Da festa do Sporting ao Novo Banco e Odemira. Costa debaixo de fogo na AR
O Governo pediu à Inspeção-geral da Administração Interna a abertura de um inquérito à atuação da PSP nos festejos do Sporting como campeão nacional de futebol, anunciou esta quarta-feira o primeiro-ministro, António Costa, recusando "atirar pedras".
"Relativamente aos eventos de ontem [terça-feira], o senhor ministro da Administração Interna já teve ocasião de fazer um despacho, primeiro solicitando à PSP informações sobre como tinha sido articulado todo o planeamento com o conjunto das entidades envolvidas, desde o Sporting Clube e Portugal à Câmara Municipal de Lisboa e à Direção-geral da Saúde, e solicitando à Inspeção-geral da Administração Interna um inquérito à atuação da Polícia de Segurança Pública naquele contexto de ontem", anunciou António Costa.
O primeiro-ministro falava na Assembleia da República, no debate sobre política geral, e fez este anúncio quando respondia ao líder parlamentar do CDS-PP, Telmo Correia.
António Costa recusou "atirar pedras" ao clube, aos adeptos que festejaram nas ruas ou à polícia.
"Vou fazer aquilo que qualquer político responsável nestas circunstâncias deve fazer, que é aguardar a informação, o apuramento e o esclarecimento dos factos para retirar as responsabilidades devidas sobre essa matéria", defendeu.
Antes, o deputado do CDS-PP disse compreender "os festejos dos adeptos, a alegria dos adeptos", bem como "as dificuldades da polícia" porque "é sempre um momento difícil".
No entanto, Temo Correia quis saber "porque é que houve tão pouca informação, tão pouco planeamento, porque é que não se soube antes, porque é que o plano não foi divulgado antecipadamente, porque é que as coisas não estavam organizadas e previstas".
"Ontem aparentemente nada estava previsto", atirou, questionado se seguida se "há consequências ou não há consequências".
O líder do Chega perguntou esta quarta-feira ao primeiro-ministro se vai manter o ministro da Administração Interna no Governo face ao que considerou uma constante atuação "desastrosa" e António Costa respondeu que Eduardo Cabrita é um "excelente MAI".
"Quem me dera que o meu problema fosse o MAI. Tenho um excelente MAI", declarou o chefe do executivo, no primeiro debate parlamentar bimestral com o primeiro-ministro após o fim de consecutivos estados de emergência para combater a epidemia da covid-19 em Portugal.
André Ventura, deputado único daquele partido populista de extrema-direita, tinha argumentado que o próprio Presidente da República já tinha pedido que fossem retiradas consequências políticas, designadamente devido à polémica do realojamento de trabalhadores migrantes em Odemira, por exemplo, e que até o autarca socialista daquele tinha pedido a demissão de Cabrita.
O presidente da Iniciativa Liberal classificou esta quareta-feira o ministro da Administração Interna (MAI), Eduardo Cabrita, como "mau nas decisões e pior nas justificações", elencando diversos episódios em que considera que o membro do executivo do PS foi "incompetente".
"Ontem [terça-feira] houve a festa do título [nacional de futebol] do Sporting, não havia plano absolutamente nenhum e continua aqui o ministro, que é incompetente, mau nas decisões e pior nas justificações. Fica, dizem, por que andou consigo (António Costa) na escola. É altura de saber quem andou consigo na escola para este parlamento saber quem é inimputável neste país", afirmou Cotrim de Figueiredo.
O deputado único dos liberais debatia com o primeiro-ministro, António Costa, no primeiro debate parlamentar bimestral com o primeiro-ministro após o fim do estado de emergência para combater a epidemia da covid-19 em Portugal.
Antes, já o chefe do Governo tinha anunciado o pedido à Inspeção-Geral da Administração Interna de abertura de um inquérito à atuação da PSP nos festejos da véspera.
"Quando o MAI comprou golas antifumo inflamáveis, o ministro ficou. Quando demorou meses a assumir responsabilidades no caso de Ihor Humenyuk (cidadão ucraniano assassinado nas instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no aeroporto de Lisboa, o ministro ficou...", enumerou Cotrim de Figueiredo.
O deputado da Iniciativa Liberal recordou ainda o "contrato SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal)", que "chegou ao fim sem renegociação" e "a culpa era da Altice, mas o ministro ficou" ou que, "quando houve filas intermináveis de voto nas eleições presidenciais, não só [o MAI] ficou como foi 'a festa da democracia'".
O presidente do PSD defendeu esta quarta-feira que a venda do Novo Banco foi "um completo desastre" e teria sido preferível que tivesse "ficado na posse do Estado", com o primeiro-ministro a responder que o Governo "evitou um desastre para Portugal".
