7 dias, 7 propostas pelo editor e autor Francisco Camacho

1. Concertos
Roots Magic e Trio João Lobo
Grande Auditório e Auditório 2
Gulbenkian
Lisboa
Domingo, 8 de agosto

Se está em Lisboa e ainda não foi ao Jazz em Agosto, aproveite o último dia da edição de 2021 deste festival na Gulbenkian. Na noite de 8, pelas 21h, no Grande Auditório, tocam os italianos Roots Magic (um quarteto editado pela portuguesa Clean Feed, de Pedro Costa), que surgirá desta vez em palco com seis elementos, explorando temas de mestres como Sun Ra ou Ornette Coleman com um linguagem única, do blues ao free jazz, cruzando muitos outros estilos. Clarinetes, sax alto, flauta, vibrafone, baixo e bateria são os porta-vozes desta experiência sonora irrepetível. Antes disso, ao fim da tarde, pelas 18h, no Auditório 2, o baterista João Lobo apresenta-se num formato de trio com o guitarrista Norberto Lobo e o baixista Soet Kempeneer no projeto Simorgh. Caso nenhum destas nomes lhe seja familiar, não se apoquente: vá por mim e avance sem medo, que o Jazz em Agosto é no mínimo uma surpresa.

2.Livro
Terra Americana
De Jeanine Cummins
Edições Asa
Segunda, 9 de agosto

Embora seja mais do que apenas um romance de leitura voraz, Terra Americana, de Jeanine Cummins, publicado em 2020 pelas Edições Asa e ao qual só cheguei recentemente, é um verdadeiro vira-páginas. Em traços gerais, conta-nos a história de uma mãe e de um filho de oito anos que, por razões trágicas, são forçados a abandonar apressadamente a cidade onde sempre viveram, a lendária Acapulco, um paraíso tropical que, nos últimos anos, se transformou num inferno de atrocidades regido pelos narcotraficantes mexicanos. Também aqui, e para efeitos romanescos, o destino é a viagem, neste caso até à fronteira hipervigiada com os Estados Unidos, onde novos perigos ameaçam de morte os protagonistas. Terra Americana é uma epopeia dominada pelo medo com um ritmo de "road movie". É repleta de imprevistos, momentos brutais e encontros com outras mulheres, crianças e homens desesperados que fogem da pobreza e (quase sempre) da violência extrema que assola o México ou as Honduras. O tema do livro não podia ser mais atual mas, como bem se sabe (e não faltam por aí exemplos), a oportunidade por si só não faz um bom romance. Só que Terra Americana vai mais longe. Tendo como pano de fundo um cenário de terror palpável e realista, imposto por narcos e sicários, Jeanine Cummins mostra um talento raro no modo como nos envolve nos traumas, deslizes e dilemas das suas personagens, às quais, mesmo nas passagens eventualmente mais discutíveis para céticos, não falta consistência e credibilidade. Terra Americana, que só muito dificilmente não dará um filme de Hollywood, é um romance memorável que consegue cativar o grande público sem jamais sacrificar a profundidade narrativa e qualidade literária - e um livro assim é sempre motivo de celebração. 450 páginas que se leem num ápice.

3. Série
Vynil
Streaming na HBO
Terça, 10 de agosto

Uma das múltiplas consequências da pandemia foi o abrandamento do ritmo de produção de filmes e séries televisivas. A súbita redução do caudal de novidades na Netflix, HBO ou Amazon Prime foi um balde de água fria para um público que se habituara a consumir o último grito nos canais de streaming mas, por outro lado, a escassez levou muitos espetadores a procurar programas que lhes tinham passado ao lado no momento da estreia. É nesse sentido que recomendo vivamente uma produção de 2016, uma das minhas preferidas, mas que, infelizmente, não conheceu uma segunda temporada - o que provavelmente significa que não houve assim tanta gente como eu a considerar a mini série Vynil, da HBO, uma verdadeira preciosidade... Criada por Martin Scorcese e Mick Jagger, a série decorre no apogeu da indústria discográfica dos anos 70 e retrata com humor e sagacidade os excessos de um meio que, entre linhas de coca e caprichos de vedetas mimadas, gerava milhões da noite para o dia. O protagonista é um editor a braços com uma crise existencial e um segredo inconfessável que se farta das tendências musicais em voga e, exibindo um certo desprezo por guitarristas virtuosos e as bandas megalómanas da altura, se empenha na procura da next big thing - isto depois de uma epifania ao assistir a um concerto selvagem dos New York Dolls num edifício prestes a colapsar. Com aparições convincentes dos Velvet Underground, David Bowie ou dos Led Zeppelin, a série é protagonizada por Bobby Cannavale, num extraordinário papel, e o primeiro episódio é, nada mais, nada menos, que uma longa-metragem com realização de Martin Scorcese. Imperdível para quem gosta de música.

