Só 182 crianças foram adotadas em 2018. Ainda menos do que nos anos anteriores
Uma criança tem direito a uma família. Uma criança tem direito à guarda do Estado, quando os seus direitos não estão a ser protegidos. E de acordo com o Relatório do Conselho Nacional de Adoção (CNA), em 2018, os tribunais decidiram que a melhor solução para 183 crianças em acolhimento era a adoção, inviabilizando assim o seu regresso ou contacto com a família biológica.
De acordo com o documento do CNA, houve menos 101 sentenças de adoção relativamente a 2017, e menos 158 referentes ao ano de 2016. O documento não apresenta razões, já que as sentenças são de competência judicial, decretadas por juízes em tribunal.
O relatório alerta para o facto de a 31 de dezembro de 2018 haver 273 crianças com sentença decretada para a adoção que aguardavam ainda uma proposta dos serviços de adoção. A esta data, o número de candidatos em lista de espera era de 1919, a maioria do distrito de Lisboa, do Porto e só depois os residentes da capital.
O ano de 2018 fica também marcado como aquele em que os serviços da Segurança Social e Santa Casa de Lisboa fizeram chegar ao CNA menos propostas de encaminhamento para a adoção - 189, referentes a 214 crianças - do que em 2016 e 2017. Menos 85 e 79 propostas, respetivamente.
De todos os centros distritais da Segurança Social, mais uma vez o do Porto foi o que apresentou maior número de propostas para adoção, 36, o centro de Lisboa avançou com 22 e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, com 26, seguiram-se os centros de Faro, Évora, Setúbal, Açores e Santarém. O centro de Bragança destaca-se por não ter apresentado qualquer proposta. Não se sabendo porquê.
A redução do número de propostas pode estar associada, segundo o relatório, ao facto de haver menos sentenças decretadas pelos tribunais ou com o facto de haver mais crianças com Necessidades Adotivas Particulares (NAP). Isto é, "mais crianças mais velhas e com deficiências".
Das 189 propostas referentes a 214 crianças, o relatório revela que 185 crianças foram propostas pela primeira vez para adoção, 21 pela segunda vez e oito pela terceira e quarta vez. O CNA explica que se há crianças propostas mais do que uma vez para a adoção deve-se ao facto de as propostas feitas para elas não terem sido validadas - não foram aceites pelos candidatos - ou porque o processo de adoção foi interrompido.
Destas 214 sabe-se que 69 estavam integradas em 33 grupos de irmãos - 30 de dois elementos e três de três elementos.
182 crianças integradas em 148 famílias
Um sinal positivo é o de que, das 214 crianças com propostas para adoção, 182 foram integradas em 148 famílias. Para o início de 2019, estava prevista a colocação em família de mais 21 crianças, cujo encaminhamento par adoção foi decidido já no final de 2018. O mesmo aconteceu com 31 crianças, que foram encaminhadas para adoção no final de 2017.
De acordo com o relatório, 54,1% das famílias que integraram as 182 crianças tinham formalizado a sua candidatura em 2012 e 2013. Um tempo de espera - cinco a seis anos - que regista a tendência dos últimos anos, por depender fortemente do "desfasamento existente entre o perfil da criança desejada e as características das que se encontram para adoção".
A situação é de tal forma que o CNA alerta: "Quanto mais as pretensões dos candidatos à adoção recaírem sobre crianças mais novas e mais restritivas, maior será o tempo de espera até que lhes seja confiada uma criança".
No entanto, das 148 famílias que receberam crianças, três delas já se tinham candidatado em 2006 e 2008, outras três em 2009 e 2011, 52 em 2012. Por outro lado, houve sete famílias que se tinham candidato em 2017 e outras sete em 2018.
Das famílias que levaram crianças para casa, 125 eram casais de sexo diferente, 18 eram singulares e cinco casais do mesmo sexo.
14 crianças devolvidas - candidatos não se adaptaram à realidade parental
Como o DN noticiou na sua edição de segunda-feira (30 de julho), 2018 foi o ano em que 14 crianças viram o seu processo de adoção - ou de integração em família - interrompido, mesmo assim, menos do que em 2017, em que foram devolvidas às instituições 20, e do que em 2016, que foram 19.
Das 14, seis crianças regressaram à instituição no período de transição e oito no período já da pré-adoção. Destas, três tinham entre os 2 e os 6 anos, cinco, entre os 7 e os 9, e seis entre os 10 e os 15 anos. Sete eram do sexo feminino e sete do masculino.
O relatório refere que o período de contacto destas crianças com as famílias adotivas que os devolveram variou entre os 24 dias e os 9 meses. Os motivos da interrupção devem-se maioritariamente "à dificuldade de os candidatos se adaptarem à nova realidade familiar, bem como à insegurança manifestada na tomada de decisões". Os técnicos referem mesmo que as interrupções ocorridas no período de pré-adoção tiveram a ver com "a dificuldade de vinculação manifestada por parte dos adotantes", sublinhando ainda ter sido detetada nalgumas situações "as motivações inadequadas para adoção e a falta de preparação para este projeto".
Mas houve outras razões que levaram à interrupção do processo de adoção: "Muito residualmente a interrupção teve origem na prática de maus tratos (físicos e psicológicos) por arte dos adotantes, que aplicaram às crianças castigos abusivos", lê-se no documento que alerta os serviços para a necessidade de relatórios psicossociais de avaliação dos candidatos com especial atenção para a capacidade parental dos candidatos.
Três das famílias em causa eram singulares e 11 conjuntas, quatro já tinham filhos. As idades dos adotantes variavam entre os 31 e os 58 anos.
Uma das recomendações do CNA vai no sentido de "se aprofundar as situações de interrupção no sentido de se contribuir mais, e com base num diagnóstico rigoroso, para a promoção da cultura da proteção e prevenção destas situações com procedimentos e estratégias que permitam maximizar a redução de fatores de risco".
O CNA sublinha ainda a necessidade de se continuar a apostar no aumento das competências dos técnicos e na sua qualificação, garantindo-lhes formação e supervisão especializada. Por outro lado, refere, deve continuar-se também a apostar na preparação das crianças para a adoção, fazendo-as participar no seu projeto de vida.
O relatório de atividades do CNA, órgão colegial criado em 2016, do qual fazem parte representantes dos Organismos da Segurança Social (continente e ilhas) e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, com competências na área da adoção na cidade de Lisboa, está publicado.
Por divulgar falta ainda o relatório CASA de 2018 - Caracterização Anual da Situação de Acolhimento - que traça o retrato dos menores à guarda do Estado. O documento de 2017 foi publicado em novembro do ano passado.