Ministério Público? É melhor chamar a Patrulha Pata (outra vez)

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No início de 2017, quando mantinha uma colaboração semanal com o jornal Público, escrevi um texto de opinião cujo título era “Ministério Público? É melhor chamar a Patrulha Pata”. Nesse texto dizia-se: “Não sei como funciona a Procuradoria-Geral da República quanto às instruções que são dadas para a direção concreta da investigação criminal nem quanto à sua política de comunicação.. (...).

O despacho da Procuradora-Geral da República transcrito nos jornais é francamente o mais interessante, porque retratará a realidade como ela é e não “a realidade como se gostaria que ela fosse” dos comunicados oficiais. (...) O que diz é: a investigação tem andado sem rei nem roque, a Administração Tributária (AT) trabalhou mal, os procuradores responsáveis pela investigação também, alguém (leia-se o diretor do DCIAP) que ponha ordem nisto. (...)Ter procuradores a comentar investigações e intervenções processuais de colegas nos jornais de forma anonimizada é um asco. Tão mau como isso, aliás, é ter um procurador na televisão a comentar o caso, como ocorreu na semana passada, afirmando que as declarações de um outro procurador sobre a clara culpabilidade de um arguido, nem sequer ainda acusado, seriam justificadas pela sua qualidade sindical (e porventura também pela falta de qualidades restantes, faltou dizer). (...) Mas perceber-se que a direção do Ministério Público sobre a atividade dos órgãos de polícia criminal (...) bem como a qualidade da investigação desenvolvida num processo com esta aparente complexidade e com vários anos de investigação, são agora abertamente criticadas pela Procuradora-Geral pelas suas eventuais insuficiências, é algo de simplesmente impensável. (...) Agora, quando o Ministério Público é uma estrutura hierarquizada e a hierarquia já se pronunciou várias vezes nos últimos anos sobre o alargamento dos prazos do inquérito, avaliando a investigação em curso?”

Recordo agora de forma direta este texto para que não se diga que só acordou recentemente a opinião publicada sobre a realidade do Ministério Público (MP), a ser provavelmente integrado na tal “campanha orquestrada”, que deve aguardar o devido inquérito criminal. Ou que tudo tem que ver com hierarquia vs. autonomia. Não. Ainda Lucília Gago não era procuradora-geral e já se escrevia publicamente sobre as visíveis limitações do MP.

É certo – e isso tem também de ser dito – que as grandes responsabilidades no que é o MP, por ação e por omissão, têm dois autores, que se chamam, à cabeça, PSD e PS, e os seus governos, mas também o demais parlamento. Porque preferiram nas últimas décadas simplesmente aumentar remunerações de procuradores para evitar protestos e surpresas e eximiram-se de exigir práticas rigorosas, roturas necessárias e resultados avaliados – à exceção do curto período 2005-2009, logo abafado e menorizado administrativamente em seguida, quando se reviram o Código de Processo Penal, nomeadamente quanto ao segredo de justiça, e o recrutamento e formação de procuradores, ou se criaram a lei de organização da investigação criminal, a lei-quadro da política criminal e as leis bienais de objetivos e prioridades de política criminal, fixando mais clareza processual, sindicância pública e responsabilização, de políticos, de procuradores e de polícias. E passaram 15 anos, já agora. 


PS – Fico feliz por ver António Costa como presidente do Conselho Europeu. Pelas suas qualidades políticas, mas sobretudo por esse facto evitar que ele seja um avençado da CMTV. É quase de acreditar que há alguém que nos guarda, especialmente da vergonha alheia.

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