A última livraria da 4.ª Avenida luta pela sobrevivência
A icónica livraria Strand, a última da Book Row, um conjunto de mais de quatro dezenas de livrarias em vários quarteirões junto da 4.ª Avenida de Manhattan, em Nova Iorque tem o futuro em risco. A proprietária fez um apelo para os leitores. Mas atuais e antigos funcionários apontam-lhe o dedo.
A pandemia atingiu em força o setor cultural um pouco por todo o lado em que se recorreu ao confinamento. Nos Estados Unidos, Nova Iorque foi uma das primeiras e mais atingidas cidades pelo novo coronavírus. As consequências não se limitam à lúgubre contagem dos mortos. A economia sofreu e continua a sofrer as consequências da pandemia.
Perante um cenário adverso, a livraria Strand, que tinha David Bowie como cliente, lançou um apelo aos nova-iorquinos.
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"Precisamos da sua ajuda. Este é a mensagem que esperávamos nunca escrever, mas hoje marca um enorme ponto de viragem na história do The Strand. As nossas receitas diminuíram quase 70% em relação ao ano passado, e os empréstimos e reservas de dinheiro que nos mantiveram a flutuar nestes últimos meses estão esgotados."
A Strand perdeu 70% das receitas em comparação com o ano passado e recorreu ao lay-off, tendo dispensado 188 dos 212 trabalhadores. Isto apesar de ter recebido em abril um empréstimo ao abrigo das medidas de estímulo da economia, de um valor entre um e dois milhões de dólares.
Além disso, a proprietária, Nancy Bass Wyden, é criticada por ter investido, junto com o marido, o senador Ron Wyden, milhões de dólares (entre 3 e 7,9 milhões) noutras empresas, desde abril. Entre os investimentos, está à cabeça a Amazon, o gigante da distribuição que as livrarias acusam de levá-las à falência.
A livraria, fundada em 1927, gabava-se das "8 milhas" de livros (12,5 quilómetros). O proprietário à época, Fred Bass, contou em 1993 que o colunista George Will entrou na livraria e perante a imensidão das prateleiras perguntou pela medida. Quando lhe foi dito que eram 7,75 milhas, Will respondeu: "Oito soa melhor. Usa-o". Mas de há uns anos para cá, com o seu crescimento, passou a ser conhecida pelas "18 milhas" (29 quilómetros) de exemplares, das mais diversas áreas e preços.
No entanto, onde antes morava uma livraria que tinha 30 mil volumes de livros raros mas muitos outros a 50 cêntimos, e que vivia em parte dos críticos literários que se desfaziam das obras acabadas de recensear, está agora uma marca que abriu outra livraria (no Upper West Side de Manhattan), e se preparava para abrir outra no aeroporto de La Guardia, em Nova Jérsia).
"A marca é mais importante do que o verdadeiro trabalho duro de gerir uma livraria", aponta James Colon, que trabalhava na loja desde 2012. "Deitámos abaixo tantas prateleiras para colocar produtos. Dezoito quilómetros de livros? Tenho a certeza de que perdemos quilómetros de livros", disse à The Baffler.
As livrarias, lá como cá, passam por dificuldades, mas não baixam os braços. Na semana passada, o associação norte-americana de livreiros (ABA) lançou uma campanha na qual várias livrarias um pouco por todo o país tinha as montras com caixas empilhadas, semelhantes às da Amazon, com uma etiqueta com a inscrição "Não Aceitar o Admirável Mundo Novo da Amazon".
O número de associados da ABA, em tempos mais de 5000, desceu para 1400 em 2009 durante a recessão e numa altura em que os livros os livros em formato digital estavam em grande crescimento. Nos anos anteriores tinham sido postas fora de circulação graças à ascensão das cadeias de lojas Barnes & Noble e Borders, e depois pelo surgimento da Amazon.
Mas a revolução digital estagnou, a Borders foi à falência e a Barnes & Noble recuou após uma longa era de expansão. Em 2019, o número de membros da ABA cifrou-se em 1887, com alguns vendedores a abrirem pontos de venda adicionais.
Mas a pandemia pode acabar com todos os ganhos desde 2009. Um inquérito da ABA realizado neste verão concluiu que cerca de 20 por cento dos membros podem falir.
Já a Amazon continua em crescimento imparável. Segundo um relatório publicado pela sucomissão da concorrência da Comissão Judicial da Câmara dos Representantes, "a Amazon é responsável por mais de metade de todas as vendas de livros impressos e mais de 80% das vendas de livros eletrónicos" no mercado dos Estados Unidos.