A dança tradicional coreana já não é um mistério para estas portuguesas

Eduarda, Natacha, Susana e Carolina têm entre 18 e 24 anos e começaram por só querer aprender coreano
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Há quem pense, olhando para a postura compenetrada com que as seis jovens envergam trajes em rosa e verde-alface de dança sul-coreanos, que são naturais daquele país asiático. Não são. Samanta Almeida, Eduarda Facury, Natacha Costa, Susana Oliveira, Carolina Jardim e Eduarda Freitas têm entre 18 e 24 anos, são portuguesas e interessaram-se pela Coreia do Sul depois de serem cativadas pela K-pop, a música pop sul-coreana, que já produziu fenómenos como o Gang- nam Style, o single de 2014 do rapper PSY que teve mais de dois mil milhões de visualizações no YouTube.

Começaram, algumas há mais de três anos, por querer aprender a língua. O desafio para experimentarem danças tradicionais coreanas surgiu depois. Na semana passada, atuaram perante convidados ilustres na receção de abertura da Semana da Cultura da Coreia, que terminou na sexta-feira no Museu do Oriente, em Lisboa.

[citacao:A professora perguntou se não queríamos saber mais sobre a cultura tradicional e nós aceitámos]

"Estávamos nervosas", admite Eduarda Freitas, que, apesar de ter somente 19 anos, é uma das alunas mais antigas da escola coreana de Lisboa, que funciona aos sábados no Colégio São João de Brito. O projeto, a cargo de Hyun-Jung Jung, começou há quatro anos com um aluno. Hoje, tem 400 entre os 16 e os 73 anos. A maioria quer apenas aprender a falar e a escrever coreano, mas há quem não resista ao desafio de conhecer a fundo a cultura tradicional do país do moderno K-pop.

"A professora perguntou se não queríamos saber mais sobre a cultura tradicional e nós aceitámos", recorda Carolina Jardim, de 21 anos, a segunda mais alta do grupo matematicamente alinhado por altura, vestido rigorosamente de igual e com as mãos quase militarmente na mesma posição, recolhidas no regaço a segurar os leques escondidos pela indumentária verde-alface e rosa-fúcsia. A ocasião não é formal e poderiam estar mais descontraídas, mas a sugestão é acolhida com risos e sorrisos. "Assim vestidas, não conseguimos", respondem, bem-dispostas.

O que envergam são os trajes que habitualmente utilizam nas demonstrações em que apresentam a dança do leque, uma tradição com centenas de anos. Interpretada exclusivamente por mulheres, vive das imagens de flores ou borboletas formadas pelas bailarinas, sempre munidas de dois leques, ao ritmo de música tradicional coreana. "Quem gosta de dançar, devia experimentar", garantem, em jeito de repto aos mais curiosos. E como é habitualmente o seu desempenho em palco?

"Bem", garante a professora, para quem só é possível compreender certos aspetos da língua coreana experimentando a cultura que representa. Hyun-Jung Jung reitera, por isso, a importância de conhecer a tradição que antecedeu a cultura popular de hoje em dia. Na semana passada, foi possível saber um pouco mais sobre ambas.

Semana da Coreia volta em 2016

Durante cinco dias, o Museu do Oriente foi palco de diversas atividade que visaram mostrar a riqueza e diversidade da cultura coreana. Da história de um homem com a capacidade de avaliar a personalidade de outras pessoas que se vê envolvido numa disputa palaciana à do romance entre um antigo praticante de boxe e uma operadora de telemarketing cega, passando pela de três espiões norte-coreanos, treinados desde a infância, infiltrados na Coreia do Sul, que um dia recebem uma ordem inusitada, foram cinco os filmes de realizadores sul-coreanos (Jae-rim, Kwon Chil-in, Yong-Joo Lee, Song Il-gon e Jang Cheol-soo) exibidos entre segunda e sexta-feira no auditório daquele polo cultural.

Ao mesmo tempo, houve a oportunidade para, ainda no âmbito da Semana Cultural da Coreia, qualquer pessoa cumprir o desejo de ser retratada envergando um hanbok (vestido tradicional coreano) e participar em workshops de hanji gongye (papel tradicional fabricado com fibra de amoreira), caligrafia hangeul (alfabeto coreano), taekwondo (arte marcial coreana) e de bojagui (artesanato com retalhos de tecidos). A maioria esgotou. Para o ano, garante ao DN o embaixador da Coreia do Sul em Portugal, haverá uma nova edição da iniciativa que se realizou pelo terceiro ano consecutivo.

"Muitas pessoas conhecem a música e cultura populares coreanas, a Samsung, a LG [marcas de produtos eletrónicos e eletrodomésticos]. Queremos mostrar-lhes que também temos formas tradicionais: a caligrafia, o alfabeto...", explica Yoon Lee, sem esconder a satisfação pela adesão que houve à Semana da Cultura Coreana... e por haver raparigas portuguesas a aprender uma dança tradicional do seu país. "Fiquei surpreendido", reconhece o representante diplomático, frisando que se trata de "um bom exemplo" das boas relações bilaterais entre a Coreia do Sul e Portugal.

As jovens compreendem o porquê da surpresa generalizada. "Normalmente, fala-se mais da China e do Japão. Da Coreia não se fala muito", lembra Eduarda Facury, de 18 anos. Algumas pensam em, no futuro, ir estudar para aquele país, outras em ir trabalhar. Até lá, vão aprofundando o conhecimento da cultura a que chegaram através da K-pop e interiorizando um modo de estar diferente, que se reflete nos mais pequenos detalhes.

A prová-lo, a naturalidade com que, ao saberem que não precisam de esperar pela professora e que podem ir trocar a indumentária sul-coreana pela roupa que vestem no dia-a-dia, respondem que estão à espera de que Hyun-Jung Jung chegue, sempre sem abandonarem a postura formal. O esclarecimento provoca risos e causa admiração, até na comitiva sul-coreana que, na receção do Museu do Oriente, assiste ao momento em que são estrelas. Da rua, lisboetas e turistas, atraídos pelas cores vivas dos trajes tradicionais, aproveitam para tirar uma fotografia. Elas apercebem-se e as suas faces tornam-se rosadas. Mas o quadro, esse, nunca se desmancha.

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