O espaço não é assim tão negro. Tem quase o dobro da luz que se pensava

Cientistas utilizaram uma das naves humanas mais longínquas para medir a luminosidade do espaço profundo e foram surpreendidos com o que viram.
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Qualquer pessoa que tenha olhado para o céu noturno, numa noite de céu limpo sem luar, longe da luz artificial de uma grande cidade sabe que o espaço entre as estrelas é negro profundo. Parece assim desnecessário, inútil mesmo, perguntar de que cor é o espaço sideral. Mas é para isso que vivem os cientistas: fazer todas as perguntas, mesmo aquelas que parecem desnecessárias. Porque as respostas, muitas vezes, surpreendem-nos.

Foi o que aconteceu mais uma vez.

O astrónomo Tod Lauer, do Observatório Nacional Ótico, no Arizona, faz parte de uma equipa que contribuiu agora para a resposta, que há décadas que ele e seus colegas procuravam: qual a luminosidade do espaço, se lhe retirarmos todas as fontes de luz conhecidas?

Para o fazer, socorreu-se de uma das máquinas mais longínquas que a humanidade atualmente possui, a sonda da NASA New Horizons.

A nave que foi projetada para visitar Plutão -- e enviou em 2015 as primeiras fotos a cores do planeta anão -- seguiu para a cintura de Kuiper e logo no início de 2019 "visitou" o asteroide Ultima Thule, o objeto rochoso conhecido mais distante do Sistema Solar. Depois seguiu, rumo ao espaço profundo.

Atualmente, encontra-se quase 50 vezes mais distante do Sol do que a Terra. Suficientemente longe para que o espaço que "vê" à sua volta seja pouco afetado pela luminosidade da nossa estrela -- condições propícias para as medições de Tod Lauer.

As imagens captadas pelas câmaras da New Horizons "eram aquilo que nós chamamos céu vazio", descreve Lauer aos media internacionais. "Há a luminosidade das estrelas distantes, das galáxias longínquas, mas parecem fenómenos aleatórios. O que procuramos é um local que não tenha demasiadas estrelas brilhantes nem luz destas mesmo fora do plano que possa ser refletido para o enquadramento"

As fotos foram depois processadas digitalmente de forma a retirarem-lhes todas as fontes de luz conhecidas: estrelas, galáxias, poeiras refletindo a luz destas, etc.

De seguida, ainda subtraíram o valor estimado da luminosidade de todas as galáxias que chega ao nosso sistema solar.

No fim disto tudo, se o espaço fosse de facto negro, obteriam um valor próximo de zero. E no entanto...

Concluíram que o espaço sideral brilha.

Um brilho equivalente ao da luz que chega até nós das galáxias distantes. E cuja origem é, atualmente, desconhecida.

"Eles estão a dizer que há tanta luz fora das galáxias como no interior das mesmas, o que é francamente um osso duro de roer", comenta ao site especializado NPR o astrofísico Michael Zemcov, que não participou no estudo. Mas apesar de cético, concorda que o trabalho realizado "é sólido".

São assim precisas mais observações -- utilizando outras fontes -- para tentar perceber o mistério. Já se avançam algumas teorias, como a possibilidade de existirem afinal ainda mais galáxias no universo do que aquelas que se pensam (como galáxias anãs). Ou então que esta luminosidade esteja ligada a outro tipo de fenómeno, como a "matéria escura", que as medições indicam ter de existir na composição do cosmos mas na realidade ninguém sabe o que é.

Só o tempo, e mais ciência, o poderá dizer.

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