Costa privilegia diálogo à esquerda e exclui direita com agenda xenófoba

O secretário-geral do PS defende ainda na sua moção a apresentar ao congresso, de 10 e 11 de julho, como objetivos a recuperação económica e a vitória nas autárquicas, mas também um debate para a concretização da regionalização através de referendo.
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O secretário-geral socialista, António Costa, defende na sua moção ao Congresso do PS a continuidade do diálogo à esquerda para assegurar a estabilidade política e exclui a "direita complacente" com uma agenda antidemocrática e xenófoba.

Estas são duas das linhas de orientação política constantes na moção de António Costa ao Congresso do PS, que se realiza em 10 e 11 de julho, e que foi hoje entregue ao presidente deste partido, Carlos César.

Intitulada "Recuperar Portugal, garantir o futuro", a moção do líder socialista contém um parágrafo de claro afastamento em relação a setores da direita democrática que não se demarcam da extrema-direita.

Na moção, que foi coordenada pela dirigente socialista e ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, lê-se que o PS se assume como "um partido que dialoga com todos os setores da sociedade que defendem o aprofundamento da democracia pluralista e rejeitam a complacência da direita democrática perante uma agenda antidemocrática e xenófoba".

Falando com jornalistas depois de entregar a sua moção na sede nacional do PS, António Costa acusou o PSD de ser "complacente" com o Chega.

Para os próximos dois anos, o secretário-geral do PS defende uma continuidade estratégica face à linha seguida desde novembro de 2015, quando formou governo com suporte parlamentar dos partidos à esquerda dos socialistas.

"Ao construir essa alternativa, em prol dos portugueses, o PS rompeu o conceito de arco da governação", superou tabus e mostrou que são possíveis soluções governativas com apoio maioritário da esquerda, garantindo estabilidade governativa - estabilidade que foi crucial durante os cinco anos de políticas de mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade, que foi fundamental no combate à pandemia e que é uma condição fundamental para a recuperação económica e social do país", lê-se no documento.

António Costa refere depois, de forma direta, que "o PS defende que é no diálogo à esquerda que se assegura a estabilidade e as boas políticas de que o país precisa para recuperar e garantir o futuro, no respeito pelos princípios programáticos do PS e pelos compromissos internacionais do nosso país".

Além do diálogo à esquerda, na moção de orientação política do líder dos socialistas aposta-se também numa linha de continuidade em matéria de cooperação institucional, que é encarada como "estruturante".

"O PS tem como marca da sua governação a boa cooperação institucional que se estabelece entre o Governo, o poder local e as regiões autónomas, o respeito pela separação de poderes face ao poder judicial, e a estreita cooperação institucional com a Assembleia da República e com o Presidente da República. Essa cooperação institucional é sempre importante, mas foi absolutamente estruturante na forma como o país combateu a pandemia [da covid-19], num contexto de diálogo e de convergência interinstitucional que contribuiu decisivamente para que vivêssemos num clima de paz social este período de indiscutível excecionalidade", sustenta-se no texto da moção.

O secretário-geral do PS coloca ainda como objetivos cimeiros na moção que apresenta ao congresso a recuperação económica depois da crise provocada pela covid-19 e a obtenção de uma nova vitória nas próximas eleições autárquicas.

Na sua moção de orientação política, intitulada "Recuperar Portugal, garantir o futuro", que foi coordenada pela dirigente socialista Mariana Vieira da Silva, defende-se que o PS "deve assumir o objetivo de assegurar nas próximas eleições a maioria das câmaras municipais, a maioria das juntas de freguesia, a maioria dos mandatos e a maioria dos votos".

"O PS apresenta-se às próximas eleições autárquicas com esta ambição de vitória", refere-se no texto de introdução da moção.

Além deste objetivo eleitoral, no plano da governação, António Costa coloca como primeira missão do PS "liderar a recuperação económica e social do país, vencendo a crise aberta pela pandemia".

No plano imediato, o desafio é a erradicação da pandemia, concluindo o processo de vacinação e prosseguindo com firmeza as medidas de saúde pública.

