A escolha da Docinho de Mel, que fica no Montalvão, um bairro central de Setúbal, é logo explicada por Fernando Negrão: "É a pastelaria que fica mais próxima da minha casa." O vice-presidente da Assembleia da República e agora, pela segunda vez, candidato a presidente da Câmara Municipal de Setúbal, vive num bairro vizinho, Brancanes, mas a minha surpresa é quando descubro que crescemos no mesmo bairro, a Reboreda, na parte alta da cidade, já a entrar na serra da Arrábida. Brincamos que só não jogámos futebol juntos porque temos 16 anos de diferença e Fernando (assim ficou combinado o tratamento entre dois setubalenses) já estudava Direito em Lisboa quando eu comecei também a jogar ao "muda aos cinco e acaba aos dez"..Foi, porém, em Carmona, no norte de Angola, que o candidato do PSD nestas autárquicas, juiz de carreira, antigo diretor da PJ e duas vezes ministro, nasceu a 29 de novembro de 1955. Hoje a cidade chama-se Uíge. "O meu pai era aquilo que se podia chamar um africanista. Acreditava em África. E instalou-se em Angola e lá teve dois filhos e uma filha. Mas quando percebeu a violência que se avizinhava, estávamos em 1961, preferiu partir com a família. Ao contrário do que proclamava Salazar, o meu pai percebeu que Angola não era nossa, era dos angolanos", relembra Fernando. Empresário ligado às obras públicas, o Negrão mais velho manteve ligação profissional a África, mas ao antigo Congo Belga, depois rebatizado Zaire e hoje chamado República Democrática do Congo. "O único período que vivi fora de Setúbal depois de cá chegar com 5 anos foram os três anos no colégio interno em Carcavelos quando, por causa dos negócios, os meus pais tiveram de se mudar para a Bélgica", sublinha o homem que gosta de dizer, bairrista q.b., que na casa em Brancanes ouve os passarinhos enquanto faz a barba..Na colina onde fica a Reboreda, a família construiu uma vivenda com vista para o Sado. Era o tempo em que as crianças brincavam na rua e Fernando não foi exceção. Acima estava o Castelo Velho e abaixo o Bairro dos Pescadores. Não raras vezes as relações entre os miúdos descambavam, relembra, a sorrir, e essas memórias são muito idênticas às minhas. As barracas do Castelo Velho, uma antiga fortaleza abandonada mesmo no topo de Setúbal, acabaram por desaparecer, graças aos bairros sociais..Apesar de já ter tomado o pequeno-almoço "bem cedo", o meu convidado para este brunch lá pede uma queijada e uma garrafa de água. O mesmo para mim, mais um café. Sentamo-nos na esplanada da Docinho de Mel e não tarda a que quem passa nos interrompa para trocar umas palavras com o candidato. Apesar de uma vida de trabalho passada sobretudo em Lisboa, o ter sempre morado na cidade torna-o figura popular. A casa onde cresceu na Reboreda já não pertence à família, mas continua a viver com a mulher, Teresa, naquela onde criaram os dois filhos..Um diretor da PJ no autocarro para Lisboa.Fico a saber que andou no liceu de Setúbal, a atual secundária Bocage, e que prestes a acabar a licenciatura em Direito na Universidade de Lisboa foi chamado a fazer serviço militar na Força Aérea. "Fui apanhado de surpresa. A grande maioria dos meus colegas de curso ficaram livres da tropa, mas eu estive dois anos na Ota. Atrasou-me um pouco os planos de vida, mas dou muito valor a essa época. Fez-me sentir o valor da bandeira, o valor do hino. Tenho até hoje muita consciência da importância das Forças Armadas. São elas que garantem a paz de qualquer país, do nosso também", declara..Foi durante 18 anos juiz, boa parte deles passados na Boa Hora, em Lisboa, e confessa ter sido apanhado de surpresa com o convite para diretor da Polícia Judiciária. "Na altura, hoje já não, a direção da PJ competia a um magistrado. Mas não era algo em que eu pensasse, que estivesse nos meus planos. Mas alguns colegas devem ter recomendado o meu nome, por acharem que o perfil correspondia", explica. E foi assim por quatro anos diretor da PJ, entre 1995 e 1999, o que coincidiu com a primeira fase da governação do socialista António Guterres. Recordo-me de ir no autocarro para Lisboa e reconhecer