Associação de juízes quer "correção urgente" de alterações ao funcionamento da justiça penal
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) vai apresentar ao governo e ao parlamento uma proposta de "correção urgente" de alterações introduzidas no Código de Processo Penal que diz gerarem "gravíssimos efeitos" no funcionamento da justiça penal.
A direção nacional da ASJP, reunida esta sexta-feira em Setúbal, divulgou que aprovou uma proposta de correção urgente, por via legislativa, de várias alterações introduzidas no Código de Processo Penal (CPP) pela Lei 94/2021, que diz a associação sindical estão a provocar "gravíssimos efeitos" na Lei que define a organização e funcionamento do sistema de justiça penal.
Em causa está a alteração do artigo 40 (alargamento das situações de impedimento processual dos juízes de instrução e julgamento), a revogação do n.º 2 do artigo 419 (alteração da composição do tribunal coletivo nos recursos), o novo artigo 57 n.º 9 (representação da pessoa coletiva ou entidade equiparada arguida em processo penal) e a alteração da alínea a) do n.º 1 do artigo 432 (limita o direito ao recurso dos acórdãos da Relação quando julgam como tribunais de primeira instância).
A ASJP vai também pedir para ser recebida para "expor as suas preocupações pelos gravíssimos efeitos" da Lei 94/2021, sobre alterações processuais penais na organização e funcionamento do sistema de justiça penal, que entrou em vigor em 21 de março.
"Embora inseridas no chamado 'pacote anticorrupção', muitas daquelas alterações nada têm a ver com as políticas de combate à corrupção e não cumprem, sequer, o objetivo de tornar o processo penal mais célere. Pelo contrário, elas introduzem na organização e funcionamento do sistema de justiça penal gravíssimos fatores de entropia e de incerteza na interpretação e aplicação da lei, que certamente não foram ponderados", enfatiza um parecer da ASJP a que a agência Lusa teve hoje acesso.
A ASJP considera que são muitas as normas alteradas no CPP de "duvidosa utilidade e acerto e só a aplicação prática permitirá ver, em toda a extensão, os seus efeitos nefastos", apontando também outras que, "por tão evidentes, podem já ser objeto de intervenção corretiva urgente por via legislativa".
Por exemplo, refere a ASJP, a alteração do artigo 40 do CPP, "multiplicando até ao limite do concebível as situações de impedimento processual dos juízes de instrução e julgamento, trará constrangimentos à organização e funcionamento da justiça penal difíceis de medir neste momento, mas que se podem já adivinhar caóticos".
A ASJP lembra que se situações de impedimento dos juízes para participarem em certas fases do processo penal, por terem praticado atos em momentos anteriores do mesmo processo, visam garantir a imparcialidade do tribunal, mas devem, por isso, "restringir-se às situações em que essa participação do juiz no processo é idónea a gerar dúvidas objetivas sobre a possibilidade de pré-vinculação a um juízo positivo ou negativo sobre a culpabilidade do arguido".
Por outro lado, adianta a ASJP, tratando-se de situações que levam ao afastamento do juiz designado para o processo pelas regras legais aplicáveis, isto é, de situações em que se exceciona a aplicação do princípio do "juiz natural" ou do "juiz legal", elas deverão também "restringir-se à prática de atos que verdadeiramente justifiquem, com proporcionalidade, derrogar a aplicação daquele princípio fundamental".