Quando Portugal e a Ásia se encontram à mesa
Ricardo Santos

Quando Portugal e a Ásia se encontram à mesa

No restaurante Po Tat, no Palácio do Governador, o chef André Santos mescla ingredientes portugueses com influência asiática e prova que não há que ter preconceitos com “restaurantes de hotéis”.
Publicado a
Atualizado a

No dia anterior a uma viagem de comboio que faria entre Banguecoque e Chiang Mai, o chef André Santos, nas margens do Rio Chao Phraya, aventurou-se a pedir um prato de porco vendido por uma senhora em carrinhos que “pareciam os de gelados”, segundo o chef. A escolha ficou na memória.

“Foi simplesmente o melhor que comi na minha vida. É até irónico, uma vez que em Portugal estamos habituados a comer bons pratos de porco desde pequenos, mas o melhor que já provei foi na Tailândia: foi tão bom que tive que voltar lá no dia seguinte para levar um pouco para a viagem de 12 horas até ao Norte”, lembra André Santos, que agora traz um pouco dos sabores que experimentou na Ásia para o restaurante Po Tat, que abriu as portas em setembro do ano passado no Palácio do Governador, em Lisboa.

O robalo com tupinambor e daishi de beurre blanc.
O robalo com tupinambor e daishi de beurre blanc.RICARDO SANTOS

A proposta do restaurante, que mescla o que de melhor há na comida tradicional portuguesa com influências asiáticas, faz parte de uma rede de investimentos do grupo Highgate, empresa americana que fez uma reestruturação e adquiriu diversos hotéis na região do Algarve, no Porto e em Lisboa, como é o caso do Palácio do Governador, em Belém. A decoração e estrutura da casa dialogam com o conceito do Po Tat que propõe uma viagem no tempo à época na qual os portugueses encontraram a Ásia. Já a comida é uma prova de que não há que ter preconceito com os temidos “restaurantes de hoteis”.

“O que nós fizemos aqui, no fundo, não foi fazer propriamente uma cozinha asiática, foi usar alguns produtos portugueses, como a presa de porca alentejana, a gamba da costa, o robalo, a lula, e dar-lhe um twist de produtos asiáticos para fazer esta ligação da era dos descobrimentos, de influências que nós tivemos quando descobrimos a Ásia: não usamos ingredientes de um país específico, mas sim do continente como um todo”, diz o chef.

As escolhas no Po Tat, aliás, fogem do óbvio quando se pensa no continente asiático. A presa de porco grelhada, por exemplo, chega à mesa acompanhada por marmelos shio koji (um molho de arroz fermentado, base de umami do saké, por exemplo), e alface espargo (29€). Já o robalo, protagonista de outro prato, tem a companhia do topinambur (tubérculo que lembra uma batata com casca de gengibre muito usado em países como China, Japão e Coreia do Sul) e daishi (caldo japonês) de beurre blanc (32€).

Entre outras opções de pratos principais estão o polvo na chapa com puré de abóbora e miso com pickle de folhas shiso (26€), a feijoada de carabineiro (32€) e o ribeye de novilho grelhado com puré de batata e molho bulgogi (32€). Todos com a mescla entre os produtos da costa e do interior de Portugal aliados às técnicas orientais que o chef traz de outros restaurantes e que agora apresenta ao lado de onde viveu grande parte da vida: “nasci em Belém e cresci aqui ao lado, em Algés”, conta Santos, que diz no Po Tat “estar quase em casa”.

A maior surpresa do restaurante é ainda nas entradas, quando chegam os cogumelos com gosto de grelha que nos lembra um clássico dos almoços de domingo - só indo ao Po Tat para entender. O prato em questão, preenchido por umami, traz os cogumelos ostra grelhados com molho de inhame e amendoim (17€), com um molho regado a alho que dialoga na perfeição com o gosto de fumo e “carnudo” dos cogumelos.

As entradas, aliás, seguem a onda do “de cá e de lá”, com opções de cá como as pataniscas de camarão e algas com molho de caril e frio (14€) e os gyosas de frango e kimchi com molho cho-ganjang (14€). Antes disso, nos snacks, o Po Tat inova com uma gamba da costa curada com straciatella e harissa (7€) e o picante e o picadito de barriga de atum, toranja e óleo de pimento (8€).

O chef André Santos.
O chef André Santos.

Para abrir o apetite ainda antes dos snacks e entradas, o couvert com pão “massa mãe” de cereais acompanhado com manteiga de mel faz com que não se apressar logo nos primeiros pratos seja uma tarefa complicada no Po Tat. E afinal o que é que significa a expressão que dá nome à casa? Quem explica é o próprio chef. “É um nome cantonês que deram à tarte de ovos portuguesa”.

Apesar do Po Tat não estar disponível no menu, chega à mesa após as sobremesas - que tem entre as opções o especial gelado de arroz negro, manga e cúrcuma e e merengue (9€) - a tarte portuguesa mais famosa. “Estamos a produzir o nosso próprio pastel de nata”, diz o chef. Não poderia ser diferente tratando-se de um restaurante em Belém.

nuno.tibirica@dn.pt

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt