Os jardins de Belém enchem-se particularmente aos fins de semana. Aos turistas, juntam-se os residentes no país. A máscara está presente em muitos rostos, dependendo da vontade de quem a usa. Há quem a traga sempre, mesmo quando não há ninguém por perto. Há quem a tire logo que se afasta de ajuntamentos. E assim vai continuar a ser a partir desta segunda-feira, quando o seu uso deixar de ser obrigatório, segundo nos garantem..Uma família joga Uno, a mãe, o pai e as duas filhas, vivem na margem sul. Sentados no chão, num pano que delimita o seu espaço, estão sem máscara. "Não estamos a usar porque não estamos próximos de ninguém. Há pouco estivemos na fila para os pastéis de nata e usámos. O objetivo é continuar a usar máscara, não é por deixar de ser obrigatória que vou ter um comportamento diferente", explica a mãe, Susana Jordão, 36 anos, técnica de amostras. Mas faz questão de sublinhar que concorda com o facto de deixar de ser obrigatória..O pai, Baltazar Silva, 42 anos, empregado na hotelaria, aprova. "Tão rápido não nos vamos livrar da máscara, vai fazer parte das nossas vidas"..As filhas são a Mafalda, de 9 anos, e a Margarida, de 4, não estavam abrangidas pela obrigatoriedade do uso da máscara (só a partir dos 10 anos), mas os pais querem que a usem em algumas situações. Justifica a Susana. "É uma questão de segurança. A vacina não é 100 % eficaz, temos de continuar com os cuidados. A máscara vai passar a ser um acessório, como o relógio"..A obrigação de usar máscara na rua vigorava desde 26 de outubro de 2020, através da lei nº 62-A, aprovada na Assembleia da República. "É obrigatório o uso de máscara por pessoas com idade a partir dos 10 anos para o acesso, circulação ou permanência nos espaços e vias públicas sempre que o distanciamento físico recomendado pelas autoridades de saúde se mostre impraticável"..E tem vindo a ser renovada pelos deputados, o que não aconteceu até este domingo, dia 12, em que caduca. Mas, com quem o DN falou, isso não é motivo para não a continuarem a usar..Maria Odete Coelho passa apressada, mora no Cacém e já fez o passeio do dia para "aliviar um bocadinho a cabeça". Tem o passe e, de vez em quando, dá "uma voltinha". Não tem ninguém por perto, mas não tira a máscara. "Vai deixar de ser obrigatória mas vou continuar a usar se Deus quiser, tenho medo destas coisas"..Tem 79 anos e não saiu de casa nos períodos de confinamento. "Não saia, punham-me as compras à porta e, felizmente, não apanhei covid, a minha filha e o meu neto apanharam. Vou continuar a respeitar as medidas"..Dois casais, amigos de longa data e dos passeios, conversam sentados num banco. Ninguém está com máscara. "Em sítios com muita gente, usamos, aqui não se justifica", diz Ivone Felício, 68 anos. Assegura: "O ano passado não me constipei e este ano também não quero constipar. E a partir desta pandemia, vão surgir outras, temos que nos mentalizar. Desde os 65 anos que tomo a vacina da gripe, vai ser mais uma"..Brinca o marido, Manuel Felício, 73 anos, marceneiro: "Eu sempre usei máscara, mas no trabalho, agora, tem que ser. O mundo está complicado". O casal vive na Buraca..No lado oposto, está o Manuel Marcelino, 72 anos, motorista, pouco falador. Mas a mulher, Helena Marcelino, 66 anos, que trabalhou num laboratório de fotografia, e os amigos espicaçam-no a contar a sua história. "Andava sempre cheio de dores na garganta, chegava a outubro e era certo, lá vinha a gripe. Deixei de beber bebidas geladas por causa disso, bebo cerveja natural, imagine. Veio a covid, todas estas medidas, e nunca mais tive nada, foi-se a gripe e as dores de garganta"..Em resumo, sintetiza a Helena, "Não é pelo facto de deixar de ser obrigatório que vamos deixar de usar máscara. Isto ainda não está a 100%".Junto à fonte da Praça do Império, vários imigrantes do Bangladesh gozam o dia de folga. Moram na zona do Martim Moniz, aproveitam para apreciar outra zona de Lisboa. Desconheciam que a máscara ia deixar de ser obrigatória, recebem a notícia com alegria, mas também eles dizem que a vão continuar a usar em determinadas situações..Sarker Aftiruddin, 32 anos, é quem vive em Portugal há mais tempo, chegou em 2016. Tem uma loja no Centro Comercial do Martim Moniz, o próximo passo é adquirir a nacionalidade portuguesa, o que pode fazer após cinco anos de possuir o título de residência. "Na rua, vou andar sem máscara, agora, nas lojas, nos transportes, no shopping, vou continuar a usar"..Rakeb Hossain, 29 anos, motorista da Uber Eats, queixa-se de muita desinformação sobre o tema, de nem sempre terem a noção do que se está a passar no país. O grande problema é que não fala português -- chegou a Portugal em finais de 2019. Vê com agrado o fim da obrigação. "Estamos todos vacinados, a vacina tem que nos proteger, não podemos usar máscara para toda a vida, muito menos ao ar livre. Agora, no interior dos edifícios e em ajuntamentos, concordo que devemos usar. Mas ainda bem que deixa de ser obrigatória, é muito incómoda"..Uns metros à frente já é zona residencial. Rosário Leal, 69 anos, psiquiatra reformada, é perentória: "Vou continuar a usar a máscara, não me interessa que deixe de ser obrigatória. Confio nos cientistas, não nos políticos. Vou usar quando entender necessário, neste momento não a uso porque estou com a família e não há ninguém por perto"..A família que a acompanha é a filha e os netos. Maria Vasconcelos, 44 anos, técnica, é da mesma opinião. "Vou continuar a usar a máscara quando estiver em ajuntamentos". Outra coisa é a obrigação das crianças usarem a máscara nos recreios. "Não me choca que a usem na sala de aula, choca-me que a usem ao ar livre. Se há determinados eventos, espetáculo, onde não é necessário usar a máscara, porque é que as crianças são obrigadas a usar no recreio ?" O filho, José Rosa, de 11 anos, concorda..Maria é uma das 2020 pessoas que subscreveu a petição "Contra o uso da máscara no recreio", considerando os proponentes que "protege apenas os adultos". Fundamentam: " É incongruente com a liberdade dos adultos para circular na rua sem máscara nesta fase da pandemia, sendo que as crianças passam já - obrigatoriamente - grande parte do seu dia de máscara na sala de aula"..Sublinham que "prejudica não só a saúde física como a capacidade de integração, de interação e de socialização, com todas as consequências psicológicas que daí advêm."