A retoma da atividade turística, que tem batido novos recordes desde o início do ano, deu fôlego a um verão pautado por máximos de passageiros movimentados nos aeroportos nacionais, e as disrupções voltaram a marcar a operação destas infraestruturas na época alta. Dos 65 mil voos que partiram de Portugal entre junho e agosto (61 mil em 2022 e 65 mil em 2019), 24 mil sofreram atrasos, representando um aumento face ao mesmo período de 2019 (+6,7%) e de 2022 (+8%). Foram também cancelados 1200 voos, afetando 146 mil passageiros. No total, dos 10 milhões de passageiros que partiram dos aeroportos portugueses, 38% sofreram algum tipo de perturbação. Destes, 224 mil são elegíveis para receber uma compensação ao abrigo do Regulamento CE 261/2004, que regula os direitos dos passageiros aéreos de voos operados na União Europeia. Com um valor médio de 400 euros por pessoa, as indemnizações - que podem ascender aos 600 euros - a pagar a estes passageiros totalizam 89,6 milhões de euros, de acordo com os dados cedidos pela AirHelp, empresa que atua nos direitos dos passageiros, ao Dinheiro Vivo. Fazendo as contas ao acumulado do ano, entre janeiro e agosto 54 mil voos registaram perturbações, representando cerca de 7,8 milhões de passageiros afetados, sendo que, destes, cerca de 438 mil são elegíveis para indemnização, o que se traduz num valor a ser reclamado às companhias aéreas de 175 milhões de euros. Os problemas na hora de embarcar não são novidade. "Existiram vários desafios que causaram problemas de funcionamento nos aeroportos, mas é de realçar o facto de os aeroportos ainda se depararem com falta de pessoal no período após a pandemia, bem como as várias greves um pouco por toda a União Europeia (UE)", explica o advogado especialista em direitos dos passageiros e representante da AirHelp em Portugal, Pedro Miguel Madaleno. Por outro lado, "verificaram-se menos problemas com a bagagem dos passageiros durante este ano, o que foi uma melhoria relativamente a 2022". No indicador da pontualidade também há boas novidades. Até abril, Portugal liderava o ranking da UE como o país menos pontual, mas o cenário mudou. "Atualmente, os países com maior número de voos com perturbações são Turquia, França, Itália e Reino Unido. A percentagem de voos afetados por alguma perturbação em Portugal (38%) é consideravelmente mais baixa do que a percentagem de voos afetados na Turquia (52%). O país mais pontual foi a Finlândia, onde apenas 19% dos voos operados sofreram algum tipo de perturbação", enquadra o especialista. Do lado das companhias aéreas, a AirHelp aponta a low cost alemã Eurowings como a mais pontual, com 99% dos voos a operar sem perturbações, seguindo-se a low cost britânica Jet2.com, que apresenta 81% dos voos sem disrupções. O top 3 fica completo com a espanhola Iberia a apresentar uma taxa de 76%. Por outro lado, os voos da TAP foram os que apresentaram mais problemas, como atrasos ou cancelamentos: 42% dos 18 mil voos sofreram perturbações. A AirHelp não adiantou os dados relativos às companhias de baixo custo easyJet e Ryanair. Olhando para as infraestruturas, e sem surpresas, o Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, teve o maior número de voos afetados durante o verão (47%). As ilhas ocupam também lugar de destaque nas contas; o aeroporto da Horta, na ilha do Faial, nos Açores, posiciona-se em segundo lugar no ranking nacional, com uma taxa de irregularidades de 40%, seguindo-se o Aeroporto João Paulo II, em Ponta Delgada, São Miguel, e o aeroporto da Madeira, com 34% de voos afetados. Já o Aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, obteve a menor taxa de voos afetados, 27%, seguindo-se o Aeroporto de Faro, com 28% dos voos a registarem alguma perturbação.. Apesar dos elevados montantes em dívida devido a atrasos e cancelamentos, nem todos os passageiros reclamam as devidas compensações junto das companhias aéreas. Um estudo global da AirHelp revela ainda que, embora seja obrigatório informar os passageiros dos seus direitos, 82% dos inquiridos dizem existir falta de informação por parte destas empresas. A Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (Deco) corrobora as conclusões e admite que é através de contactos alternativos que estes passageiros conseguem, muitas vezes, ser compensados. "Um passageiro que veja o seu voo cancelado dificilmente consegue obter informação sobre os seus direitos em concreto naquele momento, e, muito provavelmente, terá de contactar a transportadora através de outros meios", refere o jurista da associação, Paulo Fonseca. Mesmo através de empresas como a AirHelp ou associações como a Deco, conseguir concluir o pedido de indemnização junto das companhias aéreas apresenta desafios. "Um dos principais problemas prende-se com a indemnização por disrupções: a transportadora não reconhece o direito a indemnização ou invoca que a disrupção corresponde a uma circunstância extraordinária quando não é, embora a ausência de informação e práticas comerciais desleais correspondam a um percentual significativo", detalha. Já Pedro Miguel Madaleno perspetiva que a época de Natal traga um novo aumento de voos com perturbações. "Esperamos que as companhias aéreas e os aeroportos retirem lições com o que aconteceu no passado e contratem mais pessoal qualificado, assim como consigam dar resposta às necessidades dos seus colaboradores quanto às condições de trabalho justas como forma de prevenir novas greves", vinca..jornalista do Dinheiro Vivo