Coro de críticas à dissolução da Memorial International e do Centro de Direitos Humanos

O centro tinha sido poupado a uma primeira decisão do tribunal, mas isso só durou um dia.
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Um dia depois de o Supremo Tribunal russo ordenar a dissolução da organização não-governamental Memorial International, um tribunal de Moscovo decretou também o fim do Centro de Direitos Humanos com o mesmo nome. Dois gestos que foram alvo de um coro de críticas internacional, com o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos a pedir a suspensão desta decisão, enquanto analisa um recurso dos responsáveis do centro, o Reino Unido a denunciar um "golpe arrepiante para a liberdade de expressão na Rússia" e os EUA a falar numa "afronta".

Criada nos anos 1980, na era de glasnost (abertura e transparência) decretada pelo então líder soviético Mikhail Gorbachev, a Memorial conta entre os seus fundadores com o dissidente Andrei Sakharov (nobel da Paz de 1975). Desde 1992, a Memorial International documentava a repressão política e ajudava a reabilitar aqueles que foram vítimas do regime de Estaline. O Centro de Direitos Humanos, com o mesmo nome mas registado como uma organização diferente, tinha vindo a fazer um levantamento das violações mais recentes, incluindo durante a presidência de Vladimir Putin, nomeadamente nas guerras na Chechénia.

Na terça-feira, o Supremo Tribunal condenou a Memorial International por violar a lei dos "agentes estrangeiros" - que exige que esta referência esteja em todas as suas publicações (incluindo nas redes sociais). Além disso, os procuradores acusavam a ONG de "criar uma falsa imagem da URSS como um estado terrorista e denegrir a memória da II Guerra Mundial". A decisão era aplicada a todas as suas subsidiárias regionais, mas não ao Centro de Direitos Humanos.

Contudo, um tribunal de Moscovo decidiu ontem também pelo seu encerramento, depois de os procuradores o acusarem de fazer apologia "do terrorismo e do extremismo" e de violar a lei sobre "agentes estrangeiros" ao não se identificar como tal. "Durante as últimas três décadas, todas as nossas atividades foram direcionadas para proteger os cidadãos da Rússia e os interesses do Estado russo", disse o diretor do centro, Alexander Sherkasov.

Em resposta, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos pediu a suspensão da decisão, enquanto avalia o caso. No mês passado, o Conselho da Europa (a principal organização de direitos humanos do continente) tinha considerado que um eventual fecho da Memorial seria um "golpe devastador" para a sociedade civil, "um pilar essencial de qualquer democracia". Já a alta-comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, indicou através da sua porta-voz que as decisões da justiça russa "enfraquecem ainda mais a comunidade de direitos humanos em declínio do país".

O secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, condenou a "perseguição" à Memorial, considerando-a "uma afronta às nobres missões e à causa dos direitos humanos em todo o mundo". Já o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, lembrou que "olhares críticos ao passado são essenciais para o desenvolvimento saudável e progresso das sociedades", lembrando que "sufocar as liberdades irá, em última análise, enfraquecer aqueles que se envolvem em tais atividades".

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