Saborear a Madeira e desafiar chefs a mostrar o que a ilha tem de bom

Atum com maracujá e pargo com banana foram alguns pratos idealizados pelo chef Tiago Bonito. "A ideia é que possam levar um bocadinho da Madeira", diz Júlio Pereira.

Criar menus com produtos típicos da Madeira, com um chef convidado a dar-lhes um toque especial. O tiro de partida da primeira iniciativa do projeto "12 chefs 12 meses" realizou-se sábado, no restaurante Kampo, do chef Júlio Pereira, no Funchal, e foi um sucesso, com casa cheia e muitos elogios ao menu elaborado pelo chef Tiago Bonito, que até há pouco tempo comandava a cozinha do restaurante Largo do Paço, na Casa da Calçada Relais & Chateaux, em Amarante, premiada com uma estrela Michelin.

O chef convidado já levava uma ideia base do que iria preparar. Mas foi na véspera do evento, sexta-feira, no famoso Mercado dos Lavradores, no centro do Funchal, acompanhado do chef local, que tomou contacto com os produtos regionais e começou a idealizar e aperfeiçoar a sua criação para servir o almoço.

"Eu mostro-lhes os produtos. Mas não existe aqui nenhum tipo de obrigação, eles fazem o que entendem. Mas a vontade deles é usar os produtos da Madeira, até para se desafiarem. O Tiago Bonito, por exemplo, nunca tinha feito gaiado [um peixe pequeno muito apreciado pelos madeirenses] na vida. Foi um produto novo que ele aprendeu a confecionar. A ideia é também um pouco essa, que possam levar com eles um bocadinho da Madeira", explicou o chef Júlio Pereira ao DN, ele que no Funchal é proprietário de dois restaurantes, o Kampo e o Ákua, curiosamente situados um ao lado do outro.

Júlio Pereira, que nasceu numa aldeia próxima da Ericeira, e que apanhou o bichinho da culinária através dos talhos do pai, das hortas do avô e na cozinha da mãe, está fixado na Madeira desde 2013. Na altura do confinamento devido à pandemia, já tinha organizado um projeto do género, mas não tão ambicioso. "Passa por uma vontade de receber os amigos em casa e mostrar-lhe aquilo que é a Madeira, como região, como cultura, como gastronomia. É uma partilha sem pretensões", diz. "As pessoas gostaram e já estão a marcar para os próximos eventos. É também um privilégio para estas pessoas poderem conhecer estes chefs convidados sem irem ao Continente, e a um preço acessível. Aprendemos todos e divertimo-nos", acrescenta.

O chef/empresário chama a atenção que esta iniciativa "não é cozinhar a quatro mãos": "São os chefs convidados que idealizam tudo. Eu apenas lhes dou a conhecer os produtos da Madeira. Há uma grande aceitação da parte deles. A Madeira é uma terra exótica, as pessoas não sabem o que vão encontrar, mas sabem que é bom. Um dos grandes objetivos é também divulgar a ilha, o que é a marca Madeira, o destino Madeira, a própria cultura da ilha. E depois eles levam com eles também um pouco da Madeira".

O cozinheiro mensageiro

Foi assim que nasceu o menu preparado pelo chef Tiago Bonito. Para começar três pratos - patanisca de bacalhau, gaiado com beringela e miso e atum com cenoura, maracujá e alho negro -, seguido de outros dois: pargo com banana, funcho e algas e rabo de boi com brioche e rábano picante. Para sobremesa algo bem regional: bolo de mel com vinho da Madeira e sorbet de manga. Um menu com um custo de 55 euros por pessoa, com bebidas incluídas.

"O pensamento foi logo no cliente local, dar-lhes algo que conhecessem, no sentido de terem uma área de conforto. A ideia foi criar um pouco daquilo que é a minha cozinha, o meu ADN, e adaptar ao produto local. Por exemplo, eu adoro atum, e pensei logo numa mistura com maracujá. Outro exemplo: o gaiado, que foi a primeira vez que cozinhei, apesar de já o conhecer. Cá é salgado e seco, é um peixe menos valorizado, tentei dar-lhe um toque mais asiático. E no pargo entendi misturar com banana e funcho", descreveu ao DN o chef Tiago Bonito.

"Quando o produto é bom, a única coisa que temos de fazer é manter, não o desrespeitar. Depois é trabalhá-lo um bocadinho. Na sobremesa, como estamos na Madeira, pensei logo no famoso bolo de mel e misturá-lo com manga", acrescentou.

Para Tiago Bonito, foi "uma experiência muito positiva". "Os cozinheiros são também mensageiros. Desta vez trouxe um bocadinho da mensagem do Continente e levo um bocadinho da cultura gastronómica da Madeira", finalizou.

O próximo evento é no dia 25 de fevereiro, e contará com o chef Rodrigo Castelo, do restaurante Ó Balcão, em Santarém. No mês seguinte, também a 25, será Diogo Rocha, chef do Mesa de Lemos, em Viseu, com uma estrela Michelin, a descobrir as maravilhas da Madeira e a apresentar as suas criações originais.

nuno.fernandes@dn.pt

Mais Notícias

Outros Conteúdos GMG