"Para enfrentar os desafios com que estamos confrontados, a recuperação não se pode limitar a regressar ao ponto onde estávamos em fevereiro de 2020. Nem tão pouco a onde estaríamos se a pandemia não nos tivesse atingido. Temos de ir mais além", assume o secretário-geral do PS, antes de se referir ao papel de "trampolim" que terá o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para a recuperação económica.

O objetivo, segundo António Costa, é que Portugal vá "mais além e mais rápido na convergência económica e social com a União Europeia.

Nos próximos dois anos, o PS coloca como prioridades económicas e sociais o combate às desigualdades e à pobreza, e enfrentar os desafios demográfico com uma política de habitação de base local que simultaneamente elimine a habitação indigna e assegure habitação a preços acessíveis, para que os jovens possam "emancipar-se e ter os filhos que desejem".

No mercado de trabalho, o secretário-geral do PS promete combater a precariedade, o recurso abusivo ao trabalho temporário, o falso trabalho independente e a informalidade nas relações laborais", promovendo-se em contrapartida a valorização dos salários dos trabalhadores jovens".

"Um país que assegura aos jovens a liberdade de acesso às profissões reguladas, sem bloqueios corporativos", acrescenta-se.

No domínio do combate às alterações climáticas, na moção do secretário-geral do PS renova-se a promessa da "aposta na eficiência energética, quer ao nível da iluminação pública, quer ao nível dos equipamentos coletivos ou da concretização das suas estratégias locais de habitação".

"Um país que aposta na promoção dos transportes públicos e na sua articulação com outros serviços de mobilidade suave e na eletrificação da maioria do transporte público coletivo", salienta-se na moção.

Em relação às transformações económicas e sociais provocadas pelo digital, a moção do líder socialista promete combater os fenómenos de exclusão digital".

"Um país que assegura a conectividade em todo o território para que todo o país possa beneficiar das potencialidades da digitalização em todos os setores da economia ou das oportunidades que o trabalho remoto veio abrir para uma melhor distribuição geográfica da retenção de mão de obra qualificada", lê-se no documento.

António Costa propõe ainda um debate para a concretização da regionalização "nos termos constitucionais", através de referendo.

Em relação ao próximo mandato autárquico, entre este ano e 2025, o líder dos socialistas e atual primeiro-ministro defende que será de "consolidação do processo de descentralização para os municípios e áreas metropolitanas, ao mesmo tempo que prossegue o processo de alargamento das competências das CCDR (comissões de coordenação e desenvolvimento regional), agora legitimadas como representantes dos autarcas das regiões".

"Estaremos assim em condições de no final de 2024 avaliar os resultados destes processos e promover amplo debate tendo em vista a concretização da regionalização, nos termos constitucionais", sustenta o secretário-geral do PS.

A Constituição da República Portuguesa prevê, no artigo 236.º, a existência de regiões administrativas no continente, e estabelece, no artigo 255.º, que "são criadas simultaneamente, por lei, a qual define os respetivos poderes, a composição, a competência e o funcionamento dos seus órgãos, podendo estabelecer diferenciações quanto ao regime aplicável a cada uma".

O artigo 256.º da Constituição determina, contudo, que "a instituição em concreto das regiões administrativas, com aprovação da lei de instituição de cada uma delas, depende da lei prevista no artigo anterior e do voto favorável expresso pela maioria dos cidadãos eleitores que se tenham pronunciado em consulta direta, de alcance nacional e relativa a cada área regional".

Segundo o mesmo artigo, "quando a maioria dos cidadãos eleitores participantes não se pronunciar favoravelmente em relação a pergunta de alcance nacional sobre a instituição em concreto das regiões administrativas, as respostas a perguntas que tenham tido lugar relativas a cada região criada na lei não produzirão efeitos".

Nos termos do artigo 115.º, um referendo "só tem efeito vinculativo quando o número de votantes for superior a metade dos eleitores inscritos no recenseamento".

A 8 de novembro de 1998 os portugueses rejeitaram a instituição em concreto das regiões administrativas, prevista na Constituição, com mais de 60,87% de respostas "não", num referendo sem efeito vinculativo, uma vez que a abstenção foi de 51,88%.

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