Pedrógão Grande foi o centro das atenções no Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas, por tudo o que nunca será esquecido. A cerimónia, marcada pelo local, levou a que a exaltação patriótica dos feitos dos portugueses tivesse ontem andada de mãos dadas com o poeta quinhentista e com a evocação das vítimas dos incêndios de 2017 que afetaram aquela região..“Tragédias como as de 2017 nunca mais. Futuro mais igual e menos discriminatório para todas as terras, e para todos os portugueses, dever de missão, lugar para a esperança, a confiança, e o sonho, sempre, mesmo nos instantes mais sofridos da nossa vida coletiva”, propôs Marcelo Rebelo de Sousa no seu discurso, afinado com Rui Rosinha, o bombeiro de 46 anos que em 2017 ficou ferido no combate ao fogo. Sublinhado, foi a necessidade de haver uma “séria e verdadeira coesão territorial, social e estrutural, e não apenas medidas em papel sem concretização efetiva”, vincou o bombeiro..A intervenção de Marcelo no seu local eleito para a comemoração do Dia de Portugal foi uma descrição da sua ideia do que é ser português, sem omitir referências às reparações históricas por si defendidas e que têm gerado aceso debate..“Éramos poucos e aportámos a todos os continentes. Acertámos e falhámos, e assumimo-nos como somos, sem complexos na confissão dos erros, mas orgulhosos do mais que nos fez ser o que temos de ser”, disse o Chefe de Estado numa alusão ao passado colonial..Rui Rosinha, bombeiro ferido em 2017 num dos incêndios que afetaram a região de Pedrógão Grtande, antes do discurso do Dia de Portugal.Paulo Novais / Lusa.Mas, nas palavras de Marcelo, que também assumiram a forma de exaltação patriótica, ainda há denominadores comuns do que é ser português. “Desengane-se quem olha para nós, cá dentro e lá fora, e pensa que nós cedemos ao primeiro contratempo, que nós vacilamos à primeira provocação, que nós hesitamos à primeira contrariedade que nós, que nós baqueamos à primeira tragédia”, afirmou, sem esquecer o orgulho na diáspora portuguesa “nas Europas, nas Áfricas, nas Américas, nas Ásias, nos Pacíficos”, já assumido noutras intervenções..E, neste contexto, ainda houve margem para que o Presidente lembrasse que este dia “evoca o passado, mas quer sobretudo dizer futuro, reconstrução, novos jovens, novos residentes, nacionais e estrangeiros, novos sonhos”..Marcelo Rebelo de Sousa presidiu a cerimónia do Dia de Portugal, acompanhado por José Pedro Aguiar-Branco, o presidente da Assembleia da República, e por Luís Montenegro, o primeiro-ministro.Paulo Novais / Lusa.No que diz respeito à evocação de Camões, associada ao seu quinto centenário, que se comemora este ano, o Presidente da República lembrou o poeta “que foi combatente, como tantos dos nossos, século após século, indomável, mas também rufião, conviva do povo mais povo e ao mesmo tempo letrado”..A tragédia e a igualdade.Pedrógão Grande foi o palco dos discursos deste 10 de Junho, mas Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera foram os outros dois concelhos escolhidos por Marcelo para evocar o Dia de Portugal, por, no conjunto dos três, serem os mais afetados pelos incêndios de 2017, que fizeram 66 mortos e 253 feridos..Aos olhos de Marcelo, estes concelhos são um exemplo de resiliência e recuperação, tal como o país onde estão. “Portugal é assim aqui em Pedrógão Grande, em Castanheira de Pera, em Figueiró dos Vinhos. Mas também em Leiria, em Coimbra, e mais as dezenas de concelhos devastados em 2017, e renascidos e a quererem renascer, sem autocompaixões, com exigência, com coragem, com ambição”, destacou..Convidado por Marcelo para discursar no Dia de Portugal, Rui Rosinha, que em 2017 era chefe de uma viatura dos Bombeiros Voluntários de Castanheira de Pera, pediu um “compromisso sério com estes territórios de baixa densidade”: Uma “séria e verdadeira coesão territorial, social e estrutural, e não apenas medidas em papel sem concretização efetiva”..Para o bombeiro, que discursou numa cadeira de rodas, na sequência dos ferimentos que sofreu em 2017 e que o levaram a uma hospitalização prolongada, com três meses de coma induzida, há cicatrizes “profundas e irreparáveis”, mas há a recuperação..Luís Montenegro, no centro da imagem, no final da cerimónia do Dia de Portugal, com Marcelo Rebelo de Sousa.Paulo Novais / Lusa.“A tragédia expôs muitas das nossas vulnerabilidades, mas também destacou a nossa união e resiliência como nação”, disse, acrescentando que “a região afetada mostrou ao mundo a força da solidariedade portuguesa”, ainda que, nas suas palavras “pouco” tenha chegado ao território, para além da burocracia ser “pesada e demorada”..O apelo do bombeiro passou por, perante o Presidente da República, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, e representantes dos partidos, pedir investimento “em atividades económicas sustentáveis que garantam um futuro próspero e, principalmente, digno para os habitantes da região”..Depois de revelar a falta de médicos e carências de transportes públicos, problemas no acesso à região, limitações nas ofertas de emprego e na educação, Rui Rosinha destacou a resiliência das pessoas que insistem em viver naqueles concelhos..“Apesar de todos estes problemas e dificuldades que poderiam, facilmente, nos levar a desistir e abandonar esta região, continuamos aqui, resistindo estoicamente e com grande determinação para transformar este território, tornando-o mais atraente, justo, seguro e, sobretudo, coeso”, continuou..“Que todos os portugueses, tanto os que vivem em Portugal quanto os da diáspora, aprendam com o passado, se unam no presente e trabalhem juntos por um futuro onde a segurança, a prosperidade e o bem-estar sejam uma realidade para todos”, sugeriu, antes de terminar com a mesma receita seguida por Marcelo: “Viva Portugal!”.Coesão e críticas.Luís Montenegro fez suas as palavras de Rui Rosinha, em declarações aos jornalistas no final da cerimónia. “O objetivo de termos um país coeso do ponto de vista social e territorial e é uma prioridade”, disse, acrescentando que, sempre que visitou a região afetada pelos incêndios sentiu “que nem todas as expectativas foram cumpridas”, garantindo, porém, que o Governo tentará “fazê-lo, agora, nos próximos anos”..Por outro lado, o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, questionado sobre se o PS é responsável pelas desigualdades regionais, contrapôs que “os maiores investimentos no interior de Portugal foram feitos por governos do PS”..“Há muito para fazer por este território do país, que não pode ficar sempre para depois. Temos de continuar a identificar os bloqueios e os problemas, desatando os nós”, assumiu..A navegar a onda de coesão lembrada tanto pelo Chefe de Estado como pelo primeiro-ministro e por Rui Rosinha, também o líder da IL, Rui Rocha, aos jornalistas, defendeu que deve haver “reparações aos portugueses que têm queixas de Portugal”..“Esse é o país que precisamos de construir. Estamos perante um problema de falta de vontade política ao longo destes últimos anos”, criticou..Do mesmo modo, o líder parlamentar do Chega, Pedro Pinto, alertou para o esquecimento do interior, repetiu ideias de Rui Rosinha, com críticas aos políticos que “têm tido muitas palavras para o interior, mas poucos atos” e elogiou o “discurso bom” de Marcelo, “curto, mas muito virado para dentro do país”, que considerou ser “fundamental”.