Colegas e políticos sublinham elegância e talento de Carmen Dolores
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, lamentou hoje a morte da atriz Carmen Dolores, enaltecendo "a sua carreira distinta", com "rigor e elegância" no teatro e em momentos importantes do cinema português.
Numa mensagem de pesar publicada no portal da Presidência da República, o chefe de Estado recorda que, "em 11 de julho de 2018, a sala principal do Teatro da Trindade, em Lisboa, passou a chamar-se Sala Carmen Dolores" e que nessa ocasião entregou à atriz as insígnias de Grande-Oficial da Ordem do Mérito, "uma das muitas distinções que lhe foram conferidas".
"Esse reconhecimento, expressivo, simultâneo e constante, do público, dos pares e dos responsáveis políticos, é tão significativo quanto justo, tendo em conta o talento de Carmen Dolores, a sua carreira distinta e uma certa ideia de estar em palco e de estar no espaço público", considera o chefe de Estado.
Marcelo Rebelo de Sousa enaltece a carreira de Carmen Dolores no teatro, descrevendo-a como "atriz de repertório", que "interpretou, com rigor e elegância, os clássicos e os clássicos modernos" - Shakespeare, Strindberg, Pirandello, Brecht, Giraudoux, Tennessee Williams, várias vezes Tchekhov - "com uma presença que impressionou diferentes gerações".
Já o ator Diogo Infante disse ser-lhe difícil encontrar as palavras certas para fazer justiça ao que a atriz foi para si. "Foi minha mãe, minha confidente, minha musa inspiradora, mas sobretudo minha amiga e é dessa de quem sentirei mais falta... Obrigado querida Carmen, por tudo!", afirmou o ator numa mensagem enviada à Lusa.
Diogo Infante assumiu que enquanto se debate "entre a emoção por encontrar as palavras certas que façam justiça" a Carmen Dolores, "ao seu talento e ao seu legado", e expressem o seu "amor, carinho e gratidão", ouve-a dizer baixinho, "não exageres...".
O atual diretor artístico do Teatro da Trindade, em Lisboa, conclui dizendo que "Carmen será sempre lembrada como uma figura maior do teatro português, como uma atriz apaixonada pela sua arte, uma mulher de uma delicadeza e generosidade desconcertantes".
O fundador do Teatro Experimental de Cascais Carlos Avilez considerou que "o teatro está de luto". Carlos Avilez disse que "adorava a Carmen Dolores", por quem tinha "uma grande amizade e um grande respeito", classificando-a como "uma pessoa única" e uma "mulher de causas".
"Não conheço ninguém que não gostasse da Carmen, fala-se dela e a classe inteira tinha um respeito e uma admiração enorme pela Carmen. Ainda bem que chegou a ser homenageada em vida", afirmou.
O ator e encenador destacou ainda "a magnifica voz que a Carmen tinha", a sua "autoridade humana", a "sensibilidade" e a "elegância na forma de ser".
Tendo trabalhado com Carmen Dolores "como ator", em 1956, e feito com ela em Cascais "duas peças", Carlos Avilez revelou ter sido "sempre um grande admirador" da atriz.
"Ainda na semana passada falei com ela. Embora tivesse 96 anos, não esperava [a sua morte]", acrescentou.
O diretor artístico do Teatro Nacional D. Maria II, Tiago Rodrigues, destacou hoje o "extraordinário talento" e a "enorme dignidade e elegância" da atriz Carmen Dolores, que morreu na segunda-feira.
"O extraordinário talento de Carmen Dolores andava de mãos dadas com uma enorme dignidade e elegância", escreve Tiago Rodrigues, na página oficial, no Facebook, recordando os anos de atividade da atriz, o seu papel pioneiro no teatro independente, em particular através do Teatro Moderno de Lisboa, e o modo como desde o início da carreira esteve ligada ao Teatro Nacional D. Maria II.
Carmen Dolores "marcou as nossas vidas e a existência do Teatro Nacional D. Maria II, onde trabalhou desde o início dos anos 50 em inúmeras peças e até ao final dos anos 90", escreve Tiago Rodrigues.
"Durante toda a sua carreira, sem esquecer a breve mas importantíssima aventura que foi o Teatro Moderno de Lisboa, Carmen Dolores foi um exemplo para todos nós. É com profunda tristeza, mas grande sentimento de gratidão, que lhe digo adeus".
A ministra da Cultura, Graça Fonseca, lamentou hoje a morte da atriz Carmen Dolores, uma "voz inesquecível" cujo talento "ajudou a transformar o teatro em Portugal" e que prestou um "serviço de exceção à cultura portuguesa".
"Uma atriz comprometida com a arte de pensar e de agir, num processo completo, que encantou o público, mas educou também e deu a conhecer, através da sua voz única, a diversidade e a riqueza da literatura portuguesa", lê-se numa nota de pesar assinada por Graça Fonseca.
Para a ministra da Cultura, a atriz, que morreu na segunda-feira, em Lisboa, aos 96 anos, "transformou o seu trabalho e o seu talento num legado único e num serviço de exceção à cultura portuguesa", tendo-se tornado também numa "referência da arte de dizer poesia".
"Carmen Dolores pertence a uma geração de atores que transformou o teatro em Portugal, entregando-lhe um saber e uma prática assentes numa relação de compreensão pela palavra, e a importância das suas consequências", prossegue a nota.
Graça Fonseca sublinhou que o seu percurso "é marcado por exemplos onde o poder da interpretação não se extingue na relação entre o ator e o espetador, mas se prolongou numa luta constante entre a liberdade e a censura, entre a força e determinação em fazer vingar ideais e valores de defesa da dignidade humana, entre o político e a ação individual".