Assad não cumpre trégua e volta às armas químicas
O exército voltou ontem a atacar a região de Ghouta, nos subúrbios de Damasco, pelo quinto dia consecutivo após a aprovação no passado sábado de um cessar-fogo humanitário pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas para vigorar por 30 dias em todo o território sírio.
A ofensiva das forças fiéis ao regime de Bashar al-Assad desenrolou-se no mesmo dia em que se soube, através de um relatório de um painel de peritos da ONU, que a Síria continua a recorrer a armas químicas no teatro de guerra, apesar de se ter comprometido, em 2013, a destruir o seu arsenal deste tipo de armas. O que sucedeu num momento em que Damasco estava sob ameaça de retaliações internacionais, se não o fizesse. Posteriormente, em abril de 2014, março de 2015 e abril de 2017, há provas de ataques químicos, respetivamente nas localidades de Talmenes, Sarmin e, para o terceiro caso, na província de Idlib. Foi em resposta a este ataque que os Estados Unidos retaliaram, a 6 de abril do mesmo ano, com o disparo de mísseis Tomahawk sobre a base de onde teriam partido os aviões envolvidos no ataque.
Um relatório da Organização para a Proibição das Armas Químicas confirmou que o ataque foi realizado com gás sarin, agente que exige alto nível de sofisticação na preparação e utilização operacional.
O embaixador dos EUA para o Desarmamento, Robert Wood, falando em Genebra, acusou a Rússia de estar a mentir sobre a "total eliminação das armas químicas sírias", como se comprometera em 2013. Moscovo e Damasco continuam a insistir que o regime sírio não tem quaisquer equipamento letal desta natureza.
Além de coincidir com a continuação dos combates, a divulgação do relatório foi acompanhada por uma notícia que volta a referir o recurso a armas químicas da parte das forças governamentais sobre o último enclave nos arredores da capital nas mãos da oposição. Elementos da proteção civil síria e pessoal médico em Ghouta referiram ontem às agências que 18 pessoas, das quais uma criança, tiveram de ser tratadas depois de apresentarem sintomas de terem sido afetadas com "gases venenosos". O ataque teria sucedido na segunda-feira, mas só ontem confirmaram os factos.
Quanto às ligações entre a Coreia do Norte e o regime de Assad, o relatório dos peritos da ONU, consultado pela BBC News, revela que, entre 2012 e 2017, técnicos de Pyongyang foram vistos em instalações militares sírias e que, no período em causa, foi exportado para a Síria materiais utilizáveis para o fabrico de agentes químicos. O documento refere especificamente válvulas, canalizações e chapas resistentes à ação de ácidos e agentes corrosivos. Segundo serviços secretos ocidentais, citados no mesmo texto da BBC, armas químicas estão a ser preparadas em três sítios: Masyaf, na província de Hama, e em Dummar e Barzeh, nos arredores de Damasco.
Torna-se assim evidente uma aliança quadrúplice entre Damasco, Rússia, Irão e Coreia do Norte num momento em que a guerra civil na Síria ganha contornos de conflito regional, em que os aliados de Assad surgem como dispostos a tudo para o perpetuar no poder.
Com os combates de ontem não foi, sequer, possível cumprir na íntegra a trégua de cinco horas, que Moscovo estabeleceu como alternativa ao cessar-fogo humanitário, para a entrada de bens essenciais e medicamentos e, por outro lado, à saída de civis que o quisessem fazer. Também na terça-feira a pausa de cinco horas foi, só parcialmente cumprida.