No debate sobre política geral no parlamento, Rui Rio dedicou a quase totalidade do seu tempo com a situação do Novo Banco, reiterando que o partido entregará, ainda esta semana, uma exposição sobre a instituição à Procuradoria-Geral da República, como já tinha anunciado numa entrevista.
"Mais valia que [o Novo Banco] tivesse ficado na posse do Estado: não se venderiam ativos completamente ao desbarato e a privatização, a fazer agora, a existir lucro viria tudo para os contribuintes", defendeu Rui Rio.
O líder do PSD desafiou então António Costa a assumir que a venda que o Governo por si liderado, em 2017, fez do Novo Banco "é um completo desastre para Portugal".
"Eu estou em condições de dizer aos portugueses que a venda do Novo Banco evitou um desastre para Portugal", respondeu o primeiro-ministro, e exibiu um gráfico para defender que foi a partir dessa alienação que os juros da dívida portuguesa começaram a descer.
Costa invocou a recente auditoria do Tribunal de Constas (TdC) para defender que "a sua conclusão fundamental é só uma".
"A alienação protegeu o interesse público e a estabilidade do sistema financeiro e veio travar o risco sistémico que significaria a liquidação do Novo Banco", defendeu.
Rio fez outra leitura das conclusões da auditoria do TdC, considerando que comprovaram o que o PSD já "suspeitava".
"O Governo, quando o Novo Banco apresenta a fatura, verifica se está correta? Suspeitávamos que não, agora com a auditoria sabemos perfeitamente que o Governo não verifica nada", criticou.
O líder do PSD questionou António Costa se, perante mais uma fatura este ano do Novo Banco, "vai pagar sem ver ou vai verificar desta vez".
"Se me pergunta se há verificação por parte do fundo de resolução, há com certeza", respondeu Costa.
O primeiro-ministro reiterou que, a partir da resolução feita em 2014 pelo anterior Governo PSD/CDS-PP, as únicas duas opções eram "a venda ou a liquidação", que a venda foi falhada pelo executivo de Pedro Passos Coelho e que, em 2017, apareceu um único concorrente, a Lone Satar, considerando que algo deve explicar "a falta de interesse".
António Costa insistiu que o dinheiro que tem sido investido no Novo Banco provém do fundo de resolução, que só tem capital público "a título de empréstimo" aos bancos.
"Aliás, o Estado tem sido devidamente remunerado em juros, já recebemos até ao momento 588 milhões de euros", afirmou, assegurando que "os empréstimos não são donativos" e os contribuintes vão recuperar o dinheiro ao longo das próximas décadas.
Na resposta, Rio admitiu que o empréstimo até "poderá ser pago, mas é quando as galinhas tiverem dentes".
O líder do PSD reiterou que o partido vai entregar uma exposição sobre o Novo Banco à PGR, depois de no verão passado este organismo ter analisado, a pedido do Governo, denúncias feitas por Rui Rio no parlamento e que a instituição considerou na altura não terem fundamento.
"Estou espantado com eficácia da PGR: o TdC demora uma infinidade para produzir um trabalho que ainda fica aquém do que foi pedido pelo parlamento e a PGR numa semana sabe que está tudo bem. Ainda esta semana entregaremos uma exposição mais detalhada para ver sem 15 dias a PGR resolve o problema do Novo Banco", ironizou Rio.
"Verifico, com alguma surpresa, que confia mais na evolução fisiológica das galinhas do que na PGR, cada um tem as suas convicções", ripostou Costa.
O primeiro-ministro considerou esta quarta-feira que, mais importante do que o levantamento da cerca sanitária em Odemira, o problema de fundo a enfrentar é o da habitação, havendo já um calendário acordado com a autarquia e produtores.
Esta posição foi defendida por António Costa na abertura do debate bimestral, na Assembleia da República, depois de o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, ter levantado um conjunto de questões sociais, entre elas a do "trabalho escravo" em Odemira, acusando o Governo de ser "forte com os injustiçados" e "fraco com os fortes".
"Vamos enfrentar o problema de fundo da habitação com um calendário concreto que responde a um problema grave que se foi acumulando ao longo de décadas no concelho de Odemira", respondeu o líder do executivo.
O primeiro-ministro, que na terça-feira esteve em Odemira, advertiu que a situação neste município com trabalhadores imigrantes e sazonais na agricultura "não é nova e tem múltiplas dimensões, desde logo de compatibilização entre a capacidade de reforço da produção nacional e da autonomia nacional com os valores ambientais que importa preservar no âmbito do parque natural".