a figura que via na televisão. Pergunto se era comum usar o "via rápida" e admite que sim. "Só usava o carro se tivesse de estar mesmo muito cedo em Lisboa", nota. Foi nessa época, à frente da PJ, que, a propósito do caso Moderna, teve uma situação complicada com jornalistas do DN, que resultou numa excecional revelação de fontes..Estamos mergulhados na conversa e um pardal pousa mesmo junto a Fernando, que põe o indicador sob as patinhas e o pássaro não se assusta. "Até os pardais gostam de mim", diz em tom de brincadeira um homem que confessa apreciar as campanhas como a que está a aproximar-se e que aposta no contacto pessoal para cativar apoios. Mas se houve momento que lhe deu satisfação na vida política foi a primeira passagem pelo governo, em 2004-2005, com Pedro Santana Lopes como primeiro-ministro. "Ser ministro da Segurança Social é do mais importante e interessante que pode acontecer a um político. É lidar com os problemas infelizmente ainda dominantes na sociedade portuguesa como a pobreza e a necessidade de instituições de apoio. Isso requer da parte do responsável político uma proximidade muito grande com as pessoas e com as instituições, sejam as IPSS sejam as misericórdias. Passava a maior parte dos dias na rua, junto das instituições, junto das pessoas. Depois tinha a noite para tratar dos papéis. Sei por experiência própria o que pode mudar numa pequena terra por passar a ter um centro de dia", conta..Deputado desde 2002, Fernando voltou a ser ministro em 2015, da Justiça, no efémero segundo governo de Pedro Passos Coelho. Mas pode dizer-se que foi em 2005, nas autárquicas, que marcou pontos, ao obter mais de 25% em Setúbal, um resultado muito superior ao habitual do PSD. Perdeu para Carlos Sousa, da CDU, autarca que depois saiu a meio do mandato e entregou a câmara a Maria de Dores Meira, que agora não se recandidata por ter atingido o limite de três mandatos. Comento que a máquina local do PCP, que apoia a candidatura de André Martins, dos Verdes, o tem atacado muito por em 2007 ter aceitado ser candidato do PSD em Lisboa, renunciando ao lugar de vereador em Setúbal. Fernando defende-se argumentando que "tudo mudou para mim quando Carlos Sousa, vencedor das eleições, saiu depois de uma facada pelas costas do PCP, e é o próprio que o diz numa entrevista. Além disso, aconteceu quase em paralelo, o desafio do líder do meu partido, então Luís Marques Mendes, para ser candidato em Lisboa. Perdi, mas aprendi muito sobre como se governa uma grande câmara. Foi uma experiência que ficou"..Tanto Fernando Negrão como André Martins já deram entrevistas ao Setubalense, o grande jornal da cidade, a explicarem o seu projeto. Mas ambas as candidaturas estão ainda à espera de saber quem o PS apresentará. Da parte do candidato do PSD, o otimismo prevalece, apesar de o partido nunca ter conquistado a Câmara de Setúbal: "Estou no fim da minha vida política. Tenho uma experiência muito vasta. Esta é a minha terra, e considero-a mesmo como a minha terra, e sei que poderia fazer dela uma terra ainda melhor do que já é. Nas autárquicas sabemos que as pessoas, os eleitores, que somos todos nós, escolhem mais pela pessoa do que pelo partido. E eu estou a contar com isso, não porque me veja como um ser excecional, sou igualzinho a qualquer outra pessoa, mas porque sinto que tenho experiência política e não só, tenho também 20 anos de vida profissional fora da política, e considero que tudo me faz ter condições para ser um bom presidente de câmara. Além disso, o tempo da CDU com a atual presidente terminou. Em democracia a mudança é fundamental. Nós sabemos que é assim que funciona a democracia. Este é o tempo da mudança e os setubalenses têm essa consciência.".Citaçãocitacao"Estou no fim da minha vida política. Tenho uma experiência muito vasta. Setúbal é a minha terra, e considero-a mesmo como a minha terra, e sei que poderia fazer dela uma terra ainda melhor do que já é. Nas autárquicas sabemos que as pessoas, os eleitores, que somos todos nós, escolhem mais pela pessoa do que pelo partido. E eu estou a contar com