Autorizados 15 mil tratamentos para hepatite C. Mais dois mil que o acordado
O Infarmed já autorizou cerca de 15 mil tratamentos para a hepatite C, mais dois mil que previa o acordo assinado há dois anos entre o Ministério da Saúde e a farmacêutica Gilead, adiantou a Autoridade Nacional do Medicamento ao DN. Até ao momento foram iniciados 9998 tratamentos, dos quais já resultaram 5099 doentes curados e 187 não curados. O acordo faz dois anos no dia 17 e está a ser feita uma renegociação. À lista inicial juntaram-se mais quatro medicamentos garantem resposta a todos os doentes, diz o Infarmed. Estão todos a ser pagos por uma linha de financiamento própria.
"Atualmente existem cerca de 200 novos pedidos de tratamento por mês, volume esse que tem vindo a baixar na sequência do programa de tratamento para a hepatite C", diz o Infarmed, referindo que "para os novos casos estão a ser autorizados os tratamentos à medida que vão sendo solicitados pelos médicos". O organismo garante que o acesso está assegurado através dos hospitais do SNS e que está a ser resolvida a situação dos doentes nas prisões. "Há um projeto-piloto com doentes do estabelecimento de Custóias (Porto), para o qual foi assinado um protocolo entre a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e o Centro Hospitalar S. João", explica.
O dia 4 de fevereiro de 2015 marca a história do acordo quando José Carlos Saldanha se dirigiu ao então ministro Paulo Macedo na Comissão de Saúde e gritou: "Não me deixe morrer, quero viver!" O preço falado na altura rondava os 48 mil euros por tratamento. Valor que Paulo Macedo classificou de imoral. O acordo reduziu o preço, mas o valor final é confidencial.
José Carlos está curado da hepatite C. "Estou muito grato por estar vivo. Passaram dois anos e estou a melhorar gradualmente. Continuo com algumas limitações pelo facto de ter esperado demasiado tempo pelo tratamento. Estou na lista para transplante. Os doentes tratados... é uma grande vitórias as vidas que foram salvas. Mas a Plataforma Hepatite C continua a receber pedidos de ajuda e os tempos de espera estão maiores", afirma.
José Carlos foi um dos fundadores da Plataforma, tal como António Parente, que irá fazer este mês a análise final para confirmar a cura. "Valeu a luta. Foi uma causa justa. Nestes dois anos a grande conquista foi a possibilidade dos doentes acederem ao medicamento antes de chegarem a uma fase de transplante. Entre 900 a 1200 pessoas todos os anos eram vitimas da hepatite C", referindo que muitos doentes regressaram aos hospitais com esperança. A luta, diz António, continua com atenção aos doentes que ainda não tiveram medicação, ao equipamento que falta nos hospitais, aos doentes nas prisões, à divida do SNS que teme que possa voltar a ser um entrave no acesso, a garantir que todos os que saíram do sistema voltam a ele.
Caminho ainda por fazer
Ricardo Baptista Leite, deputado do PSD, médico e um dos seis distinguidos internacionalmente pela Fundação Path to Zero, diz que o que Portugal alcançou com uma politica de medicamento direcionada para a erradicação da doença "foi pioneiro na Europa e uma referência para qualquer país ocidental". Mas lamenta que ainda falte um plano estratégico para a doença.
"Estamos a gastar milhões de euros em tratamento, mas não fechamos a torneira das novas infeções. É incompreensível como fomos pioneiros no tratamento, mas não fomos capazes de criar um plano de ação para uma abordagem sistematizada de prevenção, diagnóstico, de ligação aos cuidados de saúde, tratamento e cura e respetivos modelos de financiamento. Ainda há um longo caminho a percorrer. É preciso garantir que o novo acordo respeita o espírito inicial que ultrapassou as iniquidades regionais com o pagamento feito por um eixo vertical e que se garanta a redução de preço. Só podemos eliminar a doença quando tivermos um plano", aponta o médico.
Isabel Aldir, diretora do Programa Nacional para as Hepatites Virais diz ao DN que existe "há mais de 20 anos programas implementados com o objetivo de prevenir a transmissão de infeções por via sexual, onde se inclui a hepatite C, como são os casos do programa de distribuição gratuita de preservativos e do programa troca de seringas" e que existem já projetos de Organizações Não Governamentais, financiados pela Direção-Geral da Saúde, que promovem acesso à informação, prevenção e rastreio. Nos casos reativos é feita referenciação hospitalar para confirmação dos resultados e a primeira consulta deve ser feita ao final de sete dias. A responsável acrescenta que o Programa "preconiza o alargamento do rastreio das hepatites virais, através da utilização de testes rápidos a outras estruturas, como sejam os cuidados de saúde primários" e por isso propõem que se faça a compra centralizada do mesmo.