Carlos Costa perfeitamente tranquilo com estabilidade da banca e CGD

Governador do Banco de Portugal considera que "no dia-a-dia" falta quem "olhe pelo todo da zona euro e zele pela distribuição de custos e benefícios. Era o que devia ser o Eurogrupo"
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"Estou perfeitamente tranquilo relativamente à estabilidade do sistema", tendo em conta o que ainda falta resolver na Caixa Geral de Depósitos (CGD), disse Carlos Costa, governador do Banco de Portugal.

Orador do painel da manhã na 8.ª Conferência Desenvolvimento Económico Português no Espaço Europeu, organizada pelo banco central, Carlos Costa foi suficientemente evasivo e curto na resposta a uma pergunta difícil: a situação da CGD, que precisa de uma injeção que alguns dizem poder ultrapassar os cinco mil milhões, ameaça outra vez a estabilidade financeira?

Para o governador, não há ameaça alguma. Não explicou a razão da sua tranquilidade. Mas antes respondeu diretamente a outra questão: Portugal deve sair do euro se tudo correr mal entretanto? "Está fora de questão que qualquer país queira dar esse passo."

"Ou seja, se algum der esse passo vai enfrentar custos enormes que não seriam comportáveis pelas sociedades. Não nos iludamos. O que nos falta em integração não é na moeda, mas na economia." Faltam reformas estruturais, "mais produtividade", insistiu Costa.

No painel que debateu "a visão de Portugal sobre o processo de integração europeia" participou também António Vitorino, presidente do Notre Europe. O ex-comissário diz que para a Europa funcionar "temos de criar um mecanismo em que o escrutínio europeu complemente o nacional, a parte europeia não deve é ser substituta".

Eurogrupo devia ser governo

Para Costa, "o problema [na construção europeia recente] é que passámos de um quadro que era adequado para produzir regras no sentido do mercado único para um quadro em que não temos governo para a zona do euro".

Ou seja, "falta alguém que no dia-a-dia olhe pelo todo da zona euro e zele pela distribuição de custos e benefícios". "Era o que devia ser o Eurogrupo. Precisamos de um presidente do Eurogrupo que seja o reflexo de uma maioria parlamentar dentro do Parlamento Europeu", acrescentou o governador.
O banqueiro central recusou a ideia do professor italiano Francesco Giavazzi, orador principal da manhã, que defendeu a evolução do ESM (o fundo ou mecanismo europeu, um dos maiores credores de Portugal) para um modelo mais parecido com o BCE, em que esse instituto ou fundo teria mais poder de fogo (crédito), mas também poderia exigir mais aos países.

"Devia ser mais como o BCE, respondendo ao Parlamento Europeu, e ter um mandato claro", defendeu o economista da Universidade de Bocconi, em Milão.

Na volta, Carlos Costa respondeu com uma das suas metáforas. "Não é por pôr mais cronómetros no automóvel que ele vai ganhar mais corridas, precisamos é de um bom condutor."

"Se não se colocar alguém com poder para os usar, apenas se está a neutralizar. Precisamos de um líder no Eurogrupo que seja o reflexo de uma maioria parlamentar dos países que estão na zona euro e que responda perante essa maioria", insistiu o governador.

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Na semana passada, esta ideia começou a fazer o seu caminho em Bruxelas. Nas recomendações do semestre europeu (ciclo de 2017), a CE disse claramente que "a política orçamental da zona euro é o resultado da agregação de 19 políticas orçamentais individuais" e, logo, "é amplamente aleatória". "Para resolver a situação, é importante ver a zona como uma entidade única, como se houvesse um ministro das Finanças da área como um todo."

Pessimismo e expectativa

No debate de ontem, Costa alertou para a questão dos créditos em incumprimento que, a seu ver, estão a encravar a banca e, logo, a retoma da economia. "O problema dos créditos em incumprimento é um problema de estabilidade financeira." Portanto, "é preciso resolvê-lo" porque os bancos precisam de ser libertados do fardo. É que "sem crédito não há crescimento do produto potencial".
António Barreto, sociólogo do Instituto de Ciências Sociais, foi outro dos oradores e não escondeu o pessimismo face à construção europeia.

"Estou convencido de que ou fomos longe de mais no projeto europeu e do euro, ou ficámos aquém. E o meio caminho é o pior sítio para se estar."

Para António Barreto, "o euro se calhar exigia logo um governo, um banco central, mas também não creio que nesta união tenhamos futuro".

Então, é melhor sair do euro? "Que questão tão, tão difícil. Sair do euro seria desastroso, não devemos sair. A simples metodologia de saída é tão complexa", rematou o sociólogo.

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