A escritora que leu um livro de cada país: 197 num ano
Ann Morgan dormiu muito pouco durante um ano inteiro. A escritora e blogger inglesa terminava o projeto em que, durante um ano, fez um périplo de leitura por escritoras mulheres quando um leitor do seu blogue A Year Of Reading Women lhe fez um reparo: na sua lista, pouquíssimas eram as obras fora do mundo anglo-saxónico.
Estávamos às portas de 2012, ano em que Inglaterra recebeu o mundo que ali ia assistir aos Jogos Olímpicos ou jubileu da rainha Isabel II. Era, pois, a hora certa para o temerário projeto que a levou a, durante um ano, ler um livro de cada país. A "viagem" seria relatada no blogue A Year Of Reading The World, que hoje conta cerca de um milhão de visualizações. A contagem inicial era de 196 livros/países, mas Ann resolveu incluir o Curdistão, 197.º, em representação dos territórios não reconhecidos pelas Nações Unidas.
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Chama-se "temerária" à tarefa pois, em primeiro lugar, apenas 4,5% dos livros que todos os anos são publicados no Reino Unido são traduções. Tal faz do ato de procurar um livro de São Tomé e Príncipe ou do Togo uma difícil façanha.
Em segundo lugar, se a tarefa devia ser realizada num ano, Ann ficava com "1,87 dias para ler cada livro", recorda ao DN. Acresce o facto de, nesse ano, estar a trabalhar no jornal britânico The Guardian. Como tal, "tinha de ler cerca de 150 páginas por dia. Isto tomava-me três a quatro horas por dia, tinha de ler no caminho casa-emprego e muitas vezes na minha pausa de almoço e serões. Ainda tinha de pesquisar pelos livros e escrever no blogue, o que me levava o mesmo tempo da leitura. Não dormi muito nesse ano!"
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Naquela viagem que fez sem sair de Inglaterra, entrou em Portugal pela porta de Eça de Queirós. Leu O Mandarim, numa edição que reúne outros contos, por sugestão de uma colega portuguesa do jornal em que trabalhava. De resto, quase se torna redundante fazer o elenco dos países por que passou Ann Morgan, pois a resposta é simples. Todos. Mas ela recorda algumas travessias, como a aventura que foi ler Olinda Beja, a autora santomense que elegeu. Não havia traduções.
"O meu marido, Steve, sugeriu que eu tentasse que as pessoas traduzissem algo para mim." Pensou que ninguém ia usar o seu tempo para isso. Mas depois de publicar um tweet, os voluntários apareceram. E "incluíam a tradutora Margaret Jull Costa, que traduziu José Saramago e no ano passado recebeu da rainha a Ordem do Império Britânico". Em seis semanas, tinha A Casa do Pastor nas mãos.
O blogue, feito cartografia da viagem, continua. Desde fevereiro existe também um livro, Reading the World: Confessions of a Literary Explorer (The World Between Two Covers: Reading the Globe nos EUA).