Naquele outubro de 2008, quando cheguei a uma Islândia a tentar sair da sua maior crise nada refletia melhor o espírito da ilha do que a Hallgrimskirkja, a igreja luterana em forma de foguetão que se destaca na paisagem de Reiquejavique, coberta de andaimes. Um símbolo de um país ele próprio em obras, a tentar recuperar depois de a crise ter forçado a nacionalização dos seus três maiores bancos. Em obras e com a certeza de que ia sair ainda melhor dos tempos difíceis que fizeram aumentar o desemprego, subir os empréstimos das casas e desaparecer as poupanças de uma vida. Nos cafés da capital, abrigados do frio e da neve que caía lá fora, os islandeses não escondiam a ira. A ira contra os banqueiros. E contra o governo, na altura dirigido por Geir Haarde, por ter privatizado os bancos. Três meses depois de eu deixar uma Islândia decidida a recuperar o lugar no topo do ranking dos melhores países para se viver, o governo caía, derrubado pelos protestos populares. E Haarde acabaria julgado e considerado culpado de má gestão durante a crise. Os islandeses mostravam ao mundo que até podem ser apenas 300 mil mas não têm medo de pedir contas aos governantes quando acham que estes falharam. Passados oito anos, esquecida quase uma crise que obrigou os islandeses a trocarem por uns tempos o caviar e o champanhe pelas fatias de piza e Coca-Cola, os ilhéus voltaram a mostrar a sua fibra. Desta vez quando viram o nome da mulher do primeiro-ministro Sigmundur Gunnlaugsson no escândalo dos Papéis do Panamá. Vieram para a rua, exigiram a demissão do executivo. E conseguiram. O futuro da ilha será definido nas eleições antecipadas para o outono. Mas uma coisa é certa: seja qual for o desfecho desta nova crise, os islandeses saberão sair renovados..*jornalista