Ser crente e não ter religião. Uma tendência que ganha peso em Lisboa
Na Área Metropolitana de Lisboa há cada vez mais crentes mas que não professam uma religião. A maioria da população assume ser católica, mas nem todos frequentam os locais de culto com regularidade. Outras das indicações do trabalho "Religião e o espaço público", da Fundação Francisco Manuel dos Santos, é facto de as pessoas estarem a gerir os momentos de oração de acordo as rotinas da sua vida.
Na investigação coordenada pelo professor Alfredo Teixeira a maior surpresa será a "dimensão de alguns dados". "Confirma-se a diminuição do peso relativo dos católicos [quando comparado com o Inquérito Identidades religiosas, em Portugal, de 2011], apesar de não se poder fazer uma comparação linear, pois esse inquérito era nacional", explica ao DN o diretor do Instituto de Estudos de Religião da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. Segundo as conclusões já conhecidas, e que esta quinta-feira vão ser divulgadas, 54,9% da população declara-se católica, cerca de 50% nunca mudou de religião ao longo da vida e 23,8% deixou de ser praticante.
Outra confirmação deste trabalho é a presença na sociedade de cada vez mais pessoas que se assumem como crentes, mas que dizem não ter religião. "Foi o grupo que mais cresceu desde 2011, é difícil perceber bem este grupo, não se tornaram não crentes nem se converteram a uma religião. É preciso uma maior investigação", acrescenta, lembrando que 35% da população diz não pertencer a nenhuma religião.
Alfredo Teixeira frisa que é na faixa etária entre os 15 e os 44 anos que se encontra a maior parte de pessoas que admitem não ter religião apesar de serem crentes e que pouco mais se sabe sobre este "grupo intermédio entre os não crentes e o universo maioritário dos católicos. Falam sobre religião, mas não sentem necessidade de ter uma presença religiosa efetiva na comunidade".
Este trabalho chama a atenção para o facto de existirem três grupos quando se fala de religião: os não crentes (incluindo os já referidos crentes que não se reveem em nenhuma religião), os católicos e os que professam outras religiões.
Para estas conclusões foram validados 1180 inquéritos a residentes na Área Metropolitana de Lisboa, com 15 ou mais anos, e as respostas foram trabalhadas pelo Centro de Investigação em Teologia e Estudos de Religião da Universidade Católica Portuguesa.
Deste total de questionários, as respostas indicaram que 62,2% dos inquiridos pertencem a uma denominação protestante (incluindo evangélicos), 51% são testemunhas de Jeová e 61,5% pertencentes a outras religiões. Os não crentes representaram 55,2% das respostas e a percentagem de crentes sem religião que aceitaram responder chegou aos 43,5%. Mais de metade da população (54,9%) declarou-se católica.
Outro dado que sobressai deste trabalho está relacionado com a distribuição das posições religiosas. De acordo com os dados avançados ao DN, a maior parte da população da Área Metropolitana de Lisboa assume-se como crente e pertencente a uma religião. Porém, uma análise mais específica das respostas permite concluir que a grande maioria dos crentes e pertencentes a uma religião mora na zona norte do Tejo (67,6%). Certo é que a percentagem da população sem religião é muito significativa (22%) na área metropolitana, sendo no concelho de Lisboa que esse valor é mais elevado: 28,3%.
No que diz respeito ao perfil de crente mas não integrante de uma religião a Margem Sul do Tejo (13,3%) e a Península de Setúbal (16,5%) são as regiões onde mais pessoas assumem esta situação.
Outros pontos focados neste estudo - cuja versão final deverá ficar pronta no início do próximo ano - a maioria dos inquiridos (91%) garantiu não sentir discriminação devido às suas opções religiosas. E uma grande parte (70,3%) considerou que a eutanásia é "aceitável dentro de certos limites".
Um dado que não espanta é a contínua descida da prática da oração. Alfredo Teixeira considera que neste particular há um outro ponto que merece um olhar mais atento: "O que começa a ser importante é o fenómeno da irregularidade. Em relação aos católicos temos 15% que declaram que vão uma vez por semana ao culto. O que é importante analisar é a forma como a prática se está a organizar. Temos uma quantidade razoável de pessoas que organizam o seu próprio culto, ao ritmo da sua vida, do seu quotidiano."
Outro dado que se destaca é a vitalidade das "comunidades evangélicas que são muito ativas, os índices de prática são mais elevados [do que os católicos, por exemplo] e não concentrados num ritmo semanal, mas sim de mais de uma vez por semana", explica.
Entre as principais ideias que os investigadores encontraram na análise dos dados recolhidos sobressai o facto de os inquiridos considerarem que a participação num ato religioso tem a mesma preponderância com "passar o fim de semana fora" ou "fazer desporto". E as práticas que mais destacaram para os fins de semana foram o descanso (45,2% dos casos) e o cuidado com a casa (34,4%).
Outra conclusão apresentada neste trabalho sobre "Religião e o espaço público" é a de que uma parte das pessoas que responderam frisarem que não falou, no último mês antes do inquérito, sobre assuntos religiosos, e que a conversa sobre estes temas são circunscritos ao ambiente familiar e de amizade.