isso, não porque me veja como um ser excecional, sou igualzinho a qualquer outra pessoa, mas porque sinto que tenho experiência política e não só, tenho também 20 anos de vida profissional fora da política, e considero que tudo me faz ter condições para ser um bom presidente de câmara. Além disso, o tempo da CDU com a atual presidente terminou. Em democracia a mudança é fundamental.".Pergunto, caso seja eleito, qual a primeira medida que tomará. "O planeamento da cidade será a minha prioridade. É fundamental darmos uma lógica à cidade. A cidade tem de ser dividida mais por bairros, no sentido de criar a identidade. No sentido de as pessoas terem resposta às suas necessidades em cada um dos bairros. A primeira medida seria criar um grupo para estudar o planeamento da cidade"..Antes da pandemia, Setúbal estava a cativar cada vez mais turistas, atraídos pela Arrábida e o rio Sado, pelo peixe na brasa e o choco frito, mas também por uma cidade que se tornou mais agradável ao longo dos anos, com recuperação da frente ribeirinha e também de edifícios emblemáticos como o Convento de Jesus. O meu convidado, que finalmente despachou a queijada que parecia esquecida no pires, não tem problemas em elogiar o que foi bem feito: "Tenho a certeza de que toda a gente que geriu a cidade o fez de boa fé. E tendo-o feito de boa-fé, fez coisas boas. E por isso nos últimos 20 anos a cidade melhorou, mas precisa de melhorar muito mais. Vivemos numa cidade a meia hora da capital quando não há trânsito e por isso para não nos transformamos num anexo de Lisboa precisamos de criar uma identidade muito forte. O trabalho a fazer em Setúbal é um trabalho de grande monta. É isso que proponho fazer.".O Vitória como uma instituição da cidade.Falamos do Vitória, mesmo sabendo que Fernando não é muito homem de ir à bola: "Só fui uma vez ver um jogo e foi do Vitória, veja lá!" Garante que o seu compromisso com o clube da cidade é total. "O Vitória é uma instituição da cidade. Se precisar da Câmara de Setúbal, a câmara tem de ser solidária. Comigo pode sempre contar. É preciso lembrar que o Vitória não é só futebol, é também muitas modalidades que servem os setubalenses. E o estádio faz parte da alma da cidade, daquela zona tão bonita do Jardim do Bonfim.".Foi com Rui Rio na liderança do PSD que chegou à chefia da bancada social-democrata no parlamento e a vice-presidente da Assembleia da República e conta com o apoio do presidente do partido na campanha, se bem que não hesite em separar as águas: "Rui Rio está muito empenhado na minha candidatura, tenho certeza de que as vezes que lhe pedir ele virá cá, mas a candidatura é minha, eu é que serei, se os setubalenses e os azeitonenses assim o considerarem, o presidente de câmara e não Rui Rio.".Falamos um pouco do impacto da pandemia, que Fernando diz ter esperado que se resolvesse mais depressa. Elogia a firmeza do governo de António Costa, e do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, nas medidas tomadas contra a covid-19 e realça que Rio esteve bem em apoiar o estado de emergência. "Não sei como estaria o país se não fosse o bom senso, às vezes lembro-me da situação no Brasil ou da catástrofe que a Índia enfrenta agora e se nós não poderíamos ter passado pelo mesmo. Felizmente não. Houve sentido de responsabilidade. Felizmente o tempo dos moderados ainda existe.".O vice-presidente da Assembleia da República recusou ser vacinado como político, por não gostar que "mudem as regras a meio", mas diz-me já ter marcada a vacina pelo Serviço Nacional de Saúde "para segunda-feira às 10h30, ali no Cais 3". Trata-se de uma instalação do Porto de Setúbal não longe das docas. É possível que nesse dia, como em tantos outros, Fernando se cruze com algum dos amigos de infância do Bairro do Grito do Povo, nascido entre a Reboreda e o Bairro dos Pescadores, e este, reconhecendo-o, lhe diga, com a pronúncia setubalense, que o próprio político faz questão de usar quando me recorda a frase que já tantas vezes ouviu: "Ah, Ferrnande. Tudo bem sóce? Tenho aqui um peixinho frresquinho daqueles que tu gostas. Querres?"
