Pode parecer incrível, mas há quase cem anos parecia haver um excedente de médicos para os doentes portugueses. "De todos os lados se erguem queixumes de que o campo da medicina está acumulado de médicos", lia-se no DN deste dia, datado de 1909. O relato continuava com ênfase dado ao facto de haver um aparente "frenesi" em conseguir o diploma de médico. "A cultura clássica, as profissões liberais e em especial a formação em medicina engordam e enfeitiçam as famílias", contava o autor, também ele médico..E prosseguia Guilherme José Ennes - assinando aqui apenas com o apelido e a primeira inicial - dizendo que esse diploma, acreditava-se na sociedade, traria fortuna, nome e bem-estar assegurados. "Lamentável engano", acrescentava o cronista, já que "os doentes não chegam já para tantos médicos". "Na medicina, escasseia a matéria-prima, o doente, para essa multidão de médicos que as escolas anualmente estão habilitando.".O problema, aparentemente não era exclusivo de Portugal, mas antes se estendia pela Europa. Pelo que o autor do longo artigo afirmava: "Entendo que quem vai para o comércio, tendo a educação própria, a honorabilidade e a correção que esta carreira exige na atualidade, tem cem vezes mais probabilidades de fazer fortuna (...) Nas grandes casas comerciais, o que é difícil é meter o pé no estribo. O mais, vantagens, acesso e melhoria de situação para quem tem os dotes próprios, vem quase automaticamente", concluía.