Casos dos 20 aos 29 anos aumentam R(t). É preciso reforçar vacinação dos mais velhos rapidamente

O epidemiologista Carlos Antunes diz que aumento do R(t) se deve aos jovens e que os casos nesta faixa etária não podem passar para os idosos. Só assim se conseguirá mitigar o risco das cadeias de transmissão.
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Em quatro dias, a incidência por 100 mil habitantes passou de 83,2 tanto no país como no continente, para 84,3 e 84,7, respetivamente. O R(t) - índice de transmissibilidade - subiu de 0,97 e 0,98 para 1.01 e 1.02, no país e no continente. Segundo Carlos Antunes, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que integra a equipa que faz a modelação da doença desde o início da pandemia, "não é um aumento alarmante", mas é um sinal. "Se conseguirmos vacinar a população acima dos 65 anos com a terceira dose o mais depressa possível, podemos mitigar o risco". Filipe Froes, pneumologista e coordenador do Gabinete de Crise para a Covid-19 da Ordem dos Médicos, concorda que este aumento "é um sinal de que é preciso vacinar rapidamente os mais de 2,2 milhões de pessoas acima dos 65 anos, que são a população mais vulnerável".

Como referiu ao DN o professor da Faculdade de Ciências, o aumento de casos a que estamos a assistir resulta da abertura total da sociedade a partir de 1 de outubro. "O aumento de casos que tivemos em setembro incidiu nas camadas mais novas, dos zero aos 10-12 anos e depois até aos 17 anos, devido à abertura de creches e das escolas. Os surtos registados nestas idades não tiveram muito significado, porque se conseguiu que não passassem a barreira das faixas etárias dos pais e dos avós."

Mas, a partir de dia 1 de outubro, a faixa que mais tem crescido em número de casos e que está a empurrar a incidência e o R(t) para 1.0 ou para mais de 1.0 é a dos 20 aos 29 anos. "É a faixa dos universitários, a faixa que mais convive socialmente, em restaurantes, bares, discotecas, festas ao ar livre e na qual ainda há uma margem de população que não terminou o seu esquema vacinal", refere Carlos Antunes.

Aliás, sublinha, "é esta faixa que está a empurrar a incidência e o R(t), mas se conseguirmos fazer com que as cadeias de transmissão não saiam destas faixas etárias - ou seja, se conseguirmos vacinar quem ainda não foi e protegermos os mais vulneráveis -, poderemos dizer, então, que se consegue mitigar o risco" de se vir a desenvolver na comunidade mais infeções e com mais gravidade.

Carlos Antunes e Filipe Froes consideram ambos que já se pode dizer que o país, ao contrário de outros, já está a viver uma situação endémica - uma situação em que já é possível controlar os surtos -, mas, lembram, não se poder esquecer que vamos entrar numa época do ano que favorece o vírus e as infeções respiratórias. "Vamos ter mais frio e mais chuva e não sabemos como vai reagir o sistema imunitário, sobretudo dos mais velhos", argumenta Carlos Antunes. "Até porque, a maioria desta faixa etária já foi vacinada há mais de seis meses e sabemos hoje que ao fim deste tempo os anticorpos nos mais velhos também ficam mais reduzidos."

Destaquedestaque291 casos. Este é o número de infeções positivas à covid-19 registadas ontem. Havendo três mortes e mais 17 internamentos, passando o total para 312, dos quais 64 em unidades de cuidados intensivos. Portugal soma neste momento 1 080 097 de infetados e 18 100 óbitos, desde o início da pandemia.

O pneumologista Filipe Froes relembra também esta situação, sustentando, por isso, ser necessário "vacinar rapidamente os 2,2 milhões de pessoas acima dos 65 anos. São a população mais vulnerável e estamos a entrar precisamente no período do ano que mais favorece o vírus, que é o outono e o inverno. O verão foi favorável ao humano e desfavorável ao vírus, a época que se segue funciona precisamente ao contrário. Reúne todas as condições que favorecem o SARS-CoV-2 e outros vírus, como o da gripe, que levam ao desenvolvimento de infeções respiratórias".

Recorde-se que Portugal foi o primeiro país do mundo a atingir há duas semanas um recorde na vacinação, 85% de população vacinada. Isto significa algo, dizem os especialistas, quanto mais não seja o facto de, em setembro, as cadeias de transmissão registadas nos mais novos não terem passado para as faixas etárias adultas. No entanto, e apesar dos 85% de vacinados, é normal que, com a abertura total das atividades económicas desde o 1 de outubro, desde restaurantes, concertos, bares e discotecas, o número de infeções aumente entre os não vacinados.

Os especialistas sublinham que o aumento que se está a registar nos últimos dias da incidência e do R(t) não é comparável aos registados no início do verão com a quarta vaga, mas pode significar que temos de continuar "a antecipar, monitorizar e a prevenir muito bem as situações de infeção", defende Filipe Froes.

Com a vacinação, explica ainda, "conseguimos separar o aumento de casos da doença da sua gravidade, mas é preciso que esta situação se mantenha", defendendo ainda que após a vacinação dos idosos com a terceira dose, se deve "avançar para os grupos de risco, como profissionais de saúde, professores, forças de segurança, etc."

O epidemiologista da Faculdade de Ciências de Lisboa Carlos Antunes explica ao DN que a análise da sua equipa se tem centrado agora nas faixas etárias por regiões, tendo já concluído que o aumento de casos está a ocorrer em zonas urbanas com uma dimensão de população universitária elevada, casos de Lisboa, Porto e Coimbra.

De qualquer forma, argumenta, "se conseguirmos que estas cadeias de transmissão não passem para outras faixas etárias é normal que o R(t) estabilize em 1 e a incidência também, sem que seja necessário tomar novas medidas de restrição".

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