A escolha da Docinho de Mel, que fica no Montalvão, um bairro central de Setúbal, é logo explicada por Fernando Negrão: "É a pastelaria que fica mais próxima da minha casa." O vice-presidente da Assembleia da República e agora, pela segunda vez, candidato a presidente da Câmara Municipal de Setúbal, vive num bairro vizinho, Brancanes, mas a minha surpresa é quando descubro que crescemos no mesmo bairro, a Reboreda, na parte alta da cidade, já a entrar na serra da Arrábida. Brincamos que só não jogámos futebol juntos porque temos 16 anos de diferença e Fernando (assim ficou combinado o tratamento entre dois setubalenses) já estudava Direito em Lisboa quando eu comecei também a jogar ao "muda aos cinco e acaba aos dez"..Foi, porém, em Carmona, no norte de Angola, que o candidato do PSD nestas autárquicas, juiz de carreira, antigo diretor da PJ e duas vezes ministro, nasceu a 29 de novembro de 1955. Hoje a cidade chama-se Uíge. "O meu pai era aquilo que se podia chamar um africanista. Acreditava em África. E instalou-se em Angola e lá teve dois filhos e uma filha. Mas quando percebeu a violência que se avizinhava, estávamos em 1961, preferiu partir com a família. Ao contrário do que proclamava Salazar, o meu pai percebeu que Angola não era nossa, era dos angolanos", relembra Fernando. Empresário ligado às obras públicas, o Negrão mais velho manteve ligação profissional a África, mas ao antigo Congo Belga, depois rebatizado Zaire e hoje chamado República Democrática do Congo. "O único período que vivi fora de Setúbal depois de cá chegar com 5 anos foram os três anos no colégio interno em Carcavelos quando, por causa dos negócios, os meus pais tiveram de se mudar para a Bélgica", sublinha o homem que gosta de dizer, bairrista q.b., que na casa em Brancanes ouve os passarinhos enquanto faz a barba..Na colina onde fica a Reboreda, a família construiu uma vivenda com vista para o Sado. Era o tempo em que as crianças brincavam na rua e Fernando não foi exceção. Acima estava o Castelo Velho e abaixo o Bairro dos Pescadores. Não raras vezes as relações entre os miúdos descambavam, relembra, a sorrir, e essas memórias são muito idênticas às minhas. As barracas do Castelo Velho, uma antiga fortaleza abandonada mesmo no topo de Setúbal, acabaram por desaparecer, graças aos bairros sociais..Apesar de já ter tomado o pequeno-almoço "bem cedo", o meu convidado para este brunch lá pede uma queijada e uma garrafa de água. O mesmo para mim, mais um café. Sentamo-nos na esplanada da Docinho de Mel e não tarda a que quem passa nos interrompa para trocar umas palavras com o candidato. Apesar de uma vida de trabalho passada sobretudo em Lisboa, o ter sempre morado na cidade torna-o figura popular. A casa onde cresceu na Reboreda já não pertence à família, mas continua a viver com a mulher, Teresa, naquela onde criaram os dois filhos..Um diretor da PJ no autocarro para Lisboa.Fico a saber que andou no liceu de Setúbal, a atual secundária Bocage, e que prestes a acabar a licenciatura em Direito na Universidade de Lisboa foi chamado a fazer serviço militar na Força Aérea. "Fui apanhado de surpresa. A grande maioria dos meus colegas de curso ficaram livres da tropa, mas eu estive dois anos na Ota. Atrasou-me um pouco os planos de vida, mas dou muito valor a essa época. Fez-me sentir o valor da bandeira, o valor do hino. Tenho até hoje muita consciência da importância das Forças Armadas. São elas que garantem a paz de qualquer país, do nosso também", declara..Foi durante 18 anos juiz, boa parte deles passados na Boa Hora, em Lisboa, e confessa ter sido apanhado de surpresa com o convite para diretor da Polícia Judiciária. "Na altura, hoje já não, a direção da PJ competia a um magistrado. Mas não era algo em que eu pensasse, que estivesse nos meus planos. Mas alguns colegas devem ter recomendado o meu nome, por acharem que o perfil correspondia", explica. E foi assim por quatro anos diretor da PJ, entre 1995 e 1999, o que coincidiu com a primeira fase da governação do socialista António Guterres. Recordo-me de ir no autocarro para Lisboa e reconhecer