O mundo está a acabar mas resta George Clooney

Com grande aparato chega à Netflix <em>O Céu da Meia-Noite</em>, ficção-científica pela mão de George Clooney. Um filme amargurado mas excessivamente sentimental sobre o fim do planeta Terra.
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E para este natal um filme sobre o fim do mundo, calminho e com mensagem de esperança? George Clooney volta à cadeira de realizador para fazer "sci-fi" supostamente para adultos. Uma história sobre um apocalipse que não é mostrado: a extinção da Terra como planeta sem explicações. Apenas se sugere que é por nossa culpa...Talvez uma praga, talvez um desastre ambiental causado pelo capitalismo... Estamos no futuro e no círculo polar ártico um cientista com uma doença fatal observa este fim do mundo sozinho. Augustine apenas tem um objetivo: avisar os membros de uma missão espacial a não voltar para casa e estabelecer-se em K-23, um planeta que pode ser a última salvação para a nossa espécie. Porém, subitamente, Augustine percebe que não está sozinho...

Meditação sobre solidão, The Midnight Sky é ficção-científica com caudal de aviso ecológico, podendo ser visto como um produto de entretenimento acerca das grandes questões do aquecimento global ou dos flagelos ambientais. Conto de sobrevivência, é também uma lembrança de como estão erradas as prioridades dos humanos num mundo onde se aposta na conquista espacial.

Clooney dirige esta intriga com um aparato tecnológico de se tirar o chapéu e a sua escala de grande produção é sempre digna, mas é raro haver um momento em que se descubram momentos empolgantes. Mesmo as cenas de ação são todas em banho-maria, é como se o filme nunca arrancasse e que os dois segmentos de história não ligassem: nunca queremos muito saber dos dramas pessoais de cada um dos membros da nave que regressa ao nosso planeta nem nos ligamos emocionalmente ao elo entre o cientista e a misteriosa menina que o visita.

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O outro problema do trabalho do Clooney realizador é a forma como filma o Clooney ator, aqui em extrema transformação física: envelhecido, doente e barbudo: tudo é correto mas chama nem vê-la, mas mais grave é a constante dependência no "score" de Alexandre Desplat, aqui a encher toda e mais alguma cena. Nada contra o músico francês mas desta vez tudo parece surgir em demasia e a dar ao filme um tom piegas e lacrimal. Nesse sentido, Clooney parece não se lembrar que o silêncio é o melhor amigo do peso dramático. O Céu da Meia-Noite é realmente daqueles objetos onde mesmo no coração do clímax há sempre um resvalo para a emoção em excesso. Se a isso juntarmos alguma brandura desajustada e meia dúzia de clichés de argumento que se confundem com pontos de formatação, compreendemos que se trata de uma visão futurista molengona e sem novidades. O típico caso de um filme que quer ser complexo mas cuja profundidade é muito rasteirinha.

Clooney já fez melhor: em Nos Idos de Março havia uma outra desenvoltura e em Boa Noite, Boa Sorte parecia filmar com mais coração. Salva-se algum bom gosto na maneira como conseguiu criar um caderno de encargos com a direção artística e alguns bons rasgos de montagem, em especial os cortes abruptos nos momentos de maior tensão. O futuro aqui chega até 2049 e não traz boas notícias. É só pena este céu de planetas novos não ter a melancolia melhor embalada. Em tempos de pandemia, a sua ressonância poderia ser mais lancinante...

** com interesse

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