Carta da ONU "afirma igualdade"

Necessidade de aumentar representação feminina nas Nações Unidas poderá justificar nomeação de secretária-geral adjunta.
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O reconhecimento pela ONU da importância devida ao papel da mulher justifica que António Guterres escolha uma para o cargo de secretário-geral (SG) adjunto, mas que dificilmente será europeia, admite ao DN a professora universitária Mónica Ferro.

A escolha de uma mulher para SG adjunta decorrerá do compromisso, assumido por Guterres, de respeitar a paridade de género nas suas nomeações. Assim, como "a paridade de género atinge todos os cargos", fazer aquela opção "será uma consequência... se não agora, num futuro próximo", sublinha a especialista em Nações Unidas.

Os dados da própria ONU revelam que as mulheres representam apenas um terço dos seus funcionários - 34%, cerca de 14 mil num total estimado de 41 000. Essa relação mantém-se no grupo sénior de gestores que assessora diretamente o secretário-geral, o qual integra o SG Adjunto e os líderes dos principais departamentos da ONU: em 41 membros - entre eles o português Miguel de Serpa Soares, sub-SG para os Assuntos Jurídicos - só 13 são mulheres.

Esse quadro piora ao nível dos Representantes Especiais e Pessoais do SG, dos seus Enviados e Conselheiros: são 39 e só oito - um quinto - são mulheres. Ora é nesse conjunto de nomeações na cúpula da ONU que António Guterres "pode começar por fazer a diferença", assinala Mónica Ferro.

No caso específico do cargo de SG Adjunto, que foi criado pelo ganês Kofi Annan (1997-2006), Mónica Ferro adianta: "O que se pensou sempre foi que esse lugar serviria para corrigir desequilíbrios de género e também de representação geográfica", dado existirem grupos regionais - como o asiático ou o dos países em desenvolvimento - que há muito criticam o desnível existente no preenchimento dos lugares seniores das Nações Unidas.

Por isso será "muito difícil ter dois europeus no topo", pelo que a hipótese admitida por vários observadores de António Guterres poder escolher a búlgara Irina Bukova - no âmbito de um alegado compromisso com a Rússia, que apoiava aquela candidata da Europa de Leste - estará afastada, considera Mónica Ferro.

Recorde-se que data de 1979 a convenção da ONU contra a discriminação de género. Acresce, lembra a ex-secretária de Estado da Defesa, que a organização aprovou em 2000 uma resolução sobre "Mulheres, Paz e Segurança" - havendo quatro dezenas de países, entre os quais Portugal, que já tem um plano de ação para a implementar.

A verdade é que os números de mulheres envolvidas nas operações de paz continuam a ser desanimadores. Segundo os dados oficiais de agosto deste ano, existem 113 (6,3%) num total de 1791 peritos militares e 2800 em 86 000 tropas (3,25%), 708 (16,1%) entre 4390 agentes policiais.

"A Carta das Nações Unidas é o primeiro tratado internacional que afirma a igualdade entre homens e mulheres. Mas 71 anos depois, é estranho ter tão poucas mulheres em lugares de direção", lamenta Mónica Ferro, concluindo: "É um nível de falhanço muito grande... tantas promessas, tantas resoluções e não se conseguem atingir esses compromissos."

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