A tensão no Médio Oriente atingiu um novo pico esta semana depois de Israel ter sido responsabilizado pelos ataques aéreos mortais na segunda-feira contra o edifício do consulado iraniano na capital da Síria, que mataram vários generais da Guarda Revolucionária, com Teerão - que apoia o Hamas e vários outros grupos que lutam contra Israel e os seus aliados em toda a região - a prometer vingança contra Telavive. Ao mesmo tempo, o primeiro-ministro israelita assumiu a responsabilidade pela morte de sete funcionários da organização não-governamental World Central Kitchen na sequência de um bombardeamento na noite de segunda-feira na Faixa de Gaza, enquanto a comunidade internacional, incluindo os Estados Unidos, exige explicações pelo sucedido. .O líder supremo do Irão, o ayatollah Ali Khamenei, prometeu esta terça-feira punir Israel pelo ataque de segunda-feira em Damasco que matou 13 pessoas, incluindo sete elementos (entre os quais dois generais) da Guarda da Revolução iraniana. O ataque, que não foi reivindicado pelas Forças de Defesa de Israel, destruiu o edifício que abrigava o consulado e a residência do embaixador do Irão em Damasco. “O regime sionista perverso será punido pelos nossos bravos homens”, disse o líder iraniano num comunicado citado pela AFP. “Faremos com que se arrependa deste crime e de outros”, reagiu Khamenei, apresentando condolências aos familiares das vítimas..Sem admitir diretamente responsabilidades no ataque em Damasco, o ministro da Defesa israelita afirmou que Telavive está a travar uma guerra em múltiplas frentes e atua diariamente em todo o lado para dissuadir ameaças. “Agimos em todo o lado, todos os dias, para impedir que os nossos inimigos ganhem força e deixar claro a qualquer um que nos ameace, em todo o Médio Oriente, que o preço será elevado”, afirmou Yoav Gallant no parlamento israelita..De acordo com vários analistas, este ataque contra o consulado do Irão e atribuído a Israel pode desencadear uma repercussão da guerra em Gaza por toda a região, uma escalada que Teerão procurou evitar até agora. Ali Vaez, do Grupo de Crise Internacional, classificou o ataque como “uma escalada significativa”, referindo que Israel “ultrapassou os limites”. “É mais provável que o Irão imponha um custo a Israel, mas é provável que o faça de forma indireta e através dos seus parceiros e representantes na região. O dilema do Irão é que a falta de resposta pode mostrar fraqueza a Israel, mas a retaliação corre o risco de uma ação mais dura dos EUA ou de Israel”, acrescentou. .Já Nick Heras, do New Lines Institute for Strategy and Policy, defende que este ataque pode mostrar que Israel pode estar a preparar-se para um conflito regional mais abrangente. “Israel vê os conflitos contra o Hamas em Gaza e o Hezbollah no Líbano como duas frentes numa guerra transnacional contra o Irão, que os iranianos dirigem a partir de Damasco”, disse, acrescentando que Netanyahu “espera que Israel tenha que travar em breve uma guerra regional com o Irão” e que os Estados Unidos se juntem a ela. .De referir que os Estados Unidos avisaram Teerão que não estiveram envolvidos no ataque ao consulado, segundo uma fonte da administração Biden citada pelo Axios. Os aliados do Irão em toda a região e fora dela ofereceram apoio, desde o Qatar à Arábia Saudita, Iraque e Líbano. A China condenou os ataques e a Rússia culpou Israel por um “ataque inaceitável”, enquanto que a União Europeia se mostrou “alarmada com o suposto ataque israelita”, alertando contra qualquer escalada depois da promessa de vingança por parte de Teerão. “Nesta situação regional altamente tensa, é realmente da maior importância mostrar moderação porque a nova escalada na região não é do interesse de ninguém”, disse o porta-voz da UE, Peter Stano..Numa outra frente, Israel assumiu a responsabilidade pela morte de sete funcionários da organização não-governamental World Central Kitchen (WCK) na sequência de um bombardeamento na Faixa de Gaza, com o Benjamin Netanyahu a afirmar que este foi um ataque “não intencional”. “Infelizmente, ontem [segunda-feira], aconteceu um incidente trágico. As nossas forças atingiram de forma não intencional inocentes na Faixa de Gaza. Isto acontece numa guerra. Estamos em contacto com os governos e faremos todo o possível para que não volte a acontecer”, declarou o primeiro-ministro israelita. Entre os sete mortos estão três britânicos, um polaco, um australiano, um americano-canadiano e um palestiniano. Antes destas declarações, o exército israelita já havia prometido investigar o ataque..A ONG explicou que um dos seus veículos foi atacado na noite de segunda-feira pelo exército israelita ao passar por Deir al Bala, no centro da Faixa de Gaza, depois de sair de um armazém onde tinham descarregado 100 toneladas de alimentos, num movimento coordenado com as autoridades israelitas..O porta-voz das Forças de Defesa de Israel, Daniel Hagari, disse que falou pessoalmente com o chef espanhol radicado nos Estados Unidos José Andrés, fundador desta organização não-governamental que fornece refeições em cenários de guerra ou catástrofes naturais, para expressar as condolências pela morte dos trabalhadores. Na sequência do ataque, a World Central Kitchen anunciou que vai suspender as operações na região e responsabilizou o Exército israelita, considerando que se tratou de um ato imperdoável. “O Governo israelita tem de acabar com esta matança indiscriminada” e “precisa de deixar de restringir a ajuda humanitária, de deixar de matar civis e trabalhadores humanitários, e de deixar de usar a comida como arma”, escreveu Andrés na rede social X. A ONG espanhola Open Arms anunciou também que os navios que iam entregar ajuda humanitária a Gaza regressaram à base em Chipre com boa parte da carga.União Europeia, Estados Unidos Polónia, Austrália e Reino Unido são alguns dos países que exigiram explicações a Israel por estas mortes. O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, condenou o ataque e pediu para ser aberta uma investigação “o mais rapidamente possível”, como escreveu na rede social X. “Apesar de todos os apelos para proteger os civis e os trabalhadores humanitários, continuamos a ver pessoas inocentes a ser mortas”, acrescentou..Também Radoslaw Sikorski, ministro dos Negócios Estrangeiros da Polónia, país de uma das vítimas, exigiu explicações de Israel, adiantando que Varsóvia planeia conduzir a sua própria investigação. Entre as vítimas contavam-se também três britânicos, o que levou a ministra da Educação, Gillian Keegan, a recordar que Londres instou Israel “a fazer mais para proteger os civis” e para permitir a entrada de ajuda humanitária em Gaza..A Austrália, através do seu primeiro-ministro, Anthony Albanese, defendeu que tem de haver uma “responsabilização total”. A mesma posição foi tomada pelo secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, que afirmou que os Estados Unidos querem “uma investigação rápida, completa e imparcial para entender exatamente o que aconteceu. Blinken pediu ainda a Israel para que “faça mais para proteger vidas de civis inocentes, sejam eles crianças palestinianas inocentes ou trabalhadores humanitários”..ana.meireles@dn.pt