António Raminhos: "Eu ganho a vida a ser parvo"

Guionista, comediante, estrela das redes sociais, chega amanhã ao daytime da RTP com Praias Olímpicas. Ex-jornalista, diz que é pelo facto de "dizer coisas parvas" que agrada a novos e velhos
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Há um ditado popular que diz que "mais vale cair em graça do que ser engraçado". Qual é o seu caso?

[risos] Pois, boa pergunta. Neste momento estou um bocadinho nos dois lados da história. Estou numa fase em que sei que caí em graça. Mas estas coisas de um momento para o outro podem dar a volta.

Isso preocupa-o?

Não é a questão de me preocupar, mas é evidente que estou a preparar-me cada vez mais para qualquer dia cair em desgraça. Eu sou apologista da desgraça. Estou sempre a achar que vai acontecer qualquer coisa de mal.

Mesmo na escrita de comédia tem essa tentação para o abismo?

[sorriso] O processo é sempre muito doloroso. Estou sempre a achar que aquilo não tem graça nenhuma, que estou a falhar no objetivo, etc.

Isso não é um bocadinho de insegurança? Olha-se para si e não parece estarmos perante um homem de fraca autoestima...

Não é bem isso, mas fazer comédia é uma busca incessante pela aprovação dos outros, pelo reconhecimento, pelas palmas. E às vezes vive-se isso de uma forma bastante exagerada.

Costuma rir-se daquilo que escreve?

[pausa] É engraçado porque as coisas em que mais me rio são as que têm menos piada. Às vezes, escrevo uma coisa e digo "eh pá, isto é muita giro!" Mas depois digo em público a piada e a reação das pessoas não é a mesma que eu estava à espera.

E, nesse caso, a culpa é sua, que não foi capaz de ter piada, ou do público, que não estava preparado para a piada?

É sempre minha. Se eu sou comediante e é suposto fazer rir, e se as pessoas não se riem a culpa só pode ser minha. Convivo com muitos comediantes que dizem: "Eh pá, a noite hoje foi uma treta porque o público era uma merda." Não, o público não é uma merda, o público é aquele que está ali, que paga o seu bilhete e que tem o direito de ser bem servido.

Como definiria o seu tipo de humor?

O meu tipo de humor é... [pausa] é o meu tipo de humor [risos]. Há dias em que estou mais virado para ser mais agressivo e há outros dias em que estou mais parvo. Mas o meu humor é parvo. Há coisas que me passam pela cabeça e que não fazem muito sentido, mas que eu gosto de usar como ferramenta de trabalho.

O nonsense sempre foi uma arma do humor.

Sim, claro que sim.

O António tem uma forte presença nas redes sociais e os seus vídeos com as suas filhas, ainda crianças, são uma das suas imagens de marca. Está aí também um pouco de nonsense.

Sim, está, mas é uma coisa transversal. Os filhos são transversais. Há muita gente que me diz Raminhos, eu faço o mesmo com os meus filhos, mas não tenho coragem de postar na net". A diferença é que eu publico as porcarias que faço [risos].

Em algum momento se questionou sobre a exposição pública a que está a sujeitar as suas filhas menores? Não é uma coisa que o preocupe?

É uma coisa mais ponderada do que as pessoas podem pensar. E ponderada a dois, com a minha mulher, que é uma espécie de editora e censora. Ela já censurou vídeos que achava que eram exagerados. Mas também há vezes em que é ela que incita [risos]. Ela ainda é pior do que eu [gargalhada].

Que idades é que elas têm?

Têm 3 e 5 anos.

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Quando elas tiverem consciência do impacto que estes seus vídeos têm, vai manter este registo?

