A paz efémera
De regra, é no fim das guerras, sobretudo de dimensão mundial, que se fortalece a esperança de conseguir uma paz definitiva, sobretudo para o tempo que não será já o da vida dos intervenientes na definição de normativas e resultados previstos na geração que criou a herança para a geração seguinte, hoje uma das mais destruídas da história. Tal objetivo de implantar o credo dos valores da justiça natural, com instituições bem definidas, como a ONU, com uma imperativa Declaração Universal dos Direitos do Homem, tem sofrido sérias omissões.
Não faltaram violações, de várias espécies, de futuro assumido nos textos proclamados e aprovados, mas, entre os doutrinadores mais escutados, Norberto Bobbio sublinha que a afirmação da "guerra como via bloqueada" era apenas uma metáfora, embora não tenha sido esquecido e apoiado convictamente o avanço técnico da "guerra cirúrgica", uma das mais surpreendentes violações da paz sonhada: foi a que, com fundamento inquietante, foi chamada a "legalização dos cães de guerra", um tema que suscitou o comentário oportuno do comandante Pedro Pezarat Correia, e que P. W. Singer investigou com o seu Corporate Warriors: The Rise of the Privatized Military Industry (2003). A paz não foi considerada facilmente compatível com a notícia mais desejada por gestores que atingiram, segundo comentários, condicionamentos que anunciam o lamento do presidente Eisenhower, o libertador da Europa, sobre a incapacidade que teve na relação com o complexo militar industrial. O contrário do divulgado comentário do Baron von Stengel (1901) no sentido de que a guerra é a tempestade que pacifica o ar e destrói as árvores, deixando o robusto carvalho em pé. Julga-se que foi contra tal corrente que homens como Schuman, Adenauer, Alcide De Gasperi, decidiram assumir, ao longo de anos, a intervenção de Coudenhove-Kalergi, para lhe dar realidade europeia, ocidental e global; o "mundo único" e "a terra casa comum dos homens".
A evolução afastou-se gravemente desta globalizada utopia, multiplicando-se as demonstrações de que tais princípios, e instituições responsáveis, não têm autoridade sobre os Estados, crescendo os cisnes negros contra a esperança. Acontece porém que a pandemia mundializada pela covid-19, estabeleceu uma lembrança da paz que mundializou pelo menos a esperança do fim da guerra de 1939-1945. É visível que esse conceito é contrariado pelo facto do pouco recurso à intervenção da Defesa, diminuindo o conceito de cooperação global, que foi afastado por intervenção americana na Assembleia Geral da ONU, e também na multiplicação de cooperações grupais e no agravamento da concorrência entre potências que foram aristocratizadas no Conselho de Segurança. Os EUA, pela voz do presidente que neste ano deixou o cargo, mas não a ambição, movendo-se para o Pacífico, que é parte do histórico interesse americano, e de costas para o Atlântico; a China, definitivamente assumindo a política que, para sintetizar, procura sanar a situação em que por muitos anos se encontrou, de ser Taiwan que ocupava o lugar, com direito de veto, no Conselho de Segurança; o Reino Unido abandona a União Europeia; os muçulmanos não possuem apenas Estados com políticas no poder ou procurando o poder, com finalidades cooperativas, mas as intervenções, em regime terrorista, como se passou em França que é o Estado da União com maior grupo de imigrantes; com o panorama que se passa no norte de Moçambique, e a violência com modelo terrorista que se passa no Ocidente; a crise na Argélia; a crise receada, sobre o tipo de relação entre o Irão e o Iraque; o reformismo como vida no Líbano; a incapaz solução da Palestina que tem entrada na ONU mas não será membro efetivo.
Tudo, destacando-se embora a estratégia internacional dos Emirados Árabes Unidos, que é um projeto que nem sempre consegue manter o antigo cuidado diplomático vista a dimensão da estratégia. Esta é possível que cause os problemas, por exemplo, em locais no Magrebe, e agora em África, sem esquecer que nenhum povo está livre da pandemia, herdando encontrar exigências que dependem da paz efémera. Mais uma vez a intervenção do Papa Francisco, somando as intervenções ao Estatuto da ONU, e agora indo ao Iraque, e finalmente a maneira como mundializou a Páscoa, é notável. Lembra que a Portugal é exigida intervenção sobretudo nos órgãos de responsabilidade da paz prometida, e tão ameaçadoramente violada. Não se trata, sobretudo na CPLP, de intervir com forças militares, mas com a força da sabedoria e da autoridade, que coopera com o programa, o dever, a experiência do começo da esperançosa ONU, que tem de ver reconhecida a sua utopia encontrando uma nova realidade. Nos executivos, acompanhados pela ação da UNESCO, a esperança e a vontade são frequentemente pregados. É visível que, embora a população do globo sofra muito, os poderes das governanças não parecem tão atentos.