Contra os profetas da nossa decadência

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Estamos numa época em que falar de patriotismo arrisca a ser politicamente incorreto. Só nos campos de futebol (e o Europeu está agora a começar) parece ser hoje admissível o orgulho num país, o apego a uma bandeira, a emoção ao ouvir um hino. E, no entanto, os portugueses têm todo o direito de gostarem do seu país, da sua história, cheia de imperfeições como a história de qualquer país, mais até, diria, porque é uma história que transcende de tal forma a dimensão do território e do povo que é ímpar.

No seu discurso do 10 de Junho, o Presidente falou do mar e da sua importância para o futuro de Portugal. E logo nesse Funchal, cidade com mais de 500 anos, nascida das Descobertas, desse esforço dos nossos antepassados para irem além, muito além, dos limites que o Atlântico por um lado e Castela pelo outro pareciam impor-nos. Marcelo Rebelo de Sousa insurgiu-se contra os profetas da nossa decadência e bem, até porque são profecias batidas e sobretudo desmentidas pela história.

Na edição de ontem, em entrevista, o historiador José Eduardo Franco falava de Portugal como "país-inviável-que-sempre-se-viabilizou", usando os hífenes para enfatizar a ideia. Prosseguia o autor de livros como
O Mito de Portugal com a sua explicação: "Um país que cai, mas que se levanta sempre. Que perde, mas não desiste de voltar a arriscar, a procurar uma saída. Portugal é um caso de resiliência histórica. Observado e cobiçado, por mar e por terra, por adversários poderosos e territorialmente mais volumosos, tem sabido, durante quase um milénio de história, fazer das suas fraquezas grandezas, unindo-se nos momentos cruciais para não perder a possibilidade de continuar a escrever a sua história em conjunto. É também o país que se valoriza mais quando está fora do que quando está dentro."

Esta ideia de que de fora se vê com mais perspicácia o país que somos é atestada pela opinião positiva que quem viaja ou quem emigra (Marcelo também falou e muito dos emigrantes) descobre sobre Portugal mundo fora. Uma opinião positiva ou muita positiva, mesmo que com exceções, que testemunha nesta sexta-feira também em entrevista ao DN o recém-eleito presidente do Conselho da Diáspora Portuguesa. "O português chega a qualquer lugar do mundo e consegue um nível de integração absolutamente admirável", afirma António Calçada de Sá, alto quadro da espanhola Repsol, que vive hoje em Madrid mas tem experiência de vida em vários países e conhece outros devido à profissão. Ora, se os portugueses são bem vistos, o país também o é e vice-versa e isso é inegável.

Devemos ambicionar mais? Certamente. E isso o próprio Presidente da República disse, em tom de desafio nacional, com toda a clareza nas celebrações do 10 de Junho. Paremos na data: quantos países terão como dia nacional a data de morte de um poeta, mesmo que Camões tenha sido também um guerreiro e um viajante e por isso os seus Lusíadas sejam tão únicos? Sejamos arrojados a pensar no futuro, sem perder essa alma de poetas (desculpem o lugar-comum mas sempre é melhor do que o politicamente correto) que nos caracteriza como povo.

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