"Há também a necessidade de condições dignas de trabalho e de habitação para os trabalhadores sazonais e para os trabalhadores residentes na freguesia. Bem sei que a notícia mais visível, na terça-feira, foi o levantamento da cerca sanitária, mas o mais importante foram os dois protocolos assinados com o Município de Odemira e outro com as três associações representativas dos produtores agrícolas", defendeu António Costa.
Com esses dois protocolos, de acordo com o primeiro-ministro, "+procura-se responder a algo absolutamente crítico e que tem a ver com as condições de habitação".
"Com o protocolo com a Câmara de Odemira, passará a haver acesso a 100 por cento para a construção ou reconstrução de habitação para todos o que residam no concelho, independentemente de serem recentes ou não. Para os trabalhadores sazonais, que sempre existiram na atividade agrícola, foi assinado um acordo para habitação condigna. Os proprietários aceitaram assumir a responsabilidade, tendo o apoio do fundo do desenvolvimento rural para apoiar esse esforço", assinalou.
Antes, Jerónimo de Sousa tinha avisado para não se pensar que, com o levantamento das cercas sanitárias em duas freguesias de Odemira, se tinha resolvido o problema, "que é de muito maior dimensão".
"Estamos perante um Governo fraco perante os poderosos e perante um Governo forte perante os injustiçados", declarou, antes de falar na atuação de uma série de empresas em Portugal na atual conjuntura de epidemia de covid-19, entre elas a Galp e a Groundforce.
Jerónimo de Sousa queixou-se ainda de empresas de trabalho temporário ou de prestação de serviços, com trabalhadores a viver "em condições degradantes de saúde e de habitação".
Uma exploração que disse ser levado a cabo por "máfias", adiantando que Odemira "pôs a nu, para aqueles que só agora quiseram ver, a situação de centenas de milhares de trabalhadores, em particular imigrantes".
"Não só na agricultura, mas também na pesca. Há situações de trabalho escravo" denunciou, antes de exigir ao Governo mudanças de fundo ao nível legislativo.
"Há um problema do Código de Trabalho e nas suas sucessivas alterações, mas também no que respeita ao cumprimento dos limites, sendo necessário revogar normas gravosas e garantir a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), que deve dispor dos meios humanos e técnicos adequados e de poderes de ação executiva. Para quando dar solução para estes problemas de fundo, designadamente a ACT e o Código do Trabalho?", perguntou o líder dos comunistas.
O secretário-geral do PCP exigiu esta quarta-feira a contratação de mais profissionais de saúde, sobretudo nos centros de vacinação, e acusou o Governo de "seguidismo" face à Comissão Europeia, insistindo na "diversificação da aquisição de vacinas.
Estas críticas foram feitas por Jerónimo de Sousa na abertura do primeiro debate bimestral com a presença do primeiro-ministro, na Assembleia da República, depois do fim do estado de emergência para combate à epidemia da covid-19 em Portugal.
Jerónimo de Sousa considerou que a situação em Portugal "está longe de ser satisfatória" no que respeita ao processo de vacinação e defendeu que as soluções passam pela testagem massiva, rastreio de todos os novos casos de covid-19, reforço dos profissionais de saúde e "outra urgência à vacinação".
"Continua a haver muitos os entraves, como falta de enfermeiros nos centros de vacinação, falta de vacinas e condicionalismos para as vacinas adquiridas. O Governo tem de renovar os contratos com centenas de profissionais de saúde, deixando a política de seguidismo face à Comissão Europeia e autorizando todas as vacinas contra a covid-19" reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde, sustentou.
Na resposta, António Costa referiu que, no quadro dos compromissos ao nível do Orçamento do Estado para 2021, designadamente com o PCP, o Governo abriu concursos para a contratação de mais profissionais de saúde, sobretudo enfermeiros.
"Um despacho foi publicado hoje mesmo e, nesse quadro, está prevista a contratação de um número suficiente de enfermeiros que permite a integração nos quadros dos enfermeiros contratados a título temporário para a operação de vacinação. A condição de ser temporário é preferencial para a admissão", salientou.
"O plano de vacinação tem sido executado de acordo com o planeado, não obstante vicissitudes, que são públicas, ao nível do fornecimento por parte da AstraZeneca e pela introdução de restrições em duas delas. Quanto às vacinas, não há qualquer restrição a nenhuma, desde que seja licenciada pela Agência Europeia do Medicamento (EMA)", disse o líder do executivo.
António Costa disse depois que, neste momento, toda a população com mais de 70 anos já teve a primeira dose da vacina e, ao longo desta semana, concluir-se-á toda a vacinação acima dos 65 anos.
"Temos estado a cumprir o calendário. Entre o meio do verão e o final do verão poderemos ter 70% da população devidamente vacinada", acrescentou.