Trabalho: Não sabemos desligar e isso afeta a nossa saúde e de quem nos rodeia

A forma como a pessoa leva a vida profissional para casa pode estar a causar danos fora do trabalho, comprova um estudo que o instituto Virginia Tech publicou. A psiquiatra Maria Antónia Fresquilho diz que este cenário é fruto de "uma sociedade-competição"
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Quantas vezes deu por si a verificar o e-mail profissional fora do horário laboral? Este hábito pode bem estar a deteriorar a sua saúde e a das suas relações. Quem o diz é a ciência: um estudo do instituto Virginia Tech, orientado pela Universidade de Virgínia, que partiu de uma amostra de 142 casais.

"A nossa investigação expõe a realidade: 'fronteiras de trabalho flexíveis' frequentemente se transformam em 'trabalho sem limites', comprometendo a saúde e o bem-estar de um funcionário e da sua família". Quem o diz é William Becker, professor associado da área de administração da Pamplin College of Business, em Virgínia, e co-autor do estudo.

Liuba Belkin, também co-autora e professora da Lehigh University, Pensilvânia, acrescenta que "um stress constante não só aumenta a ansiedade do profissional, diminui a satisfação relativamente às suas relações pessoais e tem severos efeitos na degradação da saúde, como afeta o bem-estar matrimonial".

"É mais importante do que nunca que haja um esforço extra para gerir esta ansiedade", porque atualmente assistimos a "barreiras mais complexas entre o trabalho e a família", remata Becker.

"Sociedade-competição"

Segundo William Becker, estudos anteriores já demonstravam um aumento no nível de stress da pessoa e no seu agregado quando se leva trabalho para terminar em casa. Contudo, a investigação comprova ainda que não é necessário gastar realmente tempo a trabalhar fora de horas para surtir efeitos negativos em setores pessoais da sua vida. O ato de pensar no trabalho quando está fora do horário laboral já é, por si, prejudicial à sua saúde e bem-estar, bem como das pessoas próximas de si.

Os resultados do estudo apresentado pelos dois autores não surpreende a psiquiatra portuguesa Maria Antónia Fresquilho.

A especialista diz que esta não se trata de uma questão antiga: "Isto é recente e advém de uma grande mudança social".

"O trabalho devora as pessoas e torna-as seres constantemente deprimidos", acrescenta, lamentando que antigamente, no mercado de trabalho "dizer 'não', mesmo com humildade, era compreendido". Ao contrário do que acontece atualmente, impor limites não era um defeito profissional. Mas hoje em dia "já não sabemos dizer 'não'".

São as consequências de uma "sociedade-competição, da globalização e do deixar de valorizar a pessoa como ferramenta essencial de trabalho".

Descura-se a família e alguns até já escolhem "não ter". Mas, diz a psiquiatra, "uma pessoa não é apenas o seu trabalho".

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