Medina ouve queixas dos lisboetas: turistas mal educados, cocós dos cães e ruas sem lei
As queixas repetem-se: o ruído excessivo dos bares nas zonas históricas da cidade, o tráfico de droga nas ruas "à vista de todos", a falta de fiscalização e coordenação entre Polícia Municipal e PSP, os turistas que não respeitam os moradores, as lojas de conveniência com "cerveja de litro a um euro", os cocós de cão nos passeios. Esta quarta-feira à noite houve reunião pública descentralizada da câmara municipal de Lisboa para ouvir as preocupações dos moradores das freguesias da Misericórdia, Santo António e Santa Maria Maior.
Houve sala cheia na Escola Básica e Secundária Passos Manuel onde decorreu a sessão e Fernando Medina e os vereadores da autarquia ouviram as críticas e avançaram com soluções. Medina cumprimentou alguns munícipes pelo nome - houve muitos repetentes nesta reunião, mas também estreias. Houve quem pedisse uma casa e quem se admirasse por ver ali à sua frente o presidente da câmara de Lisboa. "Não estava à espera que fosse assim uma coisa tão séria", ouviu-se.
Entre as queixas acima descritas - e que se ouvem invariavelmente em cada reunião pública - o caso de Sílvia Zenóglio foi uma das exceções. A moradora em Alfama é mãe solteira e está a ser despejada da casa onde mora. "Estou sem água e luz desde agosto", lamentou-se.
Paula Marques, vereadora da Câmara de Lisboa com o pelouro da Habitação já conhecia o caso, que terá chegado ao conhecimento da autarquia há dez dias. "Estamos a tentar ajudá-la, mas todas as suas candidaturas [para que pudesse ter acesso a uma casa ao abrigo dos vários programas da autarquia] caíram porque não entregou a documentação pedida. Tem também de existir um esforço da sua parte", explicou. Sílvia ouviu, anuiu, mas continua sem água e sem luz. A estratégia do senhorio para que deixasse a casa foi criticada pela vereadora, que a descreveu como "bullying".
"O despejo deve-se a falta de pagamento de rendas [Sílvia Zenóglio está desempregada], mas mandar desligar a água e a luz não é um comportamento admissível". Prometida ficou uma vistoria urgente à casa onde Sílvia ainda mora por parte da Proteção Civil.
Foi também a primeira vez numa reunião descentralizada para Diana Tavares, uma recém-mamã de um bebé de sete meses e moradora na Rua do Salitre, que liga o Largo do Rato à Avenida da Liberdade. Não sabia se iria encontrar solução para o seu problema: os passeios na zona onde mora são muito altos e impossibilitam que consiga passar com o carrinho de bebé. O sogro usa cadeira de rodas e também não consegue circular em segurança pela Rua do Salitre. Os parquímetros da EMEL roubam espaço à circulação pedonal e as obras na rua também suprimiram vários lugares de estacionamento. A calçada portuguesa no passeio é outro dos "pontos negros" que a munícipe identificou.
Fernando Medina respondeu diretamente a Diana Tavares e avançou logo ali com uma solução. A zona de cargas e descargas na rua dará lugar a pelo menos mais quatro lugares de estacionamento. Medina avançou mesmo com a ideia de retirar a calçada portuguesa dos passeios na Rua do Salitre e lembrou que a autarquia atribuiu verbas às juntas de freguesia para que procedessem a esse tipo de alterações quando assim se justificasse. No entender do presidente da câmara de Lisboa, o caso exposto por Diana Tavares justifica-o. Ficou a promessa.
As críticas mais contundentes chegaram, no entanto, dos moradores das zonas da Bica e do Bairro Alto. Queixaram-se de nada estar a ser feito para resolver, de forma eficaz, o problema do ruído proveniente dos bares da zona. "Ninguém dorme na Bica", disseram.
O tráfico de droga foi também apontado como um problema que não está a ser resolvido. Vários moradores sugeriram que a polícia vigiasse as ruas mas à paisana, uma vez que há sempre quem esteja a vigiar e avise quer os traficantes como os donos dos bares com ruído excessivo.
Os munícipes pedem "mais pressão" sobre os donos dos estabelecimentos que não cumprem a lei do ruído, e são muito críticos em relação ao comportamento dos turistas que ficam hospedados em regime de Alojamento Local. Contaram histórias, como a de um grupo de estrangeiros que despejou o conteúdo de um extintor de incêndio em cima de um morador que se queixou do barulho. Chamada a polícia, os agentes terão minimizado o ato, desculpando-o com a juventude dos turistas.
Os moradores das freguesias da Misericórdia, Santo António e Santa Maria Maior estão cansados de tudo o que de mau a expansão do turismo trouxe: os tuk-tuks em contramão, as trotinetes em cima dos passeios, o lixo acumulado nos caixotes, o álcool a preço do saldo, as festas constantes, o tráfico de droga "sem controlo". Pedem mais ação e Fernando Medina lembrou que houve mais fiscalizações e mais detenções por parte da PSP, mas os munícipes contrapõe e garantem que a insegurança está aumentar e que algumas zonas de Lisboa são "ruas sem lei".
Por isso, os pedidos para que mais zonas de Lisboa recebam câmaras de videovigilância e para que Polícia Municipal e PSP atue não só nos casos mais graves - como roubos e outra criminalidade - mas também no ruído.
Outra queixa recorrente foi também a dos passeios sujos de dejetos de cães. Soluções como a aplicação de coimas - que chegaram a ser propostas durante a reunião - não parecem ser uma alternativa, até porque quem não se quiser identificar não o tem de fazer. Um dos presidentes de junta de freguesia presentes na sessão recordou o momento em que abordou um habitante da sua freguesia e lhe perguntou porque não apanhava o cocó do seu cão. Este ter-lhe-á respondido: "Apanhe-o o senhor".