A noite em que Brian de Palma pôs Lisboa aos gritos

Primeiro acontecimento do Warm Up MOTELx foi a exibição na rua de Carrie. Hoje o terror chega com gargalhadas no Largo de São Carlos
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MOTELx não precisou na quinta-feira de aquecimento. O chamado Warm Up do festival internacional de cinema de terror de Lisboa abriu as hostilidades com a sessão de Carrie, de Brian de Palma, ao ar livre na Rua da Moeda, perto do Cais do Sodré, e teve noite quente e uma multidão de jovens. Cinema clássico à borla foi motivo suficiente para encher as 300 cadeiras oferecidas pela Câmara de Lisboa mesmo em frente ao bar Lounge. Uma sessão onde os gritos das vítimas da virgem Carrie de Sissy Spacek se confundiam com gargalhadas, gritos e aplausos dos fãs do MOTELx.

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Mas foi num sepulcral silêncio que a excelente projeção (destaque para o potente som) se desenrolou - este ano a polícia cortou o trânsito em redor e respeitou-se ao máximo o suspense de De Palma. Carrie, estreado em 1976, não envelheceu mal e continua a ser um dos filmes de terror mais invulgares do cinema americano dessa década. Um conto de uma adolescente abusada por uma sociedade americana que a rebaixa perante a cultura da beleza e do sucesso. Uma adolescente que ganha poderes telepáticos que nascem de uma frustração tremenda e de uma educação religiosa excessiva. 40 anos depois o que mais impressiona nesta obra é o tom operático da câmara de De Palma, cineasta que nesse período reformulava uma herança de Hitchcock e deambulava pelas obsessões de uma América que não lidava bem com a nudez feminina.

A sequência do banho de sangue de Carrie no seu baile de formatura obrigou a que muitos dos espectadores não resistissem a fotografar o ecrã nos seus telemóveis. Ninguém fica indiferente à sofisticação da realização de De Palma nesse momento e, sobretudo, a utilização da música do mestre Pino Donaggio, o habitual compositor dos seus melhores filmes. No final, ouviram-se aplausos sentidos para uma sessão que Lisboa certamente não esquecerá. Ver um Brian de Palma num clima de celebração assim é um presente belíssimo para os cinéfilos e para a própria cidade. Não por acaso, Ana Moura, Ana Bacalhau, Carlão e Mayra Andrade também estavam nesta rua ainda salpicada pelo sangue da vingança vermelha de Carrie...

"Queremos repetir este tipo de sessões fora do âmbito desta altura do MOTELx, claro que queremos. Resulta muito bem e notámos que as pessoas adoraram mais uma vez", começa por nos dizer Pedro Souto, um dos diretores do festival. Hoje, o Warm Up prossegue num espaço ainda maior: o Largo de São Carlos com The Rocky Horror Picture Show, o musical de Jim Sharman, provavelmente o maior filme de culto da história do cinema. Mais uma sessão ao ar livre e com entrada livre (são 600 cadeiras viradas para o Teatro São Carlos mas em pé cabem milhares) e convite para interação com o ecrã: "vale tudo menos rasgar a tela", assegura Carlos Pontes, outro dos diretores do festival.

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"Importante neste Warm Up é envolver a cidade. Nisso nunca desistimos, estamos sempre a propor à câmara novas ideias", revela Pedro Souto. Nova ideia é também um Passeio Lisbon Walk que esta tarde arranca das escadas do Teatro D. Maria cujo tema é D. Sebastião, precisamente a figura de relevo da comunicação do festival - o spot realizado por Jerónimo Rocha é um achado! Um passeio que é um jogo para quem quiser seguir as pistas que o próprio guião do spot aponta. Ao mesmo tempo que se percorrem as ruas da cidade, há enigmas para resolver. Começa às 17.30 e é só para maiores de idade. O Warm Up termina no Sabotage, com uma festa de antestreia do festival ao som do concerto dos Quelle Dead Gazelle. Das 00.30 até às tantas.

Em vésperas da décima edição, que começa no dia 6, o MOTELx é um festival que quer crescer (o ano passado fez cerca de 18 mil espectadores e, segundo a direção, tem sempre lotações esgotadas nas sessões da noite). "Este ano a novidade é a competição nas longas-metragens europeias . Todos os anos este festival tem uma coisa nova. Demorámos dez anos porque só agora é que faz sentido esta competição, sobretudo depois de termos conseguido colocar a competição das curtas portuguesas no mapa. Além do mais, todas as nossas decisões demoram horas a ser tomadas. Temos muitas discussões, pensámos muito se valeria a pena apostar na competição das longas. Seja como for, as outras longas continuam no Serviço de Quarto", explica Pedro Souto.

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