a figura que via na televisão. Pergunto se era comum usar o "via rápida" e admite que sim. "Só usava o carro se tivesse de estar mesmo muito cedo em Lisboa", nota. Foi nessa época, à frente da PJ, que, a propósito do caso Moderna, teve uma situação complicada com jornalistas do DN, que resultou numa excecional revelação de fontes..Estamos mergulhados na conversa e um pardal pousa mesmo junto a Fernando, que põe o indicador sob as patinhas e o pássaro não se assusta. "Até os pardais gostam de mim", diz em tom de brincadeira um homem que confessa apreciar as campanhas como a que está a aproximar-se e que aposta no contacto pessoal para cativar apoios. Mas se houve momento que lhe deu satisfação na vida política foi a primeira passagem pelo governo, em 2004-2005, com Pedro Santana Lopes como primeiro-ministro. "Ser ministro da Segurança Social é do mais importante e interessante que pode acontecer a um político. É lidar com os problemas infelizmente ainda dominantes na sociedade portuguesa como a pobreza e a necessidade de instituições de apoio. Isso requer da parte do responsável político uma proximidade muito grande com as pessoas e com as instituições, sejam as IPSS sejam as misericórdias. Passava a maior parte dos dias na rua, junto das instituições, junto das pessoas. Depois tinha a noite para tratar dos papéis. Sei por experiência própria o que pode mudar numa pequena terra por passar a ter um centro de dia", conta..Deputado desde 2002, Fernando voltou a ser ministro em 2015, da Justiça, no efémero segundo governo de Pedro Passos Coelho. Mas pode dizer-se que foi em 2005, nas autárquicas, que marcou pontos, ao obter mais de 25% em Setúbal, um resultado muito superior ao habitual do PSD. Perdeu para Carlos Sousa, da CDU, autarca que depois saiu a meio do mandato e entregou a câmara a Maria de Dores Meira, que agora não se recandidata por ter atingido o limite de três mandatos. Comento que a máquina local do PCP, que apoia a candidatura de André Martins, dos Verdes, o tem atacado muito por em 2007 ter aceitado ser candidato do PSD em Lisboa, renunciando ao lugar de vereador em Setúbal. Fernando defende-se argumentando que "tudo mudou para mim quando Carlos Sousa, vencedor das eleições, saiu depois de uma facada pelas costas do PCP, e é o próprio que o diz numa entrevista. Além disso, aconteceu quase em paralelo, o desafio do líder do meu partido, então Luís Marques Mendes, para ser candidato em Lisboa. Perdi, mas aprendi muito sobre como se governa uma grande câmara. Foi uma experiência que ficou"..Tanto Fernando Negrão como André Martins já deram entrevistas ao Setubalense, o grande jornal da cidade, a explicarem o seu projeto. Mas ambas as candidaturas estão ainda à espera de saber quem o PS apresentará. Da parte do candidato do PSD, o otimismo prevalece, apesar de o partido nunca ter conquistado a Câmara de Setúbal: "Estou no fim da minha vida política. Tenho uma experiência muito vasta. Esta é a minha terra, e considero-a mesmo como a minha terra, e sei que poderia fazer dela uma terra ainda melhor do que já é. Nas autárquicas sabemos que as pessoas, os eleitores, que somos todos nós, escolhem mais pela pessoa do que pelo partido. E eu estou a contar com isso, não porque me veja como um ser excecional, sou igualzinho a qualquer outra pessoa, mas porque sinto que tenho experiência política e não só, tenho também 20 anos de vida profissional fora da política, e considero que tudo me faz ter condições para ser um bom presidente de câmara. Além disso, o tempo da CDU com a atual presidente terminou. Em democracia a mudança é fundamental. Nós sabemos que é assim que funciona a democracia. Este é o tempo da mudança e os setubalenses têm essa consciência.".Citaçãocitacao"Estou no fim da minha vida política. Tenho uma experiência muito vasta. Setúbal é a minha terra, e considero-a mesmo como a minha terra, e sei que poderia fazer dela uma terra ainda melhor do que já é. Nas autárquicas sabemos que as pessoas, os eleitores, que somos todos nós, escolhem mais pela pessoa do que pelo partido. E eu estou a contar com