Estrangeiros constituídos arguidos diminuíram para metade em cinco anos
Em 2017 o número de cidadãos estrangeiros suspeitos de crimes constituídos arguidos foi de 2171 por 100 000 estrangeiros residentes em Portugal. Em 2021 esse número caiu para 1250 - menos 74%.
Nestes cinco anos a população de outras nacionalidades que escolheu o nosso país para viver aumentou de 421 711 para 698 887 (+ 65%) enquanto o número absoluto de arguidos desceu de 9 157 para 8736 ( -4,8%).
De acordo com dados oficiais, essa variação é também expressiva quando se recua 10 anos e se verifica a evolução de uma década. Assim, em 2011 o número de arguidos estrangeiros era de 14 387, significando que em relação aos já mencionados 8736 de 2021, a redução foi de 64%.
Se contabilizarmos em relação ao número de habitantes, a redução dessa década passa de 3647 arguidos por 100 mil residentes estrangeiros para 1250 - menos 192% , pratcamente um terço do valor de 2011.
O único valor a subir é a proporção de arguidos estrangeiros face aos nacionais, o que se explica também pelo aumento geral de imigrantes com autorização de residência.
Estas variações em relação à constituição de arguidos - que sucede na primeira fase de um inquérito, quando há suspeita fundada da prática de crime - também são replicadas na última fase dos processos, que são as condenações.
Nesta caso, os números já têm sido referidos para contrariar a tese de André Ventura e de Pedro Passos Coelho (“Nós precisamos de ter um país aberto à imigração, mas cuidado, que precisamos também de ter um país seguro”) de associar imigração a insegurança.
De acordo com as estatísticas da Direção-Geral para a Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), o número de reclusos estrangeiros por 100 mil estrangeiros residentes em Portugal era de 251 em 2022, quase três vezes menos do que os 624 de 2012 e metade dos 508 de 2017.
O número absoluto de reclusos estrangeiros também desceu ( ver quadro).
Em 2017, recorde-se, foi o ano em que houve uma alteração à Lei de Estrangeiros, permitindo aos imigrantes obter autorização de residência com promessa de contrato de trabalho, o que provocou efeito chamada e um disparar de novos pedidos.
De acordo com um levantamento do DN dessa altura, uma semana após o diploma ter entrado em vigor houve um aumento de 1200%. De uma média de 300 pedidos semanais, passou para mais de 4000.
Efeito positivo foi, de facto, uma regularização de milhares de imigrantes, cujas contribuições para a segurança social do seu trabalho ascenderam a 1.861 milhões de euros, tendo beneficiado apenas de 257 milhões - ou seja o valor das contribuições foi sete vezes superior ao das prestações.
PSP: estrangeiros detidos no distrito de Lisboa
Além do que é demonstrado em relação aos arguidos e aos reclusos, o DN solicitou também à PSP que indicasse qual era a situação no terreno, quantos detidos não portugueses tinha registado nos últimos cinco anos.
Esta força de segurança facultou as estatísticas relativas ao distrito de Lisboa, onde em 2022 estavam a residir 325 319 cidadãos estrangeiros, 42% do total dos estrangeiros do países 14% do total da população do distrito, o que é uma amostra bastante expressiva.
A evolução é no mesmo sentido das anteriores dados. Em 2017 a PSP deteve 14 777 estrangeiros e em 2022 foram 19 850, mais 34 %. No entanto, associando estes números ao crescimento da população estrangeira neste distrito, que aumentou 74% neste período (de 182.105 para 325.319) verifica-se que a proporção por 100 mi habitantes passou de 8114 para 6101 - menos 33%.
Desde as declarações de Passos Coelho no comício da AD, que André Ventura, aproveitando a oportunidade oferecida pelo ex-líder do PSD, não perde oportunidade de associar criminalidade aos imigrantes.
Ainda nesta semana, conforme o DN reportou, aproveitou a notícia de que o Supremo Tribunal de Justiça tinha revogado a ordem de expulsão a um imigrante após cumprir pena por violação, tendo apontado como solução penas muito mais duras. “Não descansarei até criminosos deste tipo ficarem na cadeia a vida toda”, disse Ventura, defendendo a reintrodução da prisão perpétua, à qual acrescentou a deportação de criminosos “que nunca mais porão os pés neste país”.
Por seu lado, Mariana Mortágua, a cabeça de lista do BE, numa visita à Associação Solidariedade Imigrante, em Lisboa, assinalou que “por cada um euro que os imigrantes recebem, pagam sete à Segurança Social, são essenciais à economia portuguesa e quem vem levantar suspeitas, quem vem levantar medo sobre os imigrantes, na verdade, não é porque quer menos imigrantes, quer é mais imigrantes clandestinos”.
Apesar dos discursos xenófobos, a maior parte dos portugueses não ser revê neste tipo de narrativas. Pelo menos é o que foi concluído em estudos recentemente publicados.
O estudo da Lisbon Public Law da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) sobre a perceção que os portugueses têm da imigração no nosso país diz que 71,7% dos inquiridos elegeu como uma das frases em que mais se revê a de que “os Portugueses devem receber bem os imigrantes” e 68,7% considera importante Portugal receber imigrantes dentro e fora da Europa.
O trabalho científico, da autoria de Carlos Blanco de Morais e Ana Rita Gil, revelou também que 48,7% defende que Portugal deve estabelecer quotas numéricas para a imigração e 55,2% acha que a imigração está descontrolada.
“O estudo traz duas mensagens principais: os portugueses são um povo de acolhimento, mas querem uma imigração regulada, com normas. Referir uma coisa sem referir a outra será deturpar as conclusões do estudo”, salientou em entrevista ao DN a coautora Ana Rira Gil, doutorada em direitos fundamentais da imigração.
No seu entender “as políticas públicas, sobretudo estas que lidam com direitos humanos, e acesso a direitos sociais ou ordem pública, têm de ser discutidas numa sociedade democrática e plural.Não conseguimos garantir dignidade a quem cá está se não soubermos quantos estão ou quem está. E também não conseguimos segurança, é preciso dizê-lo, sem medos. A opinião dos portugueses aponta precisamente para isso: regulação para que haja acesso a direitos sociais".