Carga fiscal só de impostos foi das que mais desceu na União Europeia desde 2015
O debate político tem sido inflamado em vários temas e um deles, como é natural, é o da carga fiscal. É assim nas épocas dos Orçamentos do Estado, dos Programas de Estabilidade. As eleições não são exceção.
Os dados mais recentes da Comissão Europeia (CE), que permitem comparar os países da União Europeia (UE) e da zona euro, mostram que Portugal está abaixo das médias europeias: não tem das cargas mais elevadas.
Mas a carga fiscal é terreno pantanoso, tem duas medidas de referência, pelo menos.
No sentido mais amplo, o indicador resulta da soma dos impostos e das contribuições sociais (que reflete o crescimento do emprego e da massa salarial) em proporção do produto interno bruto (PIB).
Aqui, Portugal tem a décima marca mais baixa da UE, mas agravou o peso face a 2015, num equivalente a 0,3% do PIB (quando o PS chegou ao poder). E é mais 2,5% do PIB face a 2011, período que incorpora o tempo da troika e do "enorme aumento de impostos". Em 2021, a CE estima 34,7% do PIB em impostos e descontos.
Já na carga fiscal em sentido estrito, em que se considera só a receita de impostos diretos e indiretos, Portugal também está abaixo da média. Aliviou 1% do PIB entre 2015 e 2021, mas é superior em 1,1% do PIB face a 2011, o primeiro ano do resgate.
Em 2021, rondará 24,3%. Não é das mais elevadas, nem está acima da média europeia. Portugal tem a 16ª mais baixa no grupo dos 27 Estados da UE, mas supera Espanha (maior parceiro económico e concorrente) e países como Alemanha, Polónia, Letónia, Eslováquia ou Irlanda.
Na outra medida, a carga fiscal mais ampla (contando com descontos para a Segurança Social), idem. Segundo Bruxelas, Portugal até sai beneficiado em termos comparativos. Aparece como o décimo mais leve dos 27 da UE (os tais 34,7% do PIB em 2021) e está mais distante das médias europeias (cerca de 40%).
Em nenhuma das duas fórmulas é das cargas mais altas da Europa, como atirou recentemente Rui Rio, o presidente do PSD, por exemplo.
Ambos os rankings são liderados por Dinamarca, Suécia, Finlândia e França (ver infografia). Na carga com descontos para a Segurança Social os três Estados mais leves são a Irlanda, Roménia e Malta. Na carga fiscal só com impostos os menos onerosos são a Roménia, Irlanda e República Checa.
O primeiro conceito (sentido lato) capta menos bem o esforço fiscal exigido a empresas e famílias, já que as contribuições aumentam diretamente com o nível da massa salarial e a criação de emprego.
Além disso, em 2020, foram acionadas várias medidas de política de combate aos efeitos dos confinamentos contra a pandemia de covid-19 que visaram, justamente, a preservação de empregos (caso do lay-off e de outras subsidiações à atividade empresarial). Isso impulsionou as contribuições.
O segundo conceito (sentido estrito) tende a captar melhor o esforço exigido em impostos.
Em contas nacionais (dados da CE), os impostos estão divididos em dois grandes agregados. Os diretos (sobre os rendimentos, como IRS, IRC, etc.) desceram de 10,7% para 9,8% em 2021 (estimativa da Comissão em novembro). Os indiretos (sobre a produção e importações, como IVA e outras taxas), diminuíram apenas ligeiramente (uma décima, para 14,5% do PIB).
Entretanto, na campanha
Nos debates, o secretário-geral do PS, António Costa, disse que "nestes seis anos, como o desemprego baixou e os vencimentos aumentaram, a receita das contribuições para a Segurança Social cresceu". "É esta componente que tem conduzido ao aumento da carga fiscal. Não são os impostos".
Era a resposta a Rui Rio, do PSD, que o atacou, dizendo que os governos de Costa entregam "um país que é dos que têm maior carga fiscal". Não estava correta a leitura de Rio, nem na carga estrita, nem na mais abrangente.
O líder do Chega argumentou que Portugal tem "a carga fiscal [abrangente] mais alta da história: 34,8% do PIB". Assim, é verdade. André Ventura estaria a referir-se aos últimos dados do INE. Em 2020, a carga fiscal com descontos sociais atingiu esse valor, o maior desde 1995, pelo menos (início da série oficial).
Mas fosse a leitura em sentido estrito, a carga fiscal (só impostos) até desceu, ainda que vagarosamente, para 24,3% no ano passado. O máximo foi em 2015, com 25,3% do PIB, segundo a Comissão Europeia.
Francisco Rodrigues dos Santos, do CDS, também entrou na campanha da carga. Disse assim: "Não fomos nós que fizemos o brutal aumento de impostos. Nós fizemos o contrário. Baixámos o IVA da restauração e da eletricidade".
Problema. Houve o "enorme aumento de impostos" anunciado em 2012 pelo então ministro das Finanças, Vítor Gaspar (do PSD, em coligação com o CDS), cujo impacto brutal aconteceu em 2013.
O país ainda não repôs esses níveis anteriores à troika e ao governo PSD-CDS, de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas.
O aumento em causa ajudou a reduzir o défice público, mas Portugal continua bem apartado dos 21,6% do PIB de carga fiscal (só impostos) de 2010, ano da espiral descendente até à bancarrota.
Na carga fiscal com contribuições, o enorme aumento de impostos desenhado em 2012 fê-la subir de 31,7% para 34% em 2014, mas o embalo foi aproveitado depois nos anos seguintes, também pelo governo PS. Atualmente, esta carga fiscal continua acima de 34%. Depois veio a pandemia e uma nova crise.