isso, não porque me veja como um ser excecional, sou igualzinho a qualquer outra pessoa, mas porque sinto que tenho experiência política e não só, tenho também 20 anos de vida profissional fora da política, e considero que tudo me faz ter condições para ser um bom presidente de câmara. Além disso, o tempo da CDU com a atual presidente terminou. Em democracia a mudança é fundamental.".Pergunto, caso seja eleito, qual a primeira medida que tomará. "O planeamento da cidade será a minha prioridade. É fundamental darmos uma lógica à cidade. A cidade tem de ser dividida mais por bairros, no sentido de criar a identidade. No sentido de as pessoas terem resposta às suas necessidades em cada um dos bairros. A primeira medida seria criar um grupo para estudar o planeamento da cidade"..Antes da pandemia, Setúbal estava a cativar cada vez mais turistas, atraídos pela Arrábida e o rio Sado, pelo peixe na brasa e o choco frito, mas também por uma cidade que se tornou mais agradável ao longo dos anos, com recuperação da frente ribeirinha e também de edifícios emblemáticos como o Convento de Jesus. O meu convidado, que finalmente despachou a queijada que parecia esquecida no pires, não tem problemas em elogiar o que foi bem feito: "Tenho a certeza de que toda a gente que geriu a cidade o fez de boa fé. E tendo-o feito de boa-fé, fez coisas boas. E por isso nos últimos 20 anos a cidade melhorou, mas precisa de melhorar muito mais. Vivemos numa cidade a meia hora da capital quando não há trânsito e por isso para não nos transformamos num anexo de Lisboa precisamos de criar uma identidade muito forte. O trabalho a fazer em Setúbal é um trabalho de grande monta. É isso que proponho fazer.".O Vitória como uma instituição da cidade.Falamos do Vitória, mesmo sabendo que Fernando não é muito homem de ir à bola: "Só fui uma vez ver um jogo e foi do Vitória, veja lá!" Garante que o seu compromisso com o clube da cidade é total. "O Vitória é uma instituição da cidade. Se precisar da Câmara de Setúbal, a câmara tem de ser solidária. Comigo pode sempre contar. É preciso lembrar que o Vitória não é só futebol, é também muitas modalidades que servem os setubalenses. E o estádio faz parte da alma da cidade, daquela zona tão bonita do Jardim do Bonfim.".Foi com Rui Rio na liderança do PSD que chegou à chefia da bancada social-democrata no parlamento e a vice-presidente da Assembleia da República e conta com o apoio do presidente do partido na campanha, se bem que não hesite em separar as águas: "Rui Rio está muito empenhado na minha candidatura, tenho certeza de que as vezes que lhe pedir ele virá cá, mas a candidatura é minha, eu é que serei, se os setubalenses e os azeitonenses assim o considerarem, o presidente de câmara e não Rui Rio.".Falamos um pouco do impacto da pandemia, que Fernando diz ter esperado que se resolvesse mais depressa. Elogia a firmeza do governo de António Costa, e do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, nas medidas tomadas contra a covid-19 e realça que Rio esteve bem em apoiar o estado de emergência. "Não sei como estaria o país se não fosse o bom senso, às vezes lembro-me da situação no Brasil ou da catástrofe que a Índia enfrenta agora e se nós não poderíamos ter passado pelo mesmo. Felizmente não. Houve sentido de responsabilidade. Felizmente o tempo dos moderados ainda existe.".O vice-presidente da Assembleia da República recusou ser vacinado como político, por não gostar que "mudem as regras a meio", mas diz-me já ter marcada a vacina pelo Serviço Nacional de Saúde "para segunda-feira às 10h30, ali no Cais 3". Trata-se de uma instalação do Porto de Setúbal não longe das docas. É possível que nesse dia, como em tantos outros, Fernando se cruze com algum dos amigos de infância do Bairro do Grito do Povo, nascido entre a Reboreda e o Bairro dos Pescadores, e este, reconhecendo-o, lhe diga, com a pronúncia setubalense, que o próprio político faz questão de usar quando me recorda a frase que já tantas vezes ouviu: "Ah, Ferrnande. Tudo bem sóce? Tenho aqui um peixinho frresquinho daqueles que tu gostas. Querres?"