4: Disco
Earth Trip
Rose City Band projeto de Ripley Johnson
Quarta, dia 11 de agosto

Já ouviu falar de Rose City Band? É natural que não, mas a relativa obscuridade deste projeto liderado pelo norte-americano Ripley Johnson é inversamente proporcional ao seu enorme poder de encanto para quem não resiste ao feitiço de uma guitarra superiormente tocada. Os Rose City Band lançaram no mês passado o seu terceiro álbum, Earth Trip, e tal como já havia acontecido nos dois discos anteriores, o resultado é de um bom gosto notável, com ecos de Neil Young, J.J. Cale, Lou Reed, Howe Gelb e, aqui e acolá, os Jesus and Mary Chain de Darklands - tudo sustentado pela originalidade a toda à prova de Johnson. Com um título que diz muito do seu conteúdo, Earth Trip pode ser a banda sonora ideal para umas férias que envolvam grandes tiradas de carro pela vastidão de paisagens desertas, mas também funciona na perfeição para longas tardes de inércia à beira da piscina. Rose City Band é o terceiro projeto em simultâneo de Ripley Johnson, um devoto do psicadelismo, além dos Moon Duo (com a mulher) e dos mais conhecidos Wooden Schjips, que, por sinal, após meia dúzia de álbuns, pareciam vir a caminhar para um registo mais maduro e próximo desta banda-irmã, onde a alucinação dá lugar à mera contemplação.


5. Cinema
À Espera dos Bárbaros
Com Johnny Depp e de Robert Pattinson
Quinta, 12 de agosto

Vá ao cinema ver À Espera dos Bárbaros, baseado no romance com o mesmo nome do sul-africano John Maxwell Coetzee, mais conhecido pelas iniciais J.M., que foi distinguido com o Nobel em 2003 e é publicado em Portugal pela Dom Quixote. Confesso que não li o livro em que questão, mas tudo o que vem de Coetzee, autor do fenomenal Desgraça, nunca desaponta. O filme promete também por outras razões: é realizado pelo colombiano Ciro Guerra, que foi nomeado para o Óscar Melhor Filme Estrangeiro em 2016 com "O Abraço da Serpente", e conta no seu elenco com o excecional Mark Rylance, um dos melhores atores britânicos da sua geração, além da super estrela Johnny Depp e de Robert Pattinson, cada vez menos (apenas) o rapazinho da saga Twilight.

6. Teatro
Morte de um caixeiro viajante
CCB, Lisboa
(em parceria com o Teatro Nacional D.Maria II)
De 6 a 15 de agosto
Sexta, 13 de agosto


No final dos anos 40, com o polémico Elia Kazan aos comandos, esta peça fez furor na Broadway e, mais tarde, já na década de 50, deu que falar em Portugal, quando António Pedro a levou ao palco do Teatro Experimental do Porto. Após uma vida inteira a trabalhar como caixeiro-viajante, Willy Loman, a personificação do self made man bem-sucedido, é um homem profundamente desencantado com a vida... O ponto de partida desta história de Arthur Miller, escrita logo após a Segunda Guerra Mundial, numa crítica feroz às ilusões do sonho americano, é bem revelador da sua intemporalidade - ou mesmo da sua atualidade -e, só por isso, vale bem a pena, caso esteja em Lisboa ou por perto, dar um pulo ao Teatro D. Maria II, em Lisboa, para assistir à encenação de Jorge Silva Melo de Morte de um Caixeiro Viajante (já agora, há quanto tempo não vai ao teatro?).

7. Passeio
Rio de Onor
Parque Natural de Montesinho
Sábado, 14 de agosto

Se escolheu o Norte de Portugal para passar férias, mas a sua originalidade o impede de seguir para o Gerês (aquele paraíso que, subitamente, meio mundo parece ter descoberto), não hesite e dê um salto ao Parque Natural de Montesinho. Fica numa das zonas mais bonitas e isoladas do país, a norte de Bragança, e merece que ali se entregue a uns dias de descanso. Para quem gosta de natureza e sossego, dificilmente haverá melhor destino em Portugal. A paisagem é extraordinária, as aldeias bem preservadas e a densidade populacional reduzida - isto é, nada de confusões. No extremo norte do Parque Natural, a povoação fronteiriça de Rio de Onor justifica cada quilómetro que temos de percorrer para lá chegar. É que aqui, como noutras geografias, mais importante do que o destino é mesmo a viagem, que o levará pachorrentamente por paisagens intactas, recantos bucólicos e aldeias com nomes sugestivos como França, Dine, Rabal ou Gondosende.
Se em vez do Norte escolheu o Sul, aconselho um passeio pela Rota Vicentina. De Porto Covo ao Cabo São Vicente, o perfume do mar e a visão da natureza em estado puro nunca abandonam quem percorre este longo caminho pelo litoral. Não havendo tempo para a odisseia completa, escolha um trilho em função da sua localização, do tempo disponível e do grau de dificuldade. Há muito por onde escolher.

Escolhas por Francisco Camacho, editor e autor

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