Vai ficar ao critério delas, claro. Embora eu tenha um sonho - não é bem um sonho, é uma ideia -, que é fazer uma sitcom bem feita em família. Mas isso só quando elas forem mais velhas e tiverem consciência do que estão a fazer. Acho que seria engraçado. [A conversa, que decorre numa esplanada no Parque das Nações, em Lisboa, é interrompida por três jovens, que pedem para tirar uma fotografia com António Raminhos. O humorista e apresentador pede uns minutos e promete a fotografia no final da entrevista]

Pergunta sacramental de jornalista para humorista: há limites para o humor?

[pausa] Pois, essa é a pergunta que se faz sempre. E oiço muitas respostas. Para mim, o limite não é o bom senso, é se tem graça ou não. Às vezes há piadas que funcionam como catarse. Por alguma razão, as pessoas têm sempre vontade de rir nos funerais, e contam piadas. É para descomprimir, diminuir a dor.

O Raminho tem 36 anos. O que é que mudou desde o jovem jornalista estagiário de A Capital?

[risos] Ena, tanta coisa. Eu cheguei mesmo a ser jornalista com carteira profissional e tudo.

Mas acreditou mesmo que faria dessa carreira a sua vida?

Não, porque eu percebi que o reconhecimento do meu valor era muito maior na comédia do que no jornalismo. Mas eu nunca penso no rumo em que a minha vida segue. Penso por alto. Vou surfando a onda.

Nunca tem medo de que a onda seja grande de mais?

Tenho, mas quando lá estou no mar a onda já ali está. Não há volta a dar. Tenho um apelo pelo abismo. O facto de ter feito o Dança com as Estrelas foi um bocadinho nesse registo. Fui convidado e pensei "olha, que se lixe!" [risos]. Tal como este projeto agora que vou ter no daytime da RTP. Convidaram e eu disse logo que sim. Atiro-me de cabeça.

E agora vai atirar-se de cabeça para as tardes da RTP. O seu público é assim tão transversal que aguente a malta nova que gosta das suas piadas e o público mais velho do daytime de uma generalista como a RTP?

[pausa] Acho que tenho um público muito transversal. Ainda ontem num café tinha ao lado uma senhora de 70 anos que me vê na televisão quando eu vou à TVI ou à RTP fazer coisas, e um miúdo com 8 anos que me veio perguntar se eu não era "o Raminhos do YouTube"?

Os dois Raminhos coexistem?

Sim, claro. E vão coexistir agora à tarde. Eu não posso mudar aquilo que sou. Não posso adaptar-me ao público, porque perco a minha identidade. Portanto, neste novo programa [Praias Olímpicas estreia-se nesta segunda feira na RTP1), posso ser mais comedido, não dizer tanta porcaria, mas serei eu.

A que se deve essa transversalidade do seu público?

Eu acho que deve ser de eu ser tão parvo, de dizer coisas tão parvas. Isso agrada aos mais pequeninos e aos mais velhos.

Portanto, ganha a vida a ser parvo...

[risos] Eu ganho a vida a ser parvo.

O Raminhos já foi jornalista, sabe o poder de um bom título. Esta frase dá um ótimo título.

Pois é, dá um ótimo título. "Eu ganho a vida a ser parvo." É na boa!

Ser apresentador, depois de tantos anos a fazer participações em programas, era algo que lhe apetecia?

Sim, gostava. Eu queria experimentar para perceber se fazia sentido ou não. Foi como aconteceu com o 5 para a Meia-Noite. Esta nova experiência é mais um teste.

Como vai ser o programa?

Vamos aproveitar o calor que está, vamos para as praias com o foco nos Jogos Olímpicos. Portanto, vai ser uma espécie de mistura entre o Verão Total e os Jogos sem Fronteiras.

E o Raminhos vai fazer de Eládio Clímaco?

[gargalhada] Exatamente. Uma espécie de Eládio Clímaco, mas, como estamos no verão, com umas camisas mais floreadas. Um misto de Eládio Clímaco com Goucha. Vai ser uma mistura explosiva de Eládio com Goucha. Olhe, isto também dava um belo título [gargalhada].

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