"A Igreja não deve viver obcecada com as questões sexuais"
Autor de uma importante e criativa obra no domínio da teologia e do diálogo entre religiões, Halik, que fez 70 anos em junho, falou ao Plataforma sobre os desafios da globalização, os desafios da Igreja sob o Papa Francisco, o fim dos regimes comunistas na Europa Central e o seu trajeto para a fé. A edição portuguesa contem uma descrição sobre a anterior viagem do teólogo a Portugal, em 2016, quando apresentou a obra Quero que Tu Sejas!
Escreve neste livro que, em 1987, a liderança comunista começa a temer a reação da população e, como o refere, quem tem medo sente a necessidade de assustar os outros. Pensando nesta imagem, diria que hoje em vários países europeus e nos EUA, por exemplo, o medo voltou a ser usado como arma política?
Há diferenças óbvias e é preciso, primeiro, compreender aquela época. Então, estava-se perante um regime policial. Era uma ditadura consciente de que a população não a apoiava de todo. Ao mesmo tempo, era desencadeada a perestroika [reestruturação] na Rússia, que antecipou algumas das coisas que acabaram por suceder em 1989. Para mim, na época, a principal preocupação era a de preparar as pessoas para a democracia. Não queríamos apenas uma perestroika, queríamos a mudança total do sistema económico e político. Era minha convicção profunda que a democracia precisa de uma especial biosfera cultural e moral, de valores partilhados, e que seria muito complexo transformar uma sociedade que fora tão explorada e oprimida por um regime totalitária. E muito difícil fazer as pessoas acreditarem na liberdade. É mais fácil fazer sopa de peixe com um peixe do que criar um peixe a partir de uma sopa de peixe.
Mas as mudanças acabaram por rápidas e totais...
Sim. E todo o programa que tínhamos preparado [O Decénio da Renovação Espiritual] para a reforma da sociedade ao longo de uma década - na vida familiar, na justiça, na Cultura, na Educação e por aí adiante - acabou por não se concretizar. A revolução aconteceu demasiado cedo para se cumprir este programa e as pessoas, após a queda do comunismo, continuam a não saberem viver sem um inimigo. Procuram sempre um inimigo... qualquer que ele possa ser. O que considero extremamente perigoso. Sobre a sua pergunta: um regime totalitário e um regime liberal não têm comparação mas, sim, o medo é também hoje usado como como arma política. Há demasiado medo no nosso mundo e os políticos populistas estão a manipulá-lo. Este é um medo que resulta de um mundo demasiado complexo para ser entendido por muitos e do facto de as pessoas procurarem respostas simples para questões complicadas.
E quais são essas questões?
Este é um mundo profundamente pluralista nas culturas, na ética, na religião e temos de aprender a viver com tudo isto. O que não é fácil. E favorece o aparecimento de novas formas de racismo, de extremismo e de radicalismo religioso. Tudo isto é fator de risco.