"Ainda há tempo". Sindicato desafia patrões a aceitarem acordo com governo
Num momento em que a Antram se mostrou aberta à mediação do governo no conflito com os motoristas de matérias perigosas, o sindicato que representa o setor desafia os patrões a aceitarem o compromisso que fechou com o executivo.
O presidente do Sindicato, Francisco São Bento, em comunicado, sublinha "o esforço negocial do governo" e revela que na maratona negocial que durou 10 horas foi fechado um acordo que abre mão do desdobramento para 2021 e 2022. A proposta, garante o responsável sindical, centra-se num plano de ganhos inferior a 900 euros de salário base.
Francisco São Bento afirma que a nova proposta prevê uma nova dotação salarial capaz de reconhecer a especificidade dos motoristas de cargas perigosas, o grau de desgaste e risco associados ao trabalho, bem como a sua importância para o conjunto da sociedade. "Esse reconhecimento, ainda que pago sob a forma imperfeita de complemento salarial, teria a garantia que seria pago pelos empregadores e tributado pelo Estado, tal e qual como acontece com o valor recebido no salário base", diz.
O Sindicato diz ainda que esta proposta acordada com o governo reconhece que o trabalho suplementar tem de ser pago sem recurso a uma carta branca, cujo resultado é a normalização de turnos de 16 horas, impostos com regularidade pelos patrões. "Realidade, essa, com perigo para nós e para todos os que circulam na estrada".
"Mantemos a convicção de que até ao plenário nacional marcado para domingo, em Aveiras de Cima, o Governo utilizará as ferramentas que ainda tem ao seu dispor para chamar à razão a Antram, fazendo-nos chegar uma proposta que cumpra mínimos de dignidade, por forma a ser apresentada aos motoristas de matérias perigosas no referido plenário", sublinha ainda no comunicado.
No comunicado, o SNMMP indica que a Antram recusou "ceder um milímetro face à sua proposta", depois de 10 horas de reunião na sexta-feira, rejeitando a proposta articulada entre o Governo e a força sindical.
"Porque estamos certos de que ainda há tempo", afirma o sindicalista, "não podemos acreditar que a Antram deseje manter uma posição intransigente que não permita abrir caminho a uma paz duradoura num sector que afeta a vida de todos, mas que não pode continuar a ignorar a dura realidade dos homens e das mulheres que, diariamente, ao volante e sobre rodas, abastecem o país".
O presidente do Sindicato Nacional de Matérias Perigosas (SNMMP) não quis especificar, interpelado pelos jornalistas, quais são as matérias que estão a impossibilitar a assinatura de um acordo com a Antram, a associação que representa os patrões, mas afirma: "há pontos de que nós não abdicamos".
Após o pedido da Antram para que haja mediação do Governo para resolver o conflito laboral, Francisco São Bento disse em Aveiras de Cima que aguarda pela abertura da entidade patronal. "Assim que haja essa abertura lá estaremos para negociar com a Antram, para chegarmos a uma solução de bom senso e acabarmos com esta greve", afirmou aos jornalistas.
O dirigente sindical voltou a afirmar que assim que se iniciar uma reunião com a Antram a greve será suspensa, o que ainda não se verificou, fez notar.
"Segunda-feira esperamos voltar à normalidade, isso é a parte mais importante, o país voltar à normalidade. É o desejo de todos nós", reforçou Francisco São Bento salientando que "o que os trabalhadores procuram é uma vida digna".
Antes deste comunicado do sindicato dos motoristas, o porta-voz da Antram, André Matias de Almeida, fez um apelo aos motoristas para que levantem a greve a fim de negociar. "Levantem a greve e a mediação é aceite pela Antram", assegurou. O tempo dessa negociação, explicou, não tem de ser recorde: "Não tem de estar balizado em dez horas de negociação, como foi feito ontem. A negociação tem o seu tempo", referiu à RTP. Mas, para isso, é necessário para a Antram que os motoristas acabem com a greve: "Vamos deixar as espadas de lado, o país está cansado"
Por enquanto, os motoristas de matérias perigosas cumprem, assim, mais um dia de uma greve por tempo indeterminado, depois de, nesta madrugada, ter falhado um acordo mediado pelo Governo numa reunião que durou cerca de 10 horas.
A paralisação foi inicialmente convocada pelo SNMMP e pelo Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM), mas este último desconvocou o protesto na quinta-feira à noite, após um encontro com a Antram sob mediação do Governo.
No final do primeiro dia de greve, o Governo decretou uma requisição civil, parcial e gradual, alegando incumprimento dos serviços mínimos que tinha determinado.
Portugal está em situação de crise energética, decretada pelo Governo devido a esta paralisação para evitar que fossem afetados serviços essenciais à população.
O porta-voz do sindicato de motoristas de matérias perigosas, Pedro Pardal Henriques, admitiu entretanto recorrer à justiça para "responsabilizar todos aqueles que violaram as leis" na greve.
"Estamos a estudar todas as consequências de tudo aquilo que aconteceu durante o pré-aviso de greve e agora durante a greve e iremos pedir à justiça portuguesa para responsabilizar todos aqueles que violaram as leis", disse Pedro Pardal Henriques.
Em Aveiras de Cima (Lisboa), onde se juntou ao piquete de greve, o porta-voz do sindicato de motoristas de matérias perigosas disse estar "a estudar todas as ilegalidades" e que pedirá à justiça a responsabilização de "todos aqueles que não cumpriram aquilo que deveriam ter cumprido", evitando nomear concretamente o Estado ou o Governo, que decretou a requisição civil.
Antes, o presidente do mesmo sindicato, Francisco São Bento, disse "aguardar com expectativa" a marcação de uma reunião negocial com a Antram - Associação de Transportadores Rodoviários de Mercadorias na qual "se consigam atingir objetivos que sejam benéficos par todos".
O presidente do sindicato sublinhou a "abertura" demonstrada pela Antram para "aceitar a negociação" e anunciou que a direção do SNMMP tem também hoje "estado a articular com outros sindicatos e comissões de trabalhadores" as propostas a apresentar na reunião.
"A esperança é sempre a última a morrer e estamos sempre expectantes que se atinja uma solução", acrescentou Francisco São Bento, admitindo que no plenário marcado para domingo, em Aveiras, será discutida, entre outras, a proposta de desconvocar a greve e de os motoristas se recusarem a trabalhar mais de oito horas por dia.