A Itália adotou todas as medidas necessárias. Merece respeito nesta altura de sofrimento
Excelentíssimo Senhor Diretor,
Fiquei muito admirado com as afirmações do Dr. Jaime Nina - apresentado pelo Seu jornal como sendo "especialista" do Instituto de Higiene e Medicina Tropical - publicadas no artigo "Covid-19. Os italianos são ótimos em pintura, mas não em organização e saúde pública". O que mais me admirou, e a muitos leitores que me escreveram para manifestarem o seu desconcerto, é a escassez de rigor científico à qual o referido "especialista" recorreu para corroborar o seu comentário resumido também no título do artigo.
Afirmar que a prova da fragilidade do Sistema Nacional de Saúde italiano reside na maior difusão que teve na Itália (em comparação com outros Países) o vírus Chikungunya (transmitido pela picada de insetos!), demonstra uma tal modéstia e falta de abordagem científica de uma fenomenologia viral tão complexa, como é a Covid-19, que levanta muitas dúvidas acerca das reais capacidades de análise do entrevistado.
Julgo útil sublinhar em primeiro lugar que a OMS coloca o mesmo Sistema de Saúde italiano, aqui criticado, no segundo lugar no ranking mundial da eficiência (embora o Global Health Index de Bloomberg o coloque "apenas" no quarto lugar mundial).
Contudo, também é de salientar que a Itália, ao contrário do que se afirma no artigo, tem demonstrado uma extraordinária capacidade organizativa desde os primeiros momentos em que o vírus se manifestou, recorrendo imediatamente, entre os primeiros Países da Europa, a medidas extraordinárias de contenção da sua difusão.
Conforme atestado publicamente pela Organização Mundial da Saúde, bem como pelas competentes autoridades da União Europeia, o Governo e o Sistema de Saúde italianos reagiram de forma "simplesmente exemplar", mostrando aliás com absoluta transparência o número das ocorrências após uma ação científica orientada à deteção, análise, isolamento e tratamento de cada caso potencialmente relevante.
Precisamente essa ação capilar, que envolveu quase 50 000 testes com tampões, permite hoje à Itália mostrar a todos e todas o quadro verídico do grau de difusão do vírus.
Perante um fenómeno tão complexo, surpreende a simplicidade de uma abordagem que, pelo contrário, contribui a difundir notícias inexatas acerca da situação da Saúde no nosso País, notícias essas que não correspondem à realidade de um fenómeno de contágio o qual, de resto, permanece significativamente circunscrito a algumas áreas no interior de poucas regiões.
Finalmente, é lamentável constatar como, perante a evidência do esforço de um inteiro País em mitigar os efeitos também psicológicos da difusão da epidemia, o artigo referiu-se à Itália sem a solidariedade e o respeito que ela merece pela forma como tem enfrentado esta emergência e partilhado a sua experiência em vantagem de outros Países.
Com o desejo de que o Seu jornal possa no futuro valer-se de contributos mais fidedignos e respeitosos ao julgarem os sacrifícios de um País que está a mostrar grande sentido de responsabilidade para com os parceiros europeus e a comunidade internacional, envio-Lhe cumprimentos cordiais.
*Embaixador de Itália em Portugal