Central nuclear instável enquanto a Rússia reclama 200 mortes em ataque
O presidente ucraniano havia alertado para um acontecimento "particularmente cruel" no dia da independência. Com base nas informações dos serviços de informações, as comemorações do dia da independência foram limitadas e multidões a celebrar a data só fora do país, como se registou em Bruxelas, Vilnius, Dublin ou Varsóvia. Um ataque com quatro mísseis à localidade de Chaplyne, na região de Dnipropetrovsk, fez pelo menos 25 mortos, incluindo duas crianças, e dezenas de feridos, numa contagem atualizada na quinta-feira. O dia ficou também marcado pela desconexão da central nuclear de Zaporíjia da rede ucraniana, um novo passo no acumular de tensões à volta deste local ocupado pelo invasor russo.
Para Moscovo, a história da estação de Chaplyne é outra. "O ataque direto de um míssil Iskander contra um comboio militar na estação de Chaplyne, na região de Dnipropetrovsk, matou mais de 200 reservistas das Forças Armadas da Ucrânia e destruiu 10 peças militares a caminho da zona de combate do Donbass", disse o porta-voz do Ministério da Defesa russo Igor Konashenkov, no dia em que o seu líder, Vladimir Putin, deu ordens para que as forças armadas aumentem o número nas suas fileiras em 137 mil, para um total de 1,15 milhões.
Segundo o ministro britânico da Defesa, Ben Wallace, a Rússia perdeu cerca de 80 mil soldados desde o início da invasão, entre mortos, feridos e desertores.
Os jornalistas estiveram na aldeia de Chaplyne, mas foram impedidos de se aproximar da estação. O comboio atingido ligaria Dnipro a Pokrovsk, uma localidade onde os militares na linha da frente vão descansar, mas as autoridades locais negaram que a unidade atingida fosse militar.
Este não é o primeiro ataque a estações de comboios ou paragens de autocarros por parte da Rússia. O mais mortífero - se considerarmos os números fornecidos por Kiev - aconteceu em Kramatorsk, em abril, tendo matado 50 pessoas e ferido umas 100.
"Definitivamente, faremos com que os ocupantes assumam a responsabilidade por tudo o que fizeram", reagiu Volodymyr Zelensky ao ataque, que já havia denunciado durante a videoconferência no Conselho de Segurança das Nações Unidas. "É assim que a Rússia se prepara para a sessão da ONU", criticou, perante um embaixador russo, Vassily Nebenzia, que se mostrou contra a participação do líder ucraniano.
Na reunião, Zelensky voltou a chamar a atenção para o perigo que constitui o facto de a central nuclear estar militarizada, no que foi secundado pelo secretário-geral António Guterres. Horas depois de ter pedido o fim da "chantagem nuclear" por parte de Moscovo, a central de Zaporíjia deixou de estar ligada à rede ucraniana, o que acontece pela primeira vez desde a inauguração do primeiro dos seis reatores, em 1985.
DestaquedestaqueKiev tem alertado para a possibilidade de os russos tentarem desligar a central da rede e ligá-la à Crimeia. Washington considera esse cenário "inaceitável".
Segundo a empresa Energoatom, os dois últimos reatores em funcionamento na central nuclear de Zaporíjia, localizada em Enerhodar, deixaram de estar ligados à rede devido a incêndios e linhas elétricas danificadas, o que aumentou o receio de um acidente.
Poucos dias depois da invasão, militares russos passaram a controlar as instalações, embora permitindo que os engenheiros ucranianos permanecessem e operassem a central. Os combates perto da central entre as forças russas e ucranianas alimentaram as preocupações de um acidente, com Moscovo e Kiev a acusarem-se mutuamente de ataques.
As autoridades ucranianas também alertaram para a possibilidade de a Rússia tentar desligar a central da rede, e ligar à Crimeia, o que iria pesar na economia da Ucrânia, em particular com a aproximação do inverno. A desconexão da central é considerada perigosa, uma vez que uma falha nos sistemas de energia de reserva poderia levar a um derretimento do combustível no núcleo de um reator.
Horas depois, a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), disse que as autoridades ucranianas a informaram de que a última linha de eletricidade estava a funcionar outra vez. Em entrevista à France 24, Rafael Grossi, o diretor da AIEA, disse que tanto Kiev como Moscovo reconhecem que a agência da ONU tem de ir inspecionar a central, que as conversações sobre o acesso às instalações estavam a avançar e que se está "muito, muito perto" de chegar a acordo sobre uma visita, que o próprio quer liderar nos próximos dias.
De Washington chegou o aviso: a energia produzida "pertence legitimamente à Ucrânia e qualquer tentativa de desligar a central da rede elétrica ucraniana e redirecioná-la para áreas ocupadas é inaceitável", disse o porta-voz do Departamento de Estado Vedant Patel. "Nenhum país deve transformar uma central nuclear numa zona de guerra ativa e opomo-nos a qualquer tentativa russa de militarizar ou desviar a energia da central", concluiu.
cesar.avo@dn.pt