A passagem para a Índia de Mia Hansen-Love

Da Festa do Cinema Francês para as salas de cinema, <em>Maya</em>, o novo de Mia Hansen-Love, uma história de amor na Índia sobre um jornalista de guerra traumatizado e uma jovem indiana de 17 anos. O filme que consagra o ator Roman Kolinka.
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Viajar e não fazer turismo. É isso que Mia Hansen-Love faz no seu novo filme numa estadia pela Índia dos nossos dias. Uma viagem à procura de um tempo de cinema, entre o fascínio e a perplexidade de um local e de um povo que nos colocam perante os constrangimentos do pensamento e perceção ocidental. Maya é, por isso, uma possibilidade de vermos um mundo para além do nosso, uma terra que significa uma relação com o outro.

Mas a Índia que a realizadora de O Que Está Por Vir propõe não é um emaranhado de alegorias ou metáforas, é antes sim um elogio à capacidade de descoberta. Tal como a personagem francesa que se apaixona pela terra e pelas pessoas, o filme mantém um diálogo aberto com a distante capacidade de sermos capazes de olhar e sentir. De forma simples e direta, a boleia pressupõe aceitar o poder de encantamento das árvores, dos cheiros e das brisas daquelas paragens.

De Goa aos confins da imensidão indiana, a câmara de Mia Hansen-Love filma as ações de um jornalista de guerra francês e da jovem Maya com uma distância que é questão de bom gosto. Às vezes, o gesto romântico é de tal forma íntimo que o cinema só o pode sugerir. Isso é o que é mais bonito num filme que corre ao sabor do acaso. Do acaso e de múltiplos níveis de construção dramática, frequentemente resolvidos com silêncios que resolvem arcos narrativos.

A história centra-se em Gabriel, um jornalista de guerra que regressa da Síria (após ter ficado detido como refém) e prefere viajar até à Índia, onde tem a sua mãe emigrada. É lá que descobre uma casa abandonada e que pode ser um novo refúgio. Numa altura em que repensa o conceito de lar, Gabriel decide desfrutar da essência de Índia e faz uma viagem com capacidades terapêuticas, ao mesmo tempo que vai sentido atração por Maya, uma jovem universitária filha de um amigo da família. Maya pode ser a única pessoa no mundo capaz de perceber a sua angústia anterior e poder ajudar a processar um trauma de detenção.

De certa maneira, depois da aclamação do anterior O Que Está Por Vir, este é um trabalho de Mia Hansen-Love que clama por uma ideia de apaziguamento, uma prova de força de um estilo que se define por uma suavidade solene e natural. No atual contexto do cinema francês, Mia Hansen-Love é já uma das vozes mais seguras da sua geração e alguém que terá descoberto um dos mais cinegéticos atores europeus, Roman Kolinka, filmado com a mesma intensidade de Eden e O Que Está Por Vir. Quem filma com amor colhe amor nas imagens...

*** Bom

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