a recebi em agosto", explica.
A adaptação à comida também não foi fácil e a gastronomia portuguesa ainda não lhe caiu no goto. "No início tentei, mas é demasiado diferente", conta. Agora já se rendeu ao peixe, mas pouco mais. A religião muçulmana impede-a de comer porco e a restante carne tem de ser halal, aquela que foi tratada de acordo com as regras do Islão. As dificuldades alimentares aguçaram-lhe o engenho. "Antes de vir para cá não gostava nada de cozinhar. Agora vou às lojas no Martim Moniz comprar as especiarias e os ingredientes e faço tudo em casa." Aos poucos vai-se habituando também ao português, com a ajuda das aulas oferecidas pela Champalimaud: "Agora já estou mais confiante. Já não tenho problemas em falar com as pessoas quando preciso de alguma indicação."
Além das saudades da família e dos sabores indianos, Basma sente falta da informalidade a que estava habituada no contacto com os outros no seu país. "Na Índia, mesmo quando acabamos de conhecer alguém a interação é mais informal do que cá".
Em princípio, o futuro passará pelo regresso ao país natal quando o doutoramento estiver concluído. Até lá quer perceber como as diferentes hormonas que são libertadas pelos ratos-fêmea durante o ciclo sexual afetam o cérebro. Para entender como os ratos amam.