Cambridge quer saber até que ponto beneficiou da escravatura
A Universidade de Cambridge, no Reino Unido, lançou uma investigação de dois anos com o objetivo de apurar até que ponto beneficiou, nomeadamente a nível financeiro, do comércio internacional de escravos. Uma medida que surge depois de várias outras instituições do ensino superior, sobretudo em países anglo-saxónicos, terem dado início a processos idênticos, dos quais já resultaram em alguns casos elevadas compensações financeiras, quer diretamente, a descendentes de escravos, quer através de outras medidas destinadas a reparar os erros cometidos.
O levantamento histórico será conduzido por um grupo de trabalho criado recentemente no Centro de Estudos Africanos da universidade e terá como fontes de investigação os arquivos, livrarias e museus da universidade.
"Não podemos mudar o passado mas também não devemos tentar esconder-nos dele", explicou o vice-reitor da universidade, Stephen Toope, citado pela BBC."Nesta fase não podemos saber exatamente aquilo que iremos encontrar", acrescentou Martin Millet, que irá liderar o grupo de trabalho. "Mas é razoável assumir que, tal como muitas outras grandes instituições britânicas durante a era colonial, a universidade tenha beneficiado direta ou indiretamente da escravatura".
Millet acrescentou que os investigadores esperam também encontrar exemplos de oposição à escravatura numa época em que esta era considerada aceitável pela sociedade. "Estamos igualmente interessados na forma como académicos da universidade ajudaram a formar a opinião pública e política, apoiando, reforçando e por vezes contestando atitudes raciais que são repugnantes no século XXI."
A Universidade de Glasgow, na Escócia, terminou no ano passado um inquérito semelhante, concluindo ter obtido donativos equivalentes a cerca de 230 milhões de euros atuais, resultantes de ganhos do comércio de escravos. A direção da Universidade de Londres anunciou a criação de um fundo de 115 milhões de euros destinado a financiar reparações pela escravatura e desafiou as diferentes instituições do ensino superior do país a contribuírem.
Esta reavaliação do papel das grandes universidades tem acontecido dos dois lados do Atlântico. A universidade de Harvard, nos Estados Unidos, anunciou recentemente que irá alterar o símbolo da sua faculdade de Direito por este incluir três fardos de trigo, alusivos a um antigo benfeitor da instituição que era um rico comerciante de escravos.
Também nos Estados Unidos, a Universidade de Georgetown, Washington, anunciou que irá indemnizar os descendentes de cerca de duas centenas de escravos vendidos pela